A Florista e o Mendigo

No banco de madeira próximo à fontezinha que embeleza o parque, um homem embrulha-se com paginas de jornal, como forma de agasalho, deixando à mostra apenas os pés revestidos por uma par de sapatos rotos e furados.

É mais um desses perdidos da noite, sem lar nem família, e a amplidão do céu serve-lhe de teto.

Ao raiar do dia, espreguiçou-se como de costume. Levantou-se para molhar o rosto na água fresquinha e límpida a fim de limpar as impurezas, dar novo ânimo ao espírito.

Agachou-se para facilitar o acesso ao esguicho da água. Ao terminar, reparou na presença de uma menina sentada na mureta com um punhado de flores nas mãos.

“Ora, ora, o que faz a linda princesinha na manhã recém-iniciada?” – indagou o mendigo – Ou será uma fadinha que se desligou do meu sonho e veio trazer sorte para o novo dia deste velhote?”

A garotinha estudou as feições do homem, fixando bem os vincos de rugas espalhados em ondas por toda a testa, as faces encovadas cobertas por fiapos de pelos grisalhos e respondeu, imperturbável:

“Vendo as flores confeccionadas pela minha mãezinha. Estou entediada, pois, ao sair de casa, ela ficou arriada na cama, ardendo em febre.”

O miserável fez um gesto de comoção, piscou os olhos várias vezes, tentando tomar pé da situação. Conhecia bem a praça. Logo, logo, vários casais de namorados trocariam carícias nos bancos ou mesmo na relva verdejante.

Os pares enamorados foram chegando e o velho desocupado começou a ofertar-lhes flores, com tamanha paixão, que dentro de um quarto de horas havia vendido todas as peças disponíveis.

Quando juntou os trocados, fez a contagem do apurado e certificou-se ser uma boa quantia. Era mais que suficiente para os gastos com a medicação da enfermidade da extremosa mãe.

Ao dirigir-se para o local em que a jovem florista permanecera sentada, tomou um susto tremendo ao dar conta de sua ausência. Apurou a vista fitando toda a extensão do logradouro e nem um vestígio sequer da graciosa garota.

A fadinha desaparecera como por encanto.

O homem das ruas descobriu a maneira de ganhar uns trocados, para todo o sempre.

Rui Paiva
Enviado por Rui Paiva em 05/10/2014
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