A criança e a árvore

- Árvore, como você é grande!

- É, sou mesmo. Mas já fui do seu tamanho e até menor.

- Poxa, eu vou ficar do seu tamanho também?

- Não, amiguinho. Você é humano. E cresce só até a altura de seus pais, mais ou menos.

- Mas eu queria ser uma árvore.

- É gostoso ser árvore, mas tem as suas desvantagens.

- É? E quais?

- Há... São tantas! Por exemplo, a qualquer momento eu posso ser derrubada para fazer móveis e outras coisas.

- Mas nós humanos, muitas vezes somos derrubados também, mas sem nenhum propósito.

- É, nesse ponto estou na vantagem então.

- Além do mais vive muito mais que eu.

- Está certo novamente.

- Árvore, pra que você tem flores tão bonitas?

- É para os homens aprenderem a olhar para o alto.

- E o que tem no alto?

- Tem Deus, menininho! Lá no alto.

- Então você está mais perto de Deus que eu?

- Não, amiguinho. Ele mora lá no alto, mas está em todos os lugares. Desde que ele seja buscado, está em todo lugar. Altos ou baixos.

- Entendi. Mas continuo querendo ser uma árvore assim como você.

- Não sei o que dizer.

- Gosto de você. Sua sombra é muito agradável.

- Obrigada. E você é muito amável.

- Quando eu crescer, quero continuar seu amigo.

- Infelizmente não será possível, pois você deixará de falar comigo.

- Não vou não.

- Há, vai sim. Estou acostumada. Nem ligo mais.

- Então não quero crescer.

- Não tem jeito. Vai crescer mesmo sem querer.

- Está me dizendo adeus?

- Não. Apenas dizendo que você vai deixar de falar comigo.

- Será? Gosto tanto de você.

- Bem... Você pode continuar a falar comigo sempre. Mas não deixe os adultos perceberem.

- Porque?

- Porque eles não entenderão.

- Combinado então. Será nosso segredo.

- De minha parte estamos combinados.

- Preciso ir, minha mãe está chamando.

- Está certo. Obrigada pela companhia.

- Não saia daí. Assim que der eu volto pra conversar mais com você.

- Pode deixar. Estarei sempre aqui, esperando você.

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Hoje aos 76 anos de idade:

- Bom dia, minha velha e amiga árvore!

Não ouço sua voz, mas sinto um suave vento em suas folhas. Sinto a sua presença. Sinto que apenas a linguagem mudou. Mas ao seu modo ela continua a responder aos meus cumprimentos. Sinto um indescritível bem-estar debaixo de sua sombra.

E continuo olhando para o alto. Suas flores enchem os olhos. Deus deve mesmo estar lá.

Aqui embaixo dessa sombra, eu já confidenciei aos meus filhos e aos meus netos a nossa amizade. Eles ficaram maravilhados. Mas depois cresceram e dispersaram.

É, eu sei que tenho uma amiga. Pena que não posso compartilhar com muita gente. Me chamariam de doido.

Faria Costa
Enviado por Faria Costa em 19/08/2010
Reeditado em 04/10/2010
Código do texto: T2447095
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