A FESTA NA TERRA

Todos os anos, assim que chegava a primavera, havia no céu uma grande festa, a ponto de deixar todos os bichos das florestas e dos bosques inquietos.

Os convites para a grande Festa no Céu eram expostos cuidadosamente nos troncos das árvores das florestas. E neles se liam assim:

CONVITE

Todos os moradores desta floresta e dos bosques vizinhos estão convidados para a Festa no Céu a ser realizada na primeira semana da chegada da primavera. A festa será gratuita e, desde já, contamos com a presença de todos.

Dizem que quando os bichos das florestas e dos bosques vizinhos liam os convites endereçados a eles, todos ficavam entusiasmados e não se falavam em outra coisa senão da Festa no Céu.

Todos os animais das florestas e dos bosques vizinhos sonhavam acordados em estarem na Festa no Céu cantando, dançando e comendo à vontade.

Mas, coitados! Quando chegava o dia de ir para o céu a fim de participar da grande festa, muitos, entre todos os convidados, se aquietavam os ânimos, pois, na verdade, somente podiam ir à festa aqueles que possuíam asas.

Quem diria que a festa anunciada a todos os animais das florestas e dos bosques vizinhos tornava-se, no final das contas, a festa das aves, porque somente a elas competia o grande poder de voar pelo infinito...

Aos animais que ficavam na terra, restavam apenas imaginar como seria a grande Festa no Céu!

E, como Ícaro, sem ter asas para voar, os animais que não possuíam asas, olhava para o espaço e sonhavam em um dia voar. Teriam, eles, de inventar asas colocadas com ceras ou alguma astronave para algum dia irem também à festa no céu? Por que a festa acontecia em um lugar longe, infinitamente longe?

Como todos sabiam que o sabiá sabia de tudo, eles pediam para o sabiá lhes contarem sobre a festa.

O sabiá contava, dizendo ser a festa maravilhosa! Segundo ele, lá havia todos os tipos de cantos, de danças e de comidas, além de um desfile maravilhoso de aves, quais, cá na terra haviam entrado em extinção e que algumas delas moravam no céu para se esconderem do bicho-homem.

O sabiá falava sobre o desfile. No desfile participavam a arara azul, o tietê-de-coroa, o pica-pau-do-parnaíba, o soldadinho-do-araripe, o paruru-espelho, o tiê-bicudo, a rolinha-do-planalto, o macuquinho-baiano, o gavião de pescoço branco e outras aves que nem eram mais lembradas nas florestas e nem nos bosques do Planeta Terra.

O tempo foi passando e todos os anos na primeira semana de entrada da primavera havia a Festa no Céu. E como as florestas e os bosques são lugares onde todas as espécies de animais habitam, os convites eram sempre afixados cuidadosamente nos troncos de suas árvores, tornando-se aberto a todos com a expressão “contamos com a presença de todos”.

Ora, ora, pensava o tatu Peba, como “contamos com a presença de todos”, se a festa era no céu e quem somente podia voar para lá eram as aves, porque têm asas. Ora, não havia outro meio de transporte capaz de levar tatus, onças, tigres, leões, coelhos, serpentes, minhocas, tartarugas e tantos outros bichos...

E o tatu Peba, certo dia, vendo a bicharada toda falante e animada devido aos convites da Festa no Céu, feito a todos das florestas e bosques vizinhos, desatou a rir. Os bichos queriam saber o motivo da risada do tatu Peba. Alguns pensavam com alegria que talvez o tatu Peba soubesse um meio de levar todos os animais das florestas e dos bosques vizinhos para a animada Festa no Céu.

- Será?

- Que nada!

Dizem que o tatu Peba, aproveitando-se da curiosidade de todos os bichos das florestas e dos bosques vizinhos, ele resolveu programar uma grande reunião na Floresta Azul, à beira da Lagoa Dourada, onde havia um grande espaço para todos se reunirem. Ele fez os convites e distribuiu-os, com a ajuda da família Peba, pelas florestas e pelos bosques vizinhos.

