O Menino e o Besouro

Tinha tudo pra ser mais um, dos tantos finais de tarde inesquecíveis que Gustavinho teria registrado em sua memória. - Pensando bem, este sim - este encabeçará o topo da lista dos inesquecíveis, porém se destacando como o pior, o horrendo, o tenebroso... dia, em que o cansaço e o sufoco faria com quê sua língua colasse, literalmente, no céu - no céu da boca seca; Ele não contava, na verdade ninguém contava com o surgimento súbito daquele monstro em seu caminho; E, isso, com certeza, lhe tiraria o fôlego.

- Ele com 11(onze) e ela 05(cinco) aninhos de idade.

Luísa, a irmãzinha, segurava firme a mão do pai e, do outro lado, Gustavinho, renitente, levava sua bola debaixo do braço, feliz da vida!

Era verão e o calor intenso a todos inquietava, e, desfrutar das belezas naturais do parque era tudo de bom... então, bora lá, passear, brincar e se divertir!

No trajeto, tinham que passar sobre uma ponte e, bem ao lado desta ponte, haviam algumas árvores cobertas de flores, onde sobrevoava um enxame de pernilongos, abelhas, várias espécies de moscas e borboletas. Apesar de estarem ali por causa das flores, da água e do calor, a presença daqueles insetos causava certo desconforto e apreensão aos que transitavam por aquele local.

Eu nunca havia visto nem ouvido falar de algo assim!!!

De repente, eis que surge do nada, em meio àqueles tantos insetos, um “besouro” enorme, gigante, o único e maior de todos os outros voadores presentes. Na cabeça tinha dois chifrinhos, como se antenas fossem, era peludo, gordo e preto, com asas largas e fazendo um enorme barulho, mais parecendo um motor em funcionamento; lembrava também um helicóptero, daqueles que a policia do Rio de Janeiro costuma usar na fiscalização das favelas e aglomerados, quando, num sobrevoo rasante ameaçava um ataque fulminante, ora em zigue-zague, ora em círculos, para frente e para trás, como se estivesse mesmo pronto para atacar, a ponto de ferroar a cabeça de todos que por ali passavam.

Gustavinho, que vestia uma camiseta da Seleção Brasileira de Futebol, amarelinha, mais parecendo uma frondosa flor de girassol ambulante, assustou-se com a presença monstruosa do besouro e começou a correr em volta de seu pai; enquanto Luísa, mais esperta, porém também amedrontada, achou melhor ficar quietinha e agarrada às calças do pai se protegeu daquele monstro barulhento e ameaçador.

Entendendo que ficaria livre das garras do bicho se corresses para bem longe dali, Gustavinho resolveu sair em disparada pelo Parque, deixando para trás o pai e a irmãzinha. Na disparada que tomou, desceu um morro e subiu outro rapidamente passando chispado também, sem ser notado, pelas pessoas que faziam caminhada no calçadão, alcançando assim a grande área gramada com suas árvores repletas de pássaros - pássaros estes que não viu, nem se quer ouviu os cantos... e, quando resolveu parar e dar uma meio-olhada para trás pra ver se tinha ficado livre do bicho, Gustavinho percebeu, ainda mais assutado, que ele estava ali, no seu encalço, bem pertinho de sua cabeça em movimentos bruscos e aterrorizantes:

- Meu Deus, e agora!?

Aflito, continuou numa desenfreada e desesperada carreira, sem saber onde e como se esconder. Precisava então voltar em direção ao pai, pois ali não havia abrigo e não iria aparecer ninguém para lhe socorrer e pôr fim àquele pesadelo real; tudo aquilo parecia brincadeira - mas não era. O besouro, sem dar trégua nem distância continuava sua implacável perseguição que, de tão perto, era possível ouvir o zumbido forte de suas asas: Zuunnnn...zuunnn...zuunnn.

O pai, ainda não acreditando que, de fato, Gustavinho estivesse passando tanto aperto, continuou sua caminhada a passos lentos e, só aumentando a toada quando viu que o menino havia atravessado o campo de futebol e dado uma volta completa por trás de um monte não muito pequeno apontando do outro lado numa corrida ofegante, boca aberta, lábios secos e brancos, descorado, olhos esbugalhados, com uma aparência terrível, pior até que um maratonista olímpico na reta de chegada, após uma corrida de uns 30 quilômetros, batendo seu maior recorde... e o cabuloso do besouro na sua cola “pega que num pega”.

Vendo o sofrimento do filho e percebendo que o besouro persistia o acompanhando, o pai aperta o passo e grita:

- Meu filho, deita, deita; deita no chão, meu filho!

Ele, a ponto de desmaiar, sem forças cai desfalecido aos pés do pai respirando curto de aperto - não conseguindo falar uma frase se quer... o besouro enfim, então posou em uma outra árvore ali por perto como se estivesse levando aquela tormenta do menino numa brincadeira de criança.

Á beira de um colapso, esgotado, Gustavinho sentia-se um morto vivo; não conseguiu tomar água nem ao menos molhar os lábios ressequidos. Passou por tudo isto, mas também não soltou a bola.

Ao ouvir do pai que o besouro possivelmente o teria confundido com uma flor de girassol em agitação, tirou de imediato a camiseta amarelinha e nunca mais a vestiu.

“Uma história real.”

Mandruvachá
Enviado por Mandruvachá em 14/02/2014
Reeditado em 29/10/2014
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