O REINO DAS TRÊS POMBAS

O REINO DAS TRÊS POMBAS

(Conto de fadas levemente baseado em O CAÇULA, folclore paraibano recolhido por Silvio Romero e adaptado por Monteiro Lobato. Como a história era simples demais, acrescentei por minha conta uns oito ou nove décimos dela..,)

(Versão poética William Lagos, 1º janeiro 2015)

O REINO DAS TRÊS POMBAS I

Do mesmo modo que o ano hoje é criança,

justo é escrever uma história de caçula,

por mais que sejam as tais repetitivas

e em comparação com lendas europeias,

sua imaginação aqui bem pouco alcança;

parece até que o autor segue uma bula,

com as mesmas peripécias redivivas,

como há idêntico sangue em nossas veias...

Vemos aqui, portanto, três irmãos,

todos filhos do mesmo chacareiro,

batizados de João, Manuel e José,

que cresceram na roça a trabalhar.

João se cansou de desgastar as mãos,

queria arranjar um emprego de copeiro

ou de porteiro, de um castelo no sopé,

sem precisar na dura lida se esforçar...

Assim, ao completar dezoito anos,

falou a seu pai que queria ir embora,

contudo o velho não lhe consentiu:

“De ti preciso na colheita e no roçado,

de estender a chácara tenho planos;

na tua ausência, o trabalho da lavoura

recairá em teus irmãos, pois já sumiu

aquela força de que me havia orgulhado...

Teus irmãos não têm energia suficiente;

além disso, és o herdeiro natural;

lamento, filho, mas não te posso dispensar.”

João acatou, mas de muito má-vontade,

para fugir em certa noite, indiferente

se a seus irmãos causaria qualquer mal,

buscando a própria vida governar:

ato de egoísmo, mas de fato, sem maldade...

O REINO DAS TRÊS POMBAS II

Antes de ir, falou ao irmão do meio:

“Eu vou embora, mesmo que o pai não deixe;

mas assim que cresceres o bastante,

no Reino das Três Pombas vais-me achar.

Tens quinze anos e não tenho receio:

daqui a três, terei já encontrado um feixe

de oportunidades para seguir avante

e certamente serei capaz de te ajudar...”

“Por que ‘três pombas’”, indagou Manuel,

que era o segundo filho de seu pai.

“É que a família real tem um escudo

em que três pombas mandaram pintar.

Foi numa guerra contra um infiel

que um rei foi preso e no cárcere vai

morrer de fome, por lhe negarem tudo,

mas conseguiu três pombas capturar,

por entre as grades da janela da prisão

e assim se alimentou, comendo-as cruas;

em breve o exército veio e o libertou;

por tal razão, mandou pintar escudo novo:

três pombas prata sobre fundo vermelhão

e o pendurou no palácio e pelas ruas...

Até o nome da capital mudou:

“Três Pombas”, passou a lhe chamar o povo.”

“Porém não penses ser gente de paz,

os três-pombenses são fortes guerreiros...

Talvez me aliste para ser militar,

mas o que desejo mesmo é ser copeiro,

que com vinho e iguarias satisfaz

seu apetite, igual que os cozinheiros...

Mas é mais fácil a comida carregar

que precisar de a cozinhar primeiro!...

O REINO DAS TRÊS POMBAS III

Dessa forma, de Manuel se despediu,

mas sem dizer nada ao irmão José

e nem à mãe, muito menos a seu pai;

Manuel mentiu que não sabia de nada...

Mas nos três anos seguintes, pouco riu,

pois trabalhava sem parar, mas tinha fé

que ao fazer os seus dezoito, também vai

se unir a seu irmão na mesma estrada...

E de fato, aos seus dezoito completar,

foi pedir licença para também ir embora

e novamente o pai velho lhe negou:

“Meu filho, aqui viraste meu arrimo;

de tua energia depende o funcionar

de nossa bela chácara nesta hora;

o teu irmão já nos abandonou

e nem sequer de pensar nele hoje me animo!”