Convite

Eu, tatu Peba, convido todos os animais das florestas e bosques vizinhos, quais não podem ir à Festa no Céu, para uma reunião de interesse de todos, a ser realizada no sábado, às 14h00min., na Floresta Azul, próxima à Lagoa Dourada Conto com a presença de todos vocês.

Os bichos de todas as florestas e bosques vizinhos, quais não podiam ir à Festa no Céu, ao lerem os convites, compareceram todos à reunião do tatu Peba no dia e hora marcados no grande e bonito relvado da Floresta Azul, próxima à Lagoa Dourada. Eles pensavam que o tatu Peba iria apresentá-los um projeto capaz de levar todos à Festa no Céu...

Lá, o tatu Peba não apresentou nenhum plano ou projeto de levar os bichos à Festa no Céu, ele simplesmente queria alertá-los sobre alguns pormenores, quais ele sempre observava escritos nos convites, feito pelos organizadores da grandiosa festa. Ele disse:

- Todos os anos, quando acontece a Festa no Céu, todos nós das florestas e dos bosques vizinhos pensamos que somos convidados. Mas, porém, no dia de ir à festa, todos acordam lembrando que para chegar lá é preciso ter um belíssimo par de asas. Aos animais que não possuem asas, todos se conformam e nunca se sentem excluídos da grande festa, pois sabem que o convite foi feito a ele e a todos e que somente não houve a possibilidade de viajar. Isso vem acontecendo anos, após anos, e ninguém nunca protestou contra nada.

A anta que estava quietinha dentro da lama, próxima à Lagoa Dourada, escutou a proposição do tatu Peba a respeito do convite feito a todos, mas não de uma festa para todos e logo tagarelou.

- Ora, tatu Peba será se você não está equivocado? Os convites, como todo convite, foram feitos para todos, mas apenas alguns convidados comparecem. Eu, por exemplo, como sou gorda e pesada jamais irei a uma Festa no Céu. Mas fico contente de saber que mesmo assim eu fui convidada. Ser convidada, para mim, é ser lembrada!

Do outro lado, em cima de uma enorme árvore, o macaco-prego estendia as mãos para dar o seu recado.

- Ora, ora, eu não queria ser apenas lembrado, eu queria também ir à festa. Por isso treino mil saltos altos para ver se consigo chegar ao céu, mas até hoje não tenho conseguido. Na minha última tentativa, ao pular do alto de um coqueiro, eu quase quebrei as minhas pernas...

E a tartaruga lembrou a todos o seu triste fado, quando certa vez resolveu ir à Festa no Céu.

- Ora, eu por minha vez, atrevi a ir à Festa no Céu entrando no violão do urubu. Lá, durante todas as cerimônias de cantorias, danças, comilanças, apresentações e desfiles, eu tive que manter escondida para que ninguém me visse. Na hora de voltar para casa, o urubu descobriu-me dentro do violão e pronto. Ele, dando risadas, atirou-me do espaço. Eu, infelizmente, cai numa enorme pedra e quebrei todo o meu casco. Veja amigos, a marca da queda: no meu casco há uma porção de remendos...

O jabuti e o sapo também contaram as suas histórias de se aventurarem na festa e darem-se mal com o urubu. Os dois traziam também marcas nos corpos das tragédias sofridas ao serem lançados do espaço.

O tatu Peba aproveitou o desabafo da tartaruga, do jabuti e do sapo e discursou.

- O urubu, logicamente, deve ter ficado com raiva devido ao fato de os nossos amiguinhos terem escondidos em seu violão, sem avisá-lo, para irem à Festa no Céu. Mas, mesmo assim, ele não devia ter agido tão brutalmente, a ponto de atirar os nossos amiguinhos do espaço. Ora, ora, se os convites foram extensivos a todos, não custava o urubu lembrar que o instrumento arranjado pela tartaruga, pelo jabuti e pelo sapo, para a difícil viagem, foi o violão dele. Eles bem que mereciam ganhar um prêmio na festa devido as suas sapiências e audácias, pois foram os primeiros animais sem asas a chegarem ao céu. Que fantástica ideia! Não fez o mesmo o bicho-homem, viajando para a Lua, dentro de uma grande nave? A nave dos nossos amiguinhos foi o violão do urubu...

