A RATINHA -*

INTRODUÇÃO

— Hora de dormir, Ana Clara. Já escovou os dentes?

— Já papai. Conta uma estorinha?

— Esta bem. Eu conto. Na caminha!

Olha-me e faz o sinal da cruz antes de se deitar, boceja e se acomoda em seu edredon, pega seu bicho de pelucia favorito e se acomoda com ele no travesseiro e me pergunta:

— E a estorinha?

— Tá bom.

Faço-lhe um carinho acomodando seus cabelos e começo a contar-lhe.

A RATINHA

— Era uma vez uma linda fazenda com muitas arvores bem grandes e bonitas, e um lindo pomar. E tinha tambem vacas, bois, galinhas, cachorros, passarinhos e um gato.

— Um gatinho? Era bonitinho?

— Era sim, era um gato bem manso e só sabia comer e dormir em um banco pendurado na varanda que ficava balançando com o vento.

— Então era por isso que ele dormia.

— Ele era muito preguiçoso, isso sim, e por isso gostava do banco, não servia nem mesmo para correr atrás dos ratos.

— Tinha muitos ratinhos?

— Claro, como toda fazenda. Mas dessa vez não eram muitos ratos, era só uma ratinha que vivia em sua toca cuidando de seus filhotes. Mas a dona Astúria se incomodava por demais com ela.

— Quem era Astúria?

— A dona da fazenda.

— Ela éra legal?

— Menos para a ratinha que tirava seu sono. Igualzinho a você, se não parar de falar. Fique quietinha e escuta. Tá bom?

— Tá.

E volto para estoria observando seus pequenos olhos que ensaiam querer fechar.

— E numa bela noite um manto estrelado cobria a fazenda. E de dentro da toca um dos filhotes ficou encantado com aquele céu. Aí a ratinha se aproximou carinhosamente e o envolveu para aquece-lo, ele aproveita e faz uma pergunta:

— Mãe, quando é que vamos sair?

— Quando vocês crescerem e ficarem fortes.

— Eu vou poder correr pelos campos, livre como as estrelas?

— Ora essa! As estrelas não correm, elas ficam lá no céu, piscando.

— É claro que elas correm. E apontando para a estrada e dizem: Lá vem vindo duas em nossa direção.

— A ratinha acha muito estranho as tais estrelas e fica na ponta das patas dianteiras, fazendo movimentos rapidos com a cabeça para farejar o ar a procura de algum odor que significasse perigo á sua ninhada. Mas para sua surpresa eram os farois da caminhonete de dona Astúria. Ai lembrou-se do horario rotineiro para irem á venda na cidade e a preocupação virou alegria tomando conta de sua cara. Vira-se para seu filhote e diz:

— Não são estrelas são eles chegando da venda de caminhonete.

— Com bicoitos?

— Talvez!

— Doces?

— Quem sabe? Mas com certeza… E pula em cima de seu filhote brincando e diz: Com certeza vamos ter coisas gostosas, pois eles sempre trazem queijos, doces, biscoitos e um monte de outras coisas.

— Queijo! Gritaram todos, pra gente!

— Claro que não! Mas nada me impede de ir buscar um pedaço, hoje a noite.

— Legal! E que tal uns biscoitos, chocolates e outras coisas gostosas.

E a Ana clara fazendo um rostinho sério…

— Iorgurte tambem, de morango, né papai?

— Claro, mas escuta o resto da estorinha. Eles cantavam e brincavam fazendo um barulho danado. A ratinha tratou de acalmá-los, não queria que isso denunciasse o local de sua toca. Afinal a cobra era uma ameaça constante á espreita. Se os ouvissem poderia colocar todos em perigo. E ficaram na entrada da toca admirando a quantidade enorme de pacotes que descarregavam da caminhonete. E se passou um bom tempo e quando a Lua estava bem alta e todos na casa já dormiam, voltou-se para seus filhotes e pediu que se mantivessem em silêncio enquanto estivesse fora. Eles a obedeceram. Saiu em meio a escuridão, camuflada por galhos, folhas e por tudo que a mantivesse escondida. Seu coração batia rápido de medo e de preocupação em deixa-los sozinhos. Quando chegou na cozinha, viu muitos pedaços de queijos faceis de mais para pegar, pensou, e quando se aproximou pode ver o motivo de tanta facilidade, eram ratoeiras. No minimo uma dezena delas. Deu um grito de pavor sem sentir.

E Ana Clara, atenta:

— O que é ratoeira?

— É uma armadilha para pegar rato.

Ela faz um biquinho de censura com os labios e me pergunta.

— E dói?

— Dói e muito, depois eu falo sobre elas, deixa eu contar.

E brinco com a ponta de seu nariz.

— Depois me conta das ratoeiras.

— Tá bom. Posso continuar?

Mas antes de responder ela levanta o edredon como se tivesse que checar alguma coisa, se acomoda novamente, põe as mãozinhas sobre ele e me diz séria:

— Pode!.

