Ferrado era um gatinho muito simpático que apareceu na porta de dona Mari, numa noite de chuva. Ele estava todo machucado, arranhado e com a patinha sangrando.
Dona Mari lhe deu o nome de Ferrado porque ele, realmente, estava todo ferrado.
Dona Mari tinha sido uma fada, mas não exercia mais a profissão. Tinha ficado apenas com o dom de entender a língua dos gatos.
- O que foi que lhe aconteceu, meu filho?
- Miau, miau, miau, respondeu o gatinho.
- Ah...então você se meteu numa briga, não foi?
- Tenho que lhe confessar, briguei mesmo, só que briguei com um cachorro muito maior do que eu.
- Mas garoto, você não sabia que ia perder?
- Sabia, mas é que o cachorro disse que a minha irmã era muito feia. Aí eu parti pra cima dele.
- Você acha a sua irmã feia?
- Não, eu não acho, mas mesmo que ela fosse feia eu não ia admitir que alguém dissesse isso.
- Ferrado, vou lhe dizer uma coisa. As pessoas não têm valor apenas porque são bonitas. Se fosse assim ninguém que fosse feio seria feliz. Você já ouviu dizer que tem muita gente bonita e até rica que não é nada feliz?
- Já, mas não entendo porque uma pessoa bonita e rica não é feliz.
- Sabe por quê? Porque a felicidade não depende de beleza nem de riqueza. A maior riqueza que a gente possui é o nosso coração, o nosso caráter, o nosso saber e a nossa boa vontade para ajudar a quem precisa. De que adianta ser bonita e ser uma pessoa antipática, rabugenta, mal-humorada, implicante, que não sabe ser gentil com os mais velhos ou com as crianças?
Essas pessoas é que são feias. São feias por dentro, entendeu?
- É, dona Mari, a senhora tem razão. Vou pensar duas vezes antes de brigar novamente. Tô todo ferrado e aceito o nome que a senhora me deu, mas posso lhe fazer um pedido?
- Claro, meu filho!
- Eu queria ser chamado de FERRADÃO. Acho que com esse nome vou meter medo nos outros que quiserem se meter comigo.
- Está bem, mas só se você me prometer que vai se comportar bem.
Ferradão levantou as patinhas, bateu na palma da mão de dona Mari, e disse: a senhora não vai se arrepender. Agora eu gostaria de tomar um banho e ter os meus ferimentos tratados, pode ser?
- Claro, vamos lá pro banheiro. Vou tratar de você como se você fosse meu filhinho. Mas olha, pra viver aqui em casa você vai ter que aprender a arrumar os seus brinquedos sempre que acabar de brincar, como os meus filhos sempre fizeram, tá?
- Mas eu nem tenho brinquedos!
- Mas vai ter. Vou comprar alguns pra você.
- Falou, amiga! Vou ser o gato mais legal que a senhora já conheceu e vou lhe agradecer, até o fim da minha vida, por me acolher. Eu vivia nas ruas desde que me perdi da minha mãe.
- Como você se perdeu da sua mãe?
- Uns caras passaram com um caminhão e levaram ela e minha irmã. A placa do caminhão eu ainda pude ver, era de outro país.
Todos os dias eu rezo pra que elas estejam bem e que ninguém faça mal a elas. Um dia - quem sabe? - elas conseguem voltar.