Todos os bichos concordaram com o tatu Peba e, lembrando-se das tristes tentativas do macaco-prego e do insulto sofrido pela tartaruga, pelo jabuti e pelo sapo, eles, portanto, resolveram se manifestar o repúdio à grande festa de exclusão aos animais que não possuem asas.

No dia seguinte, dizem que eles saíram de tronco em tronco pelas florestas e, cuidadosamente, tiraram os convites afixados neles sobre a Festa no Céu e jogaram nos lixos.

Dona coruja, como sempre muito sábia e astuciosa, ao ver o repúdio dos bichos pelos convites da festa, sentou tranquilamente em sua mesa e escreveu outro convite assim.

CONVITE

Convidamos todas as aves desta floresta e dos bosques vizinhos a participarem da grande Festa no Céu a ser realizada na primeira semana da chegada da primavera. A festa será gratuita e, desde já, contamos com a presença de todas as aves.

Ao mandar fixar os convites sobre uma nova proposta de convidados, cuidadosamente, nos troncos das árvores das florestas e bosques vizinhos, os bichos que não possuíam asas e nem podiam voar se reuniram novamente à beira da lagoa e inventaram também fazer uma grande festa na terra.

Ora, se havia todos os anos uma festa no céu, logo haveria de existir também uma festa na terra. E assim pensaram e fizeram os convites convidando todos os animais das florestas e dos bosques vizinhos para comparecerem na grande Festa na Terra.

CONVITE

Convidamos todos os animais desta floresta e dos bosques vizinhos a participarem da grande Festa na Terra a ser realizada na primeira semana da chegada da primavera. A festa acontecerá próximo à Lagoa Dourada da Floresta Azul. Ela será gratuita e, desde já, contamos com a presença de todos os animais.

Dizem que em outros tempos os perus, as galinhas, os galos, os patos, os cisnes, os marrecos, os gansos, as galinhas da angola, os pavões, os avestruzes, os faisões, as emas, as seriemas e as saracuras podiam voar alto a ponto de irem todos os anos à Festa no Céu. Mas, porém, quando eles souberam que os animais considerados excluídos da Festa no Céu, fariam também uma grande Festa na Terra, eles fizeram uma reunião e resolveram prestar uma solidariedade a todos os animais das florestas e bosques vizinhos. A presteza solidária seria de eles não irem à Festa no Céu, mas à Festa na Terra, para prestigiá-la, reparando assim o erro da exclusão mal pensada exposta nos convites anteriores feitos pelos organizadores da Festa no Céu.

Os convites da Festa na Terra, afixados cuidadosamente nos tronos das árvores das florestas e dos bosques vizinhos, não excluíam ninguém. A expressão “contamos com a presença de todos os animais”, animava-se a vinda até dos peixes marítimos, quais migravam em cardumes do mar para os rios e dos rios aos lagos, chegando facilmente à Floresta Azul, na Lagoa Dourada.

No dia da grande Festa no Céu, todas as aves voaram pelo espaço em busca dos caminhos que os levassem para a grande festa deles...

Todas as aves voaram rumo ao céu, exceto os perus, as galinhas, os galos, os patos, os cisnes, os marrecos, os gansos, as galinhas da angola, os pavões, os avestruzes, os faisões, as emas, as seriemas e as saracuras, quais se esconderam em suas casas, prometendo apenas aparecerem à Festa na Terra, lá na Floresta Azul, próxima à Lagoa Dourada.

E os animais das florestas e dos bosques vizinhos de todas as espécies que ficaram na terra, também haveria de se divertir, pois, na Floresta Azul, próxima à Lagoa Dourada os organizadores da Festa na Terra terminavam os preparos finais da festa.