“Deste modo, deixar-te ir, não posso;

a tua mãe está velha e também eu;

José sozinho não dará conta do serviço!”

Manuel também escutou de má-vontade,

pois de seu plano de fuga tinha esboço;

não discutiu, mas de noite ele escolheu

um cavalo, na escuridão tomou sumiço,

montou nele e partiu para a cidade!...

No outro dia, o pai o interrogou,

mas José, realmente, não sabia.

O velho foi obrigado a contratar

alguns peões para a granja produzir;

mas a mãe continuava a lastimar

e o pai, embora quieto, mais sofria...

José cresceu acostumado a trabalhar,

porém ser ter ideias de fugir.

O REINO DAS TRÊS POMBAS IV

Três anos antes, João, o irmão mais velho,

havia chegado a pé até a cidade

e conseguira um emprego de estribeiro,

para cuidar dos cavalos do castelo;

mas com o cozinheiro-mor tomou conselho

e este o levou, na maior facilidade,

a trabalhar em sua cozinha, bem ligeiro

e aos poucos, levou o rei a conhecê-lo.

De fato, o cozinheiro desviava

boa parte dos alimentos do castelo

e os revendia, para ganhar dinheiro;

então João, de comparsa, ele aliciou

e logo como copeiro o colocava,

que ninguém se desse conta do mau zelo

de suas contas, gastando mais ligeiro

os suprimentos do que na mesa se gastou!

Mas sempre havia uma possibilidade

de uma denúncia dos fornecedores

e precisavam de um porteiro de confiança,

os dois alegres quando Manuel chegou!

O rei o acolheu com a maior facilidade

e o outro irmão se juntou aos corruptores,

rapidamente dividindo uma poupança

que bem depressa aos três patifes agradou!

Mas nesse meio tempo, um mau dragão

começou a assolar todo o país

e as três filhas do rei, num passeio, raptou!

Eram tão belas essas três meninas

que de “Três Pombas surgiu logo ocasião

para o povo apelidá-las como quis...

Então o reino em alvoroço se agitou,

sem fazer qualquer ideia de suas sinas!

O REINO DAS TRÊS POMBAS V

O rei e a rainha passaram a comer menos

e ainda havia a ausência das princesas;

os cortesãos se sentiam embaraçados

de comerem à vontade no salão real;

ordenou o rei fazer jantares mais pequenos

e o tesoureiro a controlar despesas;

os suprimentos foram racionados;

dos três os lucros diminuíram, grande mal!

Então Manuel arranjou um novo esquema:

passou a cobrar de seus fornecedores

uma propina ao receber os suprimentos,

já que de súbito, a abundância diminuía.

Foi mais difícil conservar o mesmo lema,

mas conseguiam vender os seus favores,

pois não compravam os necessários alimentos

de quem o pedágio não lhes pagaria...

Mas o dragão postou-se em frente do castelo,

cuspindo fogo e mandou chamar o rei.

Ele chegou, envolto em sua armadura...

Disse o dragão: “Meu nome é Belfagor;

as suas três filhas, de corpo e rosto belo

guardo comigo, porém não as devorarei,

pois canibal eu não sou de catadura,

mas sobrevivem tão só por meu favor!”

“Quero um quilo de ouro a cada dia,

que aqui virei buscar semanalmente;

enquanto me pagar este tributo,

vou conservá-las na melhor saúde;

porém, se me negar quanto devia,

farei o mesmo que fizeram a seu parente

dos dias antigos, para causar seu luto:

sem alimento, elas terão destino rude!”

O REINO DAS TRÊS POMBAS VI

Assim mandava o rei depositar,

cada semana, sete quilos de ouro,

na colina que o dragão determinara;

que elas vivessem não tinha comprovação

e deste modo, começou a enviar

os seus arautos, proclamando com estouro

que caso alguém suas três filhas salvara,

como seu genro alcançaria aceitação!

