Bolinhas de gude
O Milton defendia de unhas e dentes a atenção do irmão maior Dair. Minha
tentativa espevitada de aproximação para ouvir aqueles doutos ensinamentos no
ramo e rumo das bolinhas de gude foi rechaçada com um sinalizador murro no
nariz, que doeu, me fez chorar, mas me devolveu a consciência de que meus sete
anos de idade eram pouco pros nove do Milton. E bastantes para aprender rápido -
antes do segundo golpe.
O jeito era baixar o facho e o penacho, e seguir a inefável "pecking order", que
também existe no mundimundo dos petizes, pra poder seguir as explicações do
mestre Dair, no alto de seus dez anos. O mano Beu, com seus quatro pra cinco
anos, e o Andrade, irmão menor do Dair e do Milton, beirando os seis, formavam
uma dupla inocente, e senhores de suas próprias brincadeiras, não constituíam
risco à estabilidade da ordem. Na visão miltoniana.
E, impassível, o Dair, dos cabelos cacheados, olhos esverdeados - que podia bem
ser Adail, Adair, Aldair de pia batismal - ia destilando seus ensinamentos, para o
gáudio da tropa, passando-nos noções que se não iriam perdurar por toda uma vida
sobre o "obrigo o avanço", o "não dou limps nem reps", o "de fino ou de grosso", et
coetera, ao menos iriam dar sobrevida às nossas bolinhas.