E volto a estória fazendo um carinho em suas mãos.

— E na mesma hora a ratinha saiu em disparada pela fazenda, tinha que levar comida para seus filhotes, e assim que chegou no curral encontrou o boi, subiu na cerca e foi logo pedindo.

— Por favor me ajude, eu preciso levar comida para meus filhotes.

— Ele faz uma cara de indiferença e diz: Pois faça o que você sempre fez, vá pegar na cozinha.

— Não posso! Está muito perigoso, colocaram um monte de ratoeiras.

— Esse é um problema todinho seu, se vira, se pegar da minha ração vai levar uma chifrada. Ai você sentira onde está o perigo.

— Mas e as ratoeiras?

— Problema é seu, já disse. E cai fora!

E Ana Clara faz uma feição de preocupação. E eu cotinuo a contar-lhe.

— Ela saiu triste com a indiferença do boi e mesmo assim não desistiu de encontrar ajuda e a única coisa que encontrou foi a cobra. O seu desespero era tão grande que subiu na árvore e arranjou um lugar para ficar protegida e foi logo pedindo-lhe.

— Eu preciso levar comida pra meus filhotes por favor me ajude.

— Ela fez uma cara de curiosidade e com uma voz cheia de más intenções perguntou-lhe.

— Quantos são e a onde estão que eu vou ter o máximo prazer em resolver o seu problema. Eu adoro filhotes, coitados, famintos, indefesos vou agora mesmo fazer uma visita, filhotes tenrros e macios e quem sabe não posso sabore-alos, ora me desculpe, melhor dizendo ajuda-los. Que tal você me dizer aonde estão?

Na hora a ratinha viu a bobagem que seu desespero a fez fazer e saiu em disparada. E a cobra ainda tentou pega-la, mas ela foi mais rápida e fugiu.

E Ana clara cruza os bracinhos:

— Mas e os filhotes dela ninguém ajudou?

— Calma ai a estoria deu uma reviravolta.

— Como? Eles a ajudaram.

— Nada disso. A ratinha ficou morrendo de medo de acontecer alguma coisa com seus filhotes e foi correndo falar de novo com o boi e ele…

— O que você quer? Eu não já falei para você se virar.

— Agora tem cobra!

— Isso é demais. Vá cuidar de seus filhotes e me deixe em paz! Onde já se viu, um rato se meter com cobra. Vai acabar virando comida isso sim. Ai eu quero ver o que vai ser dos seus filhotes. Vão virar sobremesa! Ela voltou pra sua toca triste e preocupada, pois temia que fosse seguida pela cobra. Assim que chegou seus filhotes estavam dormindo. Ficou olhando para as estrelas enquanto pensava numa solução, até que ouviu um grito vindo da casa da fazenda. Era a voz de dona Astúria que gritava e chorava. Aproveitou que seus filhotes estavam dormindo e foi ficar o mais perto possivel da casa para saber o que tinha acontecido.

E Ana Clara, se esforçando para se manter atenta driblando o sono, se esforça em manter os olhos abertos me pergunta.

— Era um pesadelo? Com a bruxa?

— Muito pior do que isso. A cobra saiu a procura da ratinha na cozinha e foi pega em cheio por uma das ratoeiras, que a feriram mortalmente e ainda por cima a prenderam.

— Ela morreu?

— Estava presa e quase morta na ratoeira. Dona Astúria ouviu o barulho e foi ver o que estava acontecendo, acreditando que tinha pego a ratinha, mas ao entrar sem acender a luz, pisou bem em cima dela e a cobra ainda teve força para picala. E foi por isso que ela chorava de dor. Na mesma hora vieram varias pessoas para socorre-la. A ratinha ficou com medo e foi embora. E quando chegou na toca viu a caminhonete partir a toda velocidade.

E Ana Clara com um ar preocupada, mas já querendo dormir.

— Ela foi para o hospital tomar injeção?

— Foi sim, tomou a vacina e foi pra casa e todo mundo ficou muito feliz com sua recuperação, pois ficaram com medo dela morrer com o veneno. E mataram o boi para fazer um churrasco que durou a noite inteira. Dona Astúria nunca mais quiz saber de ratoeiras e toda noite deixava bem fechada a cozinha para ninguem entrar.

— E a ratinha?

— Ela voltou pra sua toca e ao invéz de procurar comida na cozinha foi pra floresta onde tinha coisas muito mais gostosas. E sem tanto perigo.

E Ana Clara com os olhinhos entre-abertos.

— Tem um menino lá na escola que tambem não ajuda nimguém.

Virou-se deu um ultimo bocejo, fechou os olhos e dormiu. Dei um beijo de boa noite em sua fronte, dizendo-lhe que a amava fiz uma breve oração, apaguei a luz e deixei a porta entre-aberta e dizendo dorme com Deus.

DiMiTRi - Peruibe 23/04/08 13:21