Sapo velho e aposentado
Numa antiga casa da região dos rios, um sapo vivia com sua família dentro do quintal.
Ele era o último sapo de uma dinastia de “Papos Grandes”.
O Senhor Papo Grande, como era conhecido na região, costumava caçar insetos todas as tardes. Caçava, caçava e os engolia com sua língua pegajosa. Porém, era só chegar a casa que ouvia reclamações da esposa. O que era irritante, pois um sapo de alta linhagem não podia receber reclamações, assim ale pensava, ainda mais todos os dias!
_ Um dia eu saio de casa! – dizia nessas ocasiões.
_ Faça o que quiser, mas sapo velho é como pedra no fundo da lagoa - as plantas se enroscam nela e, assim, criam raízes e não têm como sair; nem com a correnteza!
A decisão veio numa tardinha de verão.
Sempre sozinho na hora de caçar, o Senhor Papo Grande disse para si que naquele dia não iria voltar cedo para casa. Queria dar um susto à Senhora Papo Grande, que era baixinha e gorda, como todas as sapas idosas de beira de rio. “Não haveria melhor meio de deixá-la preocupada do que se demorasse a chegar!”, falou com seus botões.
O quintal tinha um buraco no muro de tijolos e foi desse modo que ele saiu, para dar maior veracidade ao fato de que tinha ido embora.
E cada vez mais convicto de que não voltando logo para casa iria resolver sua situação com a Senhora Papo Grande, ele seguiu o caminho da rua.
Nos lugares desconhecidos, muitas vezes um sapo fica sem saber para aonde ir. Foi por isso que ele abandonou o caminho do matagal e passou a saltar pela estrada de piçarra. Afinal, o Senhor Papo Grande ainda conservava as pernas firmes e dava saltos com louvor: “Plof-plof!”.
Ora, ele não se lembrava de que o caminho era tão duro e pedregoso! Doía nas patas as pontas das pedras secas, mas que importava? Deus, ele queria tanto que em casa sentissem a falta dele que foi saltando e saltando, sim, na direção de um portão que encontrou aberto.
_Ufa, que estou cansado! _ disse arfando e transpirando mais do que era de costume pela pele úmida.
Pois não é que ele entrou numa escola? Como era quase noite, o vigia já estava molhando as plantas e, como não costumava ver sapos por ali, foi logo pegando um cabo de vassoura para dar fim daquele sapo grande e velho.
O que se sabe é que o Senhor Papo Grande nem teve tempo de experimentar dos insetos nas plantas, quase num pulo só saiu pelo portão e tomou o caminho de casa.
Ah, que usando o resto de fôlego que ainda tinha, ele tomou o rumo do quintal e, com alegria, sentou numa velha pedra que sempre devia estar por lá desde sempre e sempre.
Quando a Senhora Papo Grande quis perguntar por onde ele andava até aquelas horas, ele começou a sorrir e a coaxar com tal euforia que ela disse:
_ Este sapo velho está é no ponto de se aposentar!
E o Senhor Papo Grande ficou bem quieto, compreendendo que ela tinha razão... E tinha razão mesmo, ficou repetindo para si, bem quieto sentado na pedra.
Tudo isso ocorreu pelos tempos em que o rio Piracuruca invadia os cercados com águas barrentas e novas e se podia ouvir por toda a noite: “oak-oak”! E se sabia que tudo ia bem com as chuvas chegando às nascentes e o rio tomando água... velhos tempos bons!