Dizem que quando chegou o momento de acontecer a Festa na Terra, todos os animais das florestas e dos bosques vizinhos chegaram animados. Uns animais traziam violas, violoncelos, outros tambores, pandeiros, reco-recos, flautas, gaitas e acordeões para garantir a animação da festa.

Nas grandes mesas estendidas debaixo das árvores havia todos os tipos de comidas gostosas. As receitas das guloseimas foram feitas de acordo com o gosto de cada espécie de animal das florestas e dos bosques vizinhos.

E no centro do relvado havia um espaço reservado para todos dançarem à vontade. Cada espécie de animal mostraria com alegria a sua dança mais interessante.

Animais e mais animais chegavam de todos os lugares para a Festa na Terra. Entre os animais que chegavam de todos os lugares, apareceram na festa, os perus, as galinhas, os galos, os patos, os cisnes, os marrecos, os gansos, as galinhas da angola, os pavões, os avestruzes, os faisões, as emas, as seriemas e as saracuras alegres e sorridentes.

Todos os animais sem asas olharam espantados para essas aves, pois, como elas possuíam asas, elas deveriam ter ido à Festa no Céu e não propriamente ter ficado para a Festa na Terra. Um dos perus, portanto, soltou um glugluglu e foi logo explicando.

- Ora, meus amigos, como sabem, nós moramos todos por estas florestas e bosques vizinhos e como os convites de vocês para esta festa, não excluíam ninguém, resolvemos não ir ao céu para prestigiá-la. Vejo, porém, que a grandeza desta festa pode ser comparável igual à Festa no Céu, onde todos se divertem para valer.

E um dos avestruzes, a maior ave do planeta, disse também.

- Não foi à-toa que nós escolhemos ficar aqui. Viemos nesta festa para prestar as nossas solidariedades devido à forma de como a maioria dos animais foram excluídos da Festa no Céu. Os convites, quais pareciam feitos para todos, no final das contas era somente para as aves. E creio que tudo isso gerava chacota entre os verdadeiros participantes da Festa no Céu, em relação a todos aqueles que não possuem o poder de voar.

Os patos, os cisnes, os gansos e os pavões abriram as suas asas coloridas e fizeram uma maravilhosa dança, qual estava ensaiada para ser apresentada na Festa no Céu. Todos os bichos da terra ficaram encantados com a belíssima apresentação deles.

Todos os animais das florestas e dos bosques vizinhos, mesmo os que possuíam asas e não foram à Festa no Céu, se divertiram a noite inteira, cantando, dançando e comendo de todas as receitas, conforme foram feitas de acordo para cada espécie...

No final da festa aconteceu um grande desfile. Os convidados a desfilarem na passarela de tapete vermelho foram o cachorro-vinagre, o cervo-do-pantanal, a jaguatirica, o lobo-guará, o mono-carvoeiro, o mico-leão-dourado, a onça-pintada, o tamanduá-bandeira, o tatu-canastra, o veado-campeiro, entre outros animais difíceis por aquelas florestas e bosques, porque o bicho homem havia afugentados com eles dali...

A Festa na Terra, assim como a do Céu, foi muito bonita e animada, a ponto de se tornar uma tradição para acontecer todos os anos, tendo como principal objetivo de mostrar que na Declaração Universal dos Direitos dos Animais, há a seguinte afirmação: “Todos os animais têm o mesmo direito à vida”.

E dizem que os perus, as galinhas, os galos, os patos, os cisnes, os marrecos, os gansos, as galinhas da angola, os pavões, os avestruzes, os faisões, as emas, as seriemas e as saracuras por terem gostado demais da Festa na Terra, eles nunca mais se atreveram a voar para o céu. E, de tanto ficarem na terra e não treinarem os seus vôos, eles acabaram perdendo o poder de voar alto. Mas isso, felizmente, não impediu que eles fossem felizes para sempre...

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