João e Manuel, mais seu cupincha cozinheiro,

até chegaram em tal proposta a pensar,

porém não tinham coragem suficiente

e no palácio estavam bem acomodados...

Enquanto isso, o velho chacareiro

tinha um bom capataz a administrar

cinco peões e a roça seguia em frente,

porém os pais estavam tristes, os coitados!

Então José a seus pais se dirigiu:

“Meus pais, já completei dezoito anos;

se permitirem, vou buscar os meus irmãos...”

“Se não deixar, então irás fugir também?”

O velho amargurado se insurgiu!...

“De forma alguma, não sou como meus manos,

eu só irei com a bênção de suas mãos...”

“Mas se este mundo o engolir, no mal que tem?”

“Se eu tiver a bênção de meus pais,

só na Graça de Deus eu hei de andar...”

Tanto falou, que enfim os convenceu

e recebeu um bom cavalo e algum dinheiro.

“Mas ao menos tens ideia aonde vais?”

“O capataz comentou que ouviu falar

que o irmão João por seis anos já viveu

em Três Pombas e se tornou do rei copeiro...”

O REINO DAS TRÊS POMBAS VII

Assim, com a devida permissão,

partiu José para o reino referido

e no caminho viu a passagem de um dragão

voando alto, com um saco de dinheiro;

seu paradeiro observou com atenção:

uma alta torre que alguém havia erguido

numa planície por sobre liso chão;

foi ao terraço e ali pousou primeiro...

Não tinha porta a torre e só janela

no andar que ficava bem em cima...

Viu o dragão em ser humano se virar

e então descer, por meio de escadinha.

Pelas janelas, observou um donzela

e entre os dois formou-se estranho clima,

medo e despeito ali a se mesclar,

ela sorriu, porém, e indagou a que vinha...

“Venho trazer mais um saco de dinheiro

que recebi pelo resgate das princesas

e vou agora verter no meu tesouro...

Usando um chifre, José pôde escutar

e logo ouviu o som do mealheiro,

quando as moedas, antes no saco presas,

retiniram ao cair num monte de ouro.

Surgiu o dragão e depois saiu a voar...

Logo a seguir, usando o chifre por trombeta,

que encompridara com cascas vegetais,

José saudou a donzela na sua torre...

“Mas o que faz aqui, belo rapaz...?

Da caixa-forte eu sou guarda secreta...

Se Belfagor o vir, chamas fatais

irá soprar e nesse fogo irá morrer!

É só a má-sorte que a este canto o traz!”

O REINO DAS TRÊS POMBAS VIII

“Quer que tente libertá-la, boa princesa?”

“Não sou princesa, de fato, sou uma fada,

mas estou presa por um encantamento,

porque desobedeci à minha rainha...

Titânia me fez guarda da riqueza

deste dragão, que de fato, não quer nada,

senão juntar ouro e joias em portento,

para poder se gabar de que os tinha!...”

“Mas o que bebe e come aí no alto?”

“Não preciso de comer, sou uma fada,

mas foram limitados meus poderes

e aqui eu fico enquanto o dragão me quer...

Sou proibida de voar e quanto a um salto,

até a mim deixaria espedaçada...

Contudo, se me salvar mesmo quiseres,

engole este topázio que eu te der...”

E lá do alto veio coriscando

uma pedra de ouro facetada...

José contra suas vestes a limpou,

respirou fundo e então, a engoliu!

De seu cantil foi bom gole tragando,

sua carne inteira sentindo transformada

e em papagaio verde se virou,

bico dourado, que à luz do sol luziu!

Bateu asas e chegou ao alto da torre,

ficando frente à frente com a donzela,

que doce hálito sobre ele soprou

e retornou à antiga forma de rapaz...

“Levante a argola na pedra que percorre

todo o piso desta minha triste cela...”

José foi ao lugar e se esforçou,

até que argola e pedra nas mãos traz...

