A GALINHA E O GRÃO DE MILHO
A G A L I N H A E O G R Ã O D E M I L H O
A Carijó, uma galinha da melhor estirpe, ciscava sem muita convicção. O sol estava a pino no céu azul e limpo de qualquer nuvem, passava alguns minutos do meio dia, era aquela ora que quem está bem alimentado entra numa madorna, parece querer dormir, porém não é hora para tal, não estamos acostumados com a sexta vespertina, mas a preguiça é tanta que se faz às tarefas diárias assim com quem não quer fazer.
Ela ciscava por ciscar, estava de papo cheio. Não queria e nem precisava comer nada, mas o hábito fazia com suas pernas se movimentassem para frente e para traz, e lá estava ela naquela labuta de revirar a terra se afastar um pouco olhar, e se não visse nada voltava a ciscar, e novamente ciscava, assim passava o tempo.
Quando estava para parar e se mudar para outro montículo de cisco eis que alguma coisa dourada brilhou num relance, ela com paciência e parcimônia voltou a revolver a terra fofa e lá estava aquele lindo e maravilhoso objeto brilhoso, um grão de milho. Carijó simplesmente levou o bico até aquela preciosidade, sem, no entanto querer comê-lo, movimentou um pouco para o lado, admirou-o, era realmente lindo lindo.
Ela estava satisfeita consigo mesma, pois além de não comê-lo, resolveu de imediato que iria plantá-lo. Mas antes devia fazer um acordo, ou melhor, um contrato com seus amigos e vizinhos. Com certeza eles quereriam comer aquela belezura de grão de milho, assim que o vissem, se não, quando nascesse e crescesse viçoso era dito e certo. Pior seria se resolvessem comer a colheita antes da hora.
Carijó reuniu-os ali no fundo do quintal, lá estavam: seu marido o galo, seu amigo o pato, seu vizinho o porco, seu mais ou menos conhecido o cabrito, e para surpresa sua também estava presente o boi.
Ela explicou a situação na forma mais clara possível:
- Achei um lindo grão de milho e resolvi plantá-lo, para que na colheita possamos nos fartar da sua produção, mas quem de vocês irá regá-lo?
- Eu não. Disse o galo.
- Eu não. Disse o pato.
- Nem eu. Disse o porco.
- Nem eu. Disse o cabrito.
- Muito menos eu. Disse o boi.
Ela plantou-o. Regou-o. O grãozinho nasceu, cresceu verde escuro, viçoso e garboso, mas o mato também cresceu junto. Novamente Carijó reuniu seus amigos e perguntou:
- Quem irá carpir o mato em volta do nosso pé de milho?
- Eu não. Disse o galo.
- Eu não. Disse o pato.
- Nem eu. Disse o porco.
- Nem eu. Disse o cabrito.
- Muito menos eu. Disse o boi.
Ela retirou o mato de entorno do pé de milho. Agora este precisava de adubo. Novamente Carijó chamou seus amigos na responsabilidade:
- Quem irá adubar nossa lavoura?
- Eu não. Disse o galo.
- Eu não. Disse o pato.
- Nem eu. Disse o porco.
- Nem eu. Disse o cabrito.
- Muito menos eu. Disse o boi.
A galinha adubou-o. O pé de milho se tornou uma formosura. Duas belezas de espigas brotaram dele. Cresceram maravilhosas. Amadureceram. Era a ora da colheita:
- Quem irá colher as espigas de milho?
- Eu não. Disse o galo.
- Eu não. Disse o pato.
- Nem eu. Disse o porco.
- Nem eu. Disse o cabrito.
- Muito menos eu. Disse o boi.
A Carijó colheu. Preparou um banquete e convidou seus amigos, e perguntou?
- Quem quer comer estes lindos grãos de milho?
- Eu quero. Disse o galo.
- Eu quero. Disse o pato.
- Eu também quero. Disse o porco.
- Eu também quero. Disse o cabrito.
- Muito mais eu. Disse o boi.
Com justiça a galinha distribuiu explicações:
- O Senhor meu marido galo, não plantou; não come. Você meu amigo pato, não regou; não come. Meu vizinho o porco, não carpiu; não come. Meu quase conhecido o cabrito, não adubou; não come. E o “seu” boi, não colheu; não come. Quem não trabalha, não come. Então como eu. E comeu.
(abril/1987)