O Mito Chamado Humanaiara
Havia certo alvoroço na floresta. Árvores diversas agitavam seus ramos, pássaros voejavam desordenadamente, bichos de todas as espécies corriam aturdidos, ora infiltrando-se em suas tocas, ora disparando em rumos incertos.
Da aldeia mais próxima vinha o aviso aterrorizante por intermédio do batuque dos tambores: a princesa Naiara -, a deusa dos nativos, a mãe protetora dos animais e admiradora dos vegetais -, fora raptada por uns brutamontes a mando de um poderoso rei, que ditava as normas do interior de seu imponente castelo.
Recrutaram a ajuda do pajé da tribo na tentativa de que ele visse o paradeiro da amada jovem. Era um velho índio, já encurvado pelo rigor dos anos, mas portador de uma memória transbordante de conhecimentos.
O idoso feiticeiro raspou alguns gravetos sobre uma pedra reluzente e o calor do contato produziu uma fumaça cinza, cambaleante, e a imagem da saudosa princesa surgiu em forma de vapor.
Todos formaram um círculo ao redor da miragem e seus corações aceleraram quando viram correntes atadas aos seus pulsos e o cenário era de um quarto úmido, de águas gotejantes, em forma de prisão.
O velho pajé mentalizou as figuras de feiticeiros de outras tribos e, em fração de minutos, havia dezenas deles reunidos discutindo o resgate da donzela.
Humaitá, o mais jovem aprendiz da escola de feitiçaria, prometeu que usaria de todo o seu vigor físico e a força de seus conhecimentos para trazer Naiara de volta ao seu ambiente.
Na manhã seguinte, mal o sol despontou, o jovem guerreiro iniciou sua jornada, o corpo todo tingido por vivas cores e desapareceu entre as folhagens.
Passaram sóis e luas e nenhuma notícia da prodigiosa aventura. A nação indígena esperava apreensiva o desfechar de tamanha angústia. As folhas pendiam dos ramos tristemente, os pássaros silenciaram e a bicharada mantinha-se quieta em seus abrigos.
Até que um dia o céu ficou repleto de nuvens carregadas e choveu copiosamente nas terras da linda princesa. Gotas em formas de flechas atingiram em cheio as cabanas dos índios e percutiram no coro dos tambores emitindo sons musicais que lembravam o tradicional toque de paz das tribos.
A silhueta de Humaitá surgiu no meio do aguaceiro trazendo em seus braços a belíssima princesa, a coroa real presa na ponta de sua lança.
Nos dias atuais, há uma obra talhada no tronco de uma grande árvore fincada no meio do terreiro: chama-se Humanaiara e tem a forma de um casal de jovens enlaçados pelo amor.
Ao redor deste monumento homens, mulheres e crianças praticam a dança da paz batendo festivamente em seus tambores seculares.