O REINO DAS TRÊS POMBAS IX

“O encanto me afastava da abertura,

mas você a levantou bem facilmente...”

Surgira um quadrado de pouco mais de palmo.

“É necessário que desça até lá embaixo...”

“Mas como? Retomei a minha largura...”

“Pense em topázio e virar-se-á novamente

no papagaio... Procure ficar calmo

e ache uma espada marcada com um facho...”

“Pegue a espada no bico, com cuidado

e a traga através deste buraco...

Vai ser pesada, contudo o ajudarei.”

José pensou topázio e se virou

no papagaio, com seu bico dourado;

o dragão sempre esvaziava ali seu saco;

desceu no escuro, mas do bico a grei

bem depressa a masmorra iluminou...

Havia muita coisa, além de ouro,

enchendo já da torre bem metade!

Cofres de joias, coroas e armaduras

e mais, no mínimo, umas dez espadas!

Examinou, com cuidado, esse tesouro

até achar o que trazia, em realidade

aquele facho indicado em suas ranhuras;

mas para a erguer, usou forças desusadas!

Precisou bater suas asinhas fortemente,

e enfim pôde conduzi-la até a abertura,

quando a fada segurou-a pelo copo.

José ia subir, mas ela falou:

“Ainda não! Primeiro ache uma corrente

com uma coleira e um anel de ouro e brancura

e os traga para mim, aqui no topo!

Eu lhe direi, caso você se equivocar!...”

O REINO DAS TRÊS POMBAS X

O papagaio encontrou as duas prendas

na tal corrente e as levou até a entrada;

a fada o ajudou, parecendo agradecida

e então lhe disse: “Pode subir agora!”

José esgueirou-se pelas estreitas fendas,

pensou topázio, sua figura retomada,

parando em frente da fada comovida,

bem diferente a cela nessa hora!...

Havia tapeçarias e quadros nas paredes,

uma cama de dossel e móveis finos,

alfombras e ricos trilhos pelo chão:

e a sala até lhe parecia bem maior!...

Viu um cão de pelo grosso, que nem medes;

o anel enfiado em dedos alabastrinos,

a espada rebrilhando em profusão,

os copos cheios de joias furta-cor!...

Mas nesse instante, ouviu-se um temporal

e Belfagor pousou sobre o terraço!

Desceu a escada – um cavaleiro de armadura:

“Gunilla, vejo que tem de novo o seu anel

e seu marido, de coleira, não está mal!...

Mas quem é este que espada ergue no braço?”

“Meu salvador, de grande formosura,

que irá matá-lo, sem lhe dar quartel!...”

De fato, por puro ilusionismo.

fizera José mostrar aspecto gigante!

Belfagor disse: “Eu não posso com os três,

mas não pretendo abrir mão de meu tesouro!

Se for preciso, morrerei com heroísmo!”

E se lançou contra José, que num instante

o desarmou, lutando embora da primeira vez!

Era um encanto sobre ele imorredouro!...

O REINO DAS TRÊS POMBAS XI

Então a fada, meio traiçoeiramente,

tomou o cão, que era o seu marido,

mas não pudera até então desencantar,

sob um dos braços e pulou pela janela!

José ficou com o dragão unicamente,

no chão tombado, mas sem se achar ferido.

“Pois ande logo, se pretende me matar!”

“Não, o Bom Deus sobre todos os seres vela!”

“Não tenho vontade alguma de o matar.”

“É meu tesouro então, que ambiciona?”

“De forma alguma, só quero sair daqui,

se prometer que não vai me perseguir...”

“Diga topázio e poderá logo voar,

Pois posso ver qual ambição o doma!

Em sua mente, de seus pais os rostos vi:

o que deseja é seus irmãos ir descobrir!...”

“É bem verdade,” confessou José.

“Pois muito bem! Pois hoje a honra obriga

a lhe pagar por minha vida e por meu ouro;

troque sua espada por esta adaga de condão,

mais esta esponja que bem útil será até!

