A moura torta

Jamais vi uma moura em meus tempos de primário. E, então, pelo menos três gerações haviam-se formado de brasileiros abolidos. E éramos uns cinquenta e tantos milhões do Oiapoque ao Chuí.

O ensino era maiormente público e, sem distinção de cor, credo, ou credencial, compartilhávamos bancos escolares que conheciam, aparentemente, só uma discriminação de conveniência, e então das mais fecundas: a das bundas. Nada de nádegas de meninos e meninas dividirem um mesmo banco. Era tabu unir-se pelo cu...chicho. Só mesmo por castigo por uma falta grave, é que um menino era forçado a

sentar-se ao lado de u`a menina.

Hoje talvez já não haja esse tipo de coisa. Parece até que a instrução pública anda tão em baixa que já se não a vê no horizonte. Mas, e as mestras, delas é que me ocorria falar, e fui fazer essa introdução de quase página virar. As mestras eram todas brancas. Muito raramente se via u`a morena mais escura, e não mais que substituta.

Seria só culpa da abolição que não redimira, não incluía o negro socialmente? Os livros didáticos, contudo, corroboravam, com meridiana clareza o que era nossa sociedade de então: as historinhas, com raras exceções, exaltavam os heróis e heroínas europeizados e

carregavam na coloração do vilão, sobretudo, se fosse pagão. Hora de desentortar a Moura?

Paulo Miranda
Enviado por Paulo Miranda em 18/09/2014
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