CONTOS INFANTÍS - BLIMUNDO, O BOI FANTASMA DE CABO VERDE
PRÓLOGO
Desde que eu, Tio Babá, era uma criança, sempre ouvi falar de que no Brasil, as canções de ninar e os contos infantis eram muito violentos. Frases como na cantiga "Acalanto", de Dorival Caymi, que diz: boi, boi, boi da cara preta/ pegue essa criança/que tem medo de careta....; ou a cantiga "Atirei o Pau no Gato" (autor desconhecido), que diz: Atirei o pau no gato/Mas o gato/Não morreu/....ou a cantiga: Nana, neném, Que a cuca vem pegar... ! Enfim, são muitas as cantigas de ninar e contos que estão recheadas de malvadezas e ameaças de morte. Tenho pesquisado muito e achei contos e folclores lusófonos (Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Timor Leste, Angola, ...) várias citações malvadas em contos e cantigas infantis. A meu ver, trata-se de uma tradição latina, talvez com influência grega. O assunto é novo para mim e espero que mais pessoas possam estudar tal fenômeno. E desenvolvê-lo. Boa leitura!
......................................................eis o texto:
"-Havia um boi chamado Blimundo. Era grande, forte, amante da vida e da liberdade. Além disso, era muito amado e respeitado por todos, pois sabia pensar por si próprio, além de ser muito gentil com todos. Ao saber da existência de criatura tão autêntica, o Senhor Rei perguntou-se:
- Que boi seria esse, que ousava ser tão livre em seus posicionamentos e fazendo com que os outros bois lhe seguissem o exemplo? Se ele continuar assim, quem fará depois o trabalho pesado do reino?
Ordenou, então, que Blimundo fosse pego, morto ou vivo. R que fosse trazido até a sua presença. Os homens (soldados) do Senhor Rei saíram em busca do boi; mas este os encontrou primeiro e deu um fim neles. Ao saber da notícia, o Senhor Rei reuniu os homens mais valentes do reino e os mandou capturar Blimundo: e os homens partiram... . (O boi, novamente, deu cabo dos homens)!
Quando recebeu tão triste notícia, o Senhor Rei desesperou-se, mas logo ouviu falar de um rapaz que fora criado no borralho da cinza se prontificava a ir buscar Blimundo.
O rapaz pediu um "cavaquinho", um “bli” d’água e uma bolsa de “prentém”. Além disso, exigiu que quando retornasse, queria a metade da riqueza do reino e a mão da princesa. O Senhor Rei concordou e o jovem partiu. Então o jovem sai em busca do boi, cantando uma canção que deixa Blimundo encantado, na qual o jovem diz que, se Blimundo for com ele, casará com a Vaquinha da Praia. O boi pergunta se é verdade; o rapaz responde que sim! O jovem pede então a Blimundo que o deixe montar, pois o caminho é muito longo. Ele deixa, porém com a condição de que o rapaz continue cantando!
O Senhor Rei colocou a tropa em pontos estratégicos para receber Blimundo. Ao ver o boi chegar, carregando o rapaz no lombo, cansado e feliz, o Senhor Rei não acreditou!
À porta do palácio, o rapaz pediu para descer do lombo de Blimundo a fim de fazer a barba antes de apresenta-lo à Vaquinha da Praia. O jovem, então, conta o seu plano ao Senhor Rei e leva um barbeiro com seus instrumentos até o boi. Atrás deles; o Senhor Rei!
Enquanto o Blimundo sonha com o amor da Vaquinha da Praia, o barbeiro, corta-lhe a garganta com a navalha. Antes de morrer, no entanto, o boi atinge o rei com uma patada que o mata. O rapaz e o barbeiro fogem, mas jamais esqueceram o último olhar de revolta de uma criatura, cujo único erro foi acreditar na harmonia, na justiça e na liberdade."
Glossário:
- bli => cabacinha de levar a água;
- bolsa de prentém => bolsa de pano que se atava à cintura (embornal)
-cavaquinho => instrumento musical de cordas
PS: Este conto é de domínio Público.