Guarde-as bem, até o instante em que consiga

chegar ao Reino das Três Pombas, sem desdouro;

eu lhe direi as Três Princesas aonde estão!”

“Que três princesas?” “Você é mesmo inocente!

Só isso vale que lhe preste ajuda!...

As Três Princesas eu mesmo raptei

e em resgate, ganhei parte desse ouro;

jamais contar onde a riqueza está jacente

me jure agpra. que sua palavra escuda;

e dessa forma, duas vezes o ajudarei:

amor de irmão é um real tesouro!...”

O REINO DAS TRÊS POMBAS XII

“Mas seus irmãos têm diversos sentimentos

e não merecem o quanto bem lhes quer;

a nenhum mostre nem esponja, nem condão,

pois esses dois o tentarão prejudicar!

Eu te ajudarei a fazer bons julgamentos...

O teu cavalo te espera: podes ver!”

O homem-dragão apontou na direção.

“Diz topázio e sai daqui a voar!...”

José montou a cavalo e foi troteando,

até o Reino das Duas Pombas alcançar.

Viu Manuel vestido de uniforme,

porém fingiu nem saber quem ele era!...

Mas bem depressa a João foi avisando:

“O intrometido vai querer nos denunciar!”

E arquitetaram, em caráter bem disforme,

um jeito de entregá-lo para a fera!...

Foram dizer ao rei: “Há um estrangeiro,

parado aí, bem em frente do portão,

que diz poder salvar as três princesas!...”

Depressa o rei a José mandou chamar

e indagou do pobre jovem, bem ligeiro,

se ele de fato fizera a afirmação.

Falou José: “Não sou homem de proezas,

mas se o rei assim o ordena, irei tentar!”

Ouvira a voz do dragão na sua cabeça,

dispondo-se a cumprir a ordem real.

Foi cavalgando até a praia do mar;

amarrou o cavalo e então pegou

de seu alforje os artigos que se peça.

Jogou a esponja ao mar, bem natural,

subindo nela para um fácil navegar,

conforme a voz de Belfagor lhe indicou.

O REINO DAS TRÊS POMBAS XIII

A esponja até uma ilhota o transportou;

José andou até um rochedo se avistar,

com a adaga o sinal da espada ali riscou

e então a pedra se abriu inteiramente.

Um escorpião do buraco então pulou

e em três pedaços depressa o foi cortar!

Pela abertura, rápido, o jovem penetrou,

achando um ninho com três ovos à sua frente.

Os ovos eram muito grandes, mas pegou

e os foi levando para fora, um a um.

Não eram ovos de escorpião ou de serpente,

nem de avestruz, outra ave ou animal.

Sobre a esponja os três ovos colocou

e saiu nadando, melhor do que nenhum,

até chegar à outra praia, novamente

e então quebrou-os com a adaga, no final!

De cada ovo saiu uma pombinha,

indo pousar no lombo do cavalo;

foi até lá e tocou-as gentilmente

e então viraram três belas princesas,

cada uma para o beijar mais ansiosinha!...

Peso demais para o animal levá-lo...

e então pôs uma em suas costas, facilmente,

as outras duas no cavalo, muito tesas!...

Quando chegou até a capital,

o reino todo estrondou num festejo!

Mas João e Manuel ficaram com inveja

e os dois com o cozinheiro combinaram...

Assim, logo depois do banquete triunfal,

um após outro, igual que num cortejo,

mentiram ao rei que o seu irmão esteja

dizendo ser bem pouco o que o louvaram.”

O REINO DAS TRÊS POMBAS XIV

“Ele diz que pode matar até o dragão!”

Então o rei lhe indagou se era verdade.

“Não, Majestade, porém eu tentarei,

caso Vossa Majestade assim me ordene!

Mas do perigo livrei o reino de antemão

e lhe posso dizer, com total sinceridade,

que Belfagor, com quem já me encontrei,

não espera outro resgate que o indene!...”

