Perereca sapeca e sua vitória-régia
É difícil ser uma perereca sem uma vitória-régia pra descansar minha agitação, pra sossegar um pouco nesse brejo, já cansada de tanto gritar e espernear , muitas vezes, escondida entre os galhos e folhas em que me enrosco a sapecar e saltitar minhas perguntas pelos ares úmidos daqui. Depois que encontrei minha vitória-régia a vida tornou-se menos sombria, brinco, converso, escuto estórias, invento outras. Ela não sente nojo ou repulsa, isso nos tornou mais próximos, pois eu não tenho medo de me esparramar em cima da minha vitória-régia para o espelho dessas águas profundas e antigas, passamos noites inteiras mirando a luz acesa no céu com suas estórias mirabolantes, e uma dessas foi a minha, quando foi atirada fora para dentro de uma mata esquisita, mas logo achei o colo aconchegante dela na beirada do rio, eu em estado muito inferior ainda sapecada pela ventania e muito enrodilhada vivia a resmungar, então ela me disse que é assim mesmo essa esquisitice de perereca, e que ainda vou passar por várias estações, que estamos só no inverno e que ainda vem a chuva das flores, disse ainda que serei uma metamorfose no curso dessas águas...muitas histórias vão rolar...com a presença de minha querida vitória-régia e dela eu não largo, sou pegajosa, viscosa, grudenta, ela vai me levar para outras bandas do rio e de lá poder saborear o gosto de novas iguarias, o cheiro do mato curioso e o que pode ter dentro dele, flores que dançam, outros bichinhos que cantam e tocam harpas de fios d’água coloridos quando o maestro sol vem convidar-nos para a grande ópera matutina, com olhos dourados e cristais celestes. Um bichinho estranho que é toda perereca, no tempo certo e de maneira adequada e apesar de toda ansiedade partilho com minha vitória-régia aqui no brejo uma vida de prazer instintivo, divertimento, liberdade, muito agradável, belo, necessário e sempre encantador!!!