Dona Coruja e seu idioma

Era uma vez?

Era.

Era uma vez uma Coruja. Esperta. Inteligente. Sábia. Estudiosa.

Um dia, numa praça repleta de animais, Dona Coruja anunciou que queria fazer uma declaração de amor. Um amor do passado. Um amor do presente. Um amor do futuro.

Seu Corujão encheu-se de esperanças, pois há muito tempo gostava da Dona Coruja e não tinha coragem de se declarar para a amada.

Ela vivia muito ocupada, rodeada por gramáticas, dicionários e livros, mas sempre achava tempo de conversar com o Seu Corujão.

Eles eram um pouco diferentes.

Dona Coruja dizia “Como vai?” e Seu Corujão dizia “E aí, beleza?”

Dona Coruja dizia “Interessante!” e Seu Corujão dizia “Maneiro!”

Dona Coruja dizia “Obrigada!” e Seu Corujão dizia “Valeu!”

Será que Dona Coruja ia fazer uma declaração de amor para Seu Corujão? A bicharada estava agitada na praça.

Seu Corujão fez até uma contagem regressiva.

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Finalmente, Dona Coruja se declarou:

- Eu amo a língua portuguesa!...

Todos aplaudiram, menos Seu Corujão. Ele ficou resmungando: “estou com dor de cotovelo”, “dei com a cara na porta”, “me jogaram pra escanteio”, “fiquei feito barata tonta”. E voltou para casa.

Mas a festa continuou, pois não era só Dona Coruja que amava a língua portuguesa.

EU AMO, TU AMAS , ELE AMA, NÓS AMAMOS, VÓS AMAIS, ELES AMAM

Por isso, os animais queriam aprender lições com a Dona Coruja. Mas ela era tão sabida, mas tão sabida que também queria aprender lições com os animais. Dona Coruja fez uma escolinha para todos os animais frequentarem.

As aulas aconteceram normalmente, com o papagaio, o gato, o coelho, o cachorro, a girafa, o elefante, a onça, o leão...

De repente, um novo aluno entrou na sala. Era o Seu Corujão. Ele teve vontade de se declarar para a amada:

“Meu coração por ti gela, meu coração por ti gela”.

Tigela?...

Seu Corujão achou melhor não dizer nada.

Dona Coruja recebeu bem o aluno e explicou que queria aprender com ele, e não apenas ensinar lições para ele.

Mas Seu Corujão achava que não sabia nada.

Durante a aula, Dona Coruja fez uma brincadeira com a linguagem:

─ Papibaquígrafo!

Somente o boi entendeu o gracejo de palavras e respondeu, com outro trava-línguas:

─ O rato roeu a roupa do rei de Roma!

Dona Coruja sorriu alegremente e aproximou-se do novo aluno.

─ Está gostando da aula?

─ Sua aula é MEFS!

─ Como?...

─ Maravilhosa, Extraordinária, Fantástica, Sensacional!

Dona Coruja sorriu. Seu Corujão sorriu.

Eles ficaram encantados um com o outro.

─ Gostaria que você nos ensinasse algo após o recreio...

Ele se sentia incapaz, mas dona Coruja afirmou que ele era muito criativo. Então, após o recreio, ele ensinou os alunos alguns provérbios invertidos:

- Quem espera sempre se cansa, De grão em grão a galinha enche o prato, Quem não tem cão caça com pato...

Todos adoraram e passaram a admirar o colega. A escolinha fazia um enorme sucesso entre os animais. Até que chegou o dia da formatura.

Os animais estavam vestidos de beca e acompanhavam a cerimônia sentados, cheios de emoção. Os bichos haviam escolhido Seu Corujão para ser o orador da turma. Ele fez um lindo discurso, em que afirmou:

─ “Caríssimos, hoje, somos poliglotas na nossa própria língua, pois aprendemos que a língua portuguesa muda de acordo com as pessoas, com os lugares, com o tempo, com as situações. E descobrimos, maravilhados, que realmente o português são dois!...”

Então, Seu Corujão anunciou que faria uma declaração de amor. Dona Coruja encheu-se de esperanças, pois há muito tempo gostava de Seu Corujão e tinha vergonha de se declarar. Logo Seu Corujão pediu a atenção de todos.

Dona Coruja fez uma contagem regressiva, enquanto os animais faziam silêncio:

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Então, Seu Corujão afirmou, com orgulho:

─ Eu amo e sempre amei... aquela que me ensinou a amar a língua portuguesa!...

Todos ficaram surpresos com a revelação.

─ OHHHH!

Seu Corujão solicitou que Dona Coruja subisse ao palco. Ele beijou sua mão e a pediu em casamento.

Ela disse “sim”. Ele disse “sim”.

E eles? Foram felizes para sempre... E eles foram. Felizes para sempre...

Kate Lúcia Portela
Enviado por Kate Lúcia Portela em 27/12/2012
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