Os seus irmãos aproveitaram a ocasião:

“Vede bem, Majestade! Ele é aliado

do monstro infame! Repartiram o dinheiro!”

“Não é verdade! Vocês dois são meus irmãos!

Por que me tratam com tão feia negação?

Eu vim aqui, pois nosso pai está magoado

E quer de volta vocês dois em seu terreiro!”

“Isso é mentira!” – protestaram os intrujões.

“Majestade, somos seus fiéis criados,

ides aceitar a palavra do estrangeiro?

Vós deveríeis colocá-lo na prisão!”

A princesa mais bonita intercedeu,

mas os fatos estavam embaralhados:

já duvidava o rei do bom aventureiro,

quando se ouviu uma vasta comoção

e lá fora Belfagor reapareceu!...

O dragão exigiu a real presença,

com toda a corte, no alto do terraço.

“Se não viessem, tudo em volta eu queimaria!”

Podia ser tolo o rei, mas corajoso

e saiu à frente de sua corte tensa,

a princesa mais bonita dando abraço

em José, por quem já tanto temia...

Parou Belfagor em seu voo portentoso!

O REINO DAS TRÊS POMBAS XV

Disse-lhe o rei: “Minhas filhas, novamente,

eu não permito que as ouse raptar!

Prefiro a morte sofrer em sua defesa!”

“Não quero filhas...” – zombou Belfagor.

“Meu ouro já lhe mandei inteiramente!...

Nada mais tenho para lhe entregar!”

“Não é ouro que me atrai ou outra riqueza,

quero coisa diferente, meu senhor!...”

João e Manuel aproveitaram o momento:

“É José que ele quer, esse traidor!”

Mas o dragão soltou forte gargalhada:

“José poupou-me a vida e meu tesouro!

Tampouco com isso, porém eu me contento!

Mas lhe entreguei três princesas, sem rancor,

quero três homens para minha tropeada:

serão escravos e lhes tirarei o couro!...”

“Mas quem deseja então, Senhor Dragão?”

perguntou na hora o rei, meio confuso.

“Quero esses três e os três irei levar!”

E foi pegando, sem mais hesitação,

ao cozinheiro, a Manuel e depois a João;

saiu nos ares, num turbilhão escuso,

loucos de medo, os três covardes a berrar,

nunca mais vistos depois dessa ocasião!

Qual prometera, Belfagor não retornou

e José se casou com sua princesa,

em cujo nome o velho rei abdicou

e eventualmente, José tornou-se o rei;

cada uma das outras se casou

com importantes senhores da nobreza

e assim a nossa história terminou,

pelos ditames de sua antiga lei!...

EPÍLOGO

JOSÉ MANDOU CHAMAR A MÃE E O PAI

PARA VIVEREM COM ELE NO CASTELO

E OS DOIS SE CONSOLARAM COM SEUS NETOS.

AQUELES TRÊS, PORÉM, LEVOU O DRAGÃO

PARA UM DESERTO, EM QUE SUA TORRE VAI

TRANSFORMAR EM SUBTERRÂNEO BELO

PARA OURO, JOIAS E TESOUROS BEM DILETOS

E NELES DORME, SEM NUTRIR MAIS AMBIÇÃO.

TRANSFORMOU NUM JAVALI O COZINHEIRO

E JOÃO NUM URSO DE FEROZ ASPECTO,

MANUEL TERMINOU SENDO LEÃO,

OS TRÊS GUARDAS PERPÉTUOS DO TESOURO.

MAS E A FADA E SEU PELUDO COMPANHEIRO?

DESENCANTOU-O NO SENHOR DE SEU AFETO...

Só não perguntem qual o reino em que hoje estão,

onde há séculos os dois vivem sem desdouro!...

Ah, sim, às vezes Dom José sai a caçar

E diz topázio para em ave se virar!

William Lagos

Tradutor e Poeta

Blog: www.wltradutorepoeta.blogspot.com