Amiguinhos indiscretos

Amiguinhos Indiscretos

Será capricho , fascínio

Ou coisas do destino,

Esta minha relação com os números?

Bem cedo por eles me apaixonei.

E destes indiscretos nunca mais me livrei.

Vivemos grudados há anos.

Da minha vida participam, minhas alegrias

Minhas mágoas, acertos, tristezas,

Conquistas, amores, desilusões, desenganos.

Sem eles sentir-me-ei mutilada, com certeza.

Vejam o numero "um". Fininho com bonezinho.

Ocupa sempre o primeiro lugar.

O zero é azarado. Pelos estudantes odiado.

Á esquerda nada vale. À direita inverte tudo.

Nas adições e subtrações é inoperante.

Nas multiplicações tudo anula.

Se assume o papel de expoente,

Faz qualquer número virar “um”

Como assim? Estou perplexa.

Se tenho 5000 pontos e os elevo a zero

fico com um. Pra onde foram parar

os meus outros 4999 pontinhos?

Bem... às vezes até acho que, na surdina, alguns,

desta mágica já se utilizam.

Sei não! É meio flex este redondo!

Já pensou se os banqueiros

este macete descobrem?

Estamos perdidos.Pobres correntistas...

Eles e outros ... lá pros lado do Planalto

É o que se ouve por ai.

E o número dois? Se ganhar umas nadadeiras,

cai na lagoa feito patinho

E o número oito? Deitado vira infinito

Partido ao meio, na vertical, vira dois zeros.

Mas a metade de oito não é quatro?

Se seccionado na vertical

vira dois números três, um deles espelhado.

Vai entender estes danados!

O quatro, se trocar sua única perna de lugar,

sai da álgebra e cai na geometria

Vira um quadrado.De qualquer lado,

Em pé ou deitado. Que folgado!

Perneta, sem muleta, nunca perde a simetria.

O seis gosta de imitar um atleta

No salto a cavalo É transformista?Vai dar o que falar.

De ponta a cabeça vira nove.

O sete possui um telhado

em formato de bengala.

Dizem que é o preferido dos mentirosos

venerados por alguns políticos..

Foi parar até na mão de Carlitos.

Às vezes pego pesado com estes danados

faço deles o que quero

adiciono, subtraio, divido, multiplico,

noves fora zero.

E a famosa tabuada. "Fatos" corrige minha filha.

Ali, todos enfileirados

Exatidão, sem vacilação.

Adição, contrário da subtração

multiplicação inverso da divisão

Tudo farinha do mesmo saco

Sempre tem uma carta no casaco,

ou debaixo do braço.

Eu adoro matemática, dizia Silvia

Menininha faceira e falante, tamanho, nem idade tinha.

“Matamática é tão fácil, matéria boazinha” defendia

“A gente nem precisa pensar.

As respostas são lógicas, é só olhar.”

Mas acho que era só ela que as via.

Com surpresa recebi outro dia

meu extrato bancário.

Saldo negativo: menos duzentos reais.

Fui reclamar com o gerente.

Ele chamou o contabilista

Óculos de lente sem aro,pose de artista

que foi logo explicando:

Débito maior que crédito

calcula-se a diferença e o sinal e do maior.

Logo meu saldo era negativo, tinha uma dívida com o banco.

Gastara mais do que ganhara.

“Um a zero” pro banqueiro, no placar.

Pensei que os números fossem meus amigos

Aposto que irônicas risadinhas esboçaram.

Não perderiam esta chance, de jeito nenhum.

Possessa e apressada atravessei aquele catavento

que não sei se é porta ou armadilha.

Correndo para agarrar todos eles

e esmagar um por um.Pouco importa!

Mas como são ágeis, sequer consegui pegar um.

Para me vingar resolvi fazer algo

que jamais eles imginariam.

Por esta eles não esperavam.

Depois destes anos todos

Preparei uma vingança, uma supresa

De propósito, mudei de matéria

Abandonei os números e busquei as letras.

Não quero mais ser matemático, agora sou letrista.

Expulsos do meu escritório

Por essa eles não esperavam

Aí,reunidos contra mim, se revoltaram

Disseram que de poeta não tinha nada,

Valia menos que o zero.

Meu Deus! Que falatório.

Meu sossego acabou. Enlouqueci.

E cansada desta contenda

E para reconquistar meu sossego

Resolvi fazer um acordo de cavalheiro.

Deixá-lo-ias ficar na sala o dia inteiro

Em silêncio, nem um pio queria ouvir.

.

E daqui eles não arredaram mais o pé.

Faço zero de bola, amasso o oito, esbarro

no sete, arranco a perna do quatro.

Transformo o seis em nove,

amasso a barriga do cinco.

E boas gargalhadas dou

quando escuto um estrondo

de uma pirâmide no chão se estatelar.

É que, curiosos, loucos para bisbilhotecar

os textos que estou a digitar.

Sobem uns sobre os outros, para o teclado alcançar.

E se esborracham, ao equilíbrio desafiar

E, assim que conseguem desembolar-se

saem de mansinho, pé ante pé, tentando despistar.

para tratar das feridas,

antes de uma severa bronca levar.

Continuo a digitar os textos, minha escrita, minha fuga

Agora sou de outras paragens, talvez cronista

poeta, colunista. Letrista.

O sol se põe. A noite chega tenebrosa

Cheia de uivos e lua coberta de sombras

É lua nova. O céu um manto de escassas estrelas

Na tela já não há mais espaço

Exausta, o corpo clama pelo sono dos justos

Uma cama macia, um edredon gostoso

fazer amor com um atleta...

ou quem sabe sonhar com um poeta!

E olhem só o que vejo!

Esparramados, a ressonar, sobre meu travesseiro macio.

Fronha limpinha, perfumada, recém passada.

Os folgados, de pernas pro ar.

Desta vez foi demais, abusaram da minha paciência

Fora!!!... Já!!!!!

!Bastou um só grito e correria geral.

Bati a porta.

Dei uma de general...

Nem percebi que o pobre do perneta

Ficara com sua perna espremida

Bem no meio do porta!

Ainda bem que não foi nada fatal.

Amanhã ele faz alongamentos

A fisioterapeuta dará um jeito

E ele sairá novinho, para a sua troupe se juntar

Sossego sei que não nunca mais me dará.

Maggá