Passarinho na gaiola
Passarinho na gaiola
Volta-se para a janela de madeira _ larga, sorridente _ os olhos carregados de tristeza. Ainda tem resquícios de datas risonhas. Nem todas as horas de sua vida foram como as de agora. Espaça o olhar. Há, ali, bem à sua frente, uma faveira tão antiga quanto o tempo (...).Os galhos abarcam a céu azul; as pequenas folhas encolmeiam-se neles: envereda a apreciar o tom verde. E sonha, sonha com os pássaros nos ninhos; levando os olhos na largura da árvore. O tronco serviria de casinha se pudesse sair dali e caminhar nele.
Não entende o que lhe dizem. As palavras vêm de longe, muito longe. Talvez uma ventania de lembranças o tenha deixado assim: A alma de pé, assanhada, em revolta. Sente-se solitário. Suspira. Imagens do vento ao largo do peito o assaltam. Quer fugir. Ergue o corpo _ cansado! Num gesto errante, abre os braços. O corpo pesa.
Uns grandes dedos mexem em sua água. Há um desejo de guerra. Apenas deita os olhos! Perde a vontade de ouvir e baixa o corpo. Murmura: “Ó Deus!”... Costuma ver aquele homem risonho, de assobio feliz, nas mãos seu alimento. Exatamente naquela hora em que o sol brinca nos galhos da árvore antiga, deixando mistérios no ar. Respira o suave perfume da tarde. Guarda ainda no armário da memória a cor das flores que nem cheiram, mas as pétalas nunca tinham lhe parecido tão aromáticas como agora – já não pode admirá-las!
Parece impossível que lhe peça para cantar. Ele cantaria preso numa gaiola depois de haver voado pelo céu azul- livre? O homem lhe sorri... Os olhos brilham... Sugerem! _ tornam-se meninos, fazem-lhe festa _ Ele gesticula palavras amigas.
A gaiola balança-se no ar presa ao fio que a suspende. Dentro, o curió empina o peito, afina o bico para o céu alaranjado na tarde. E canta; grande, em assobios, em versos; espantando a tristeza da alma.
Nos olhos, porém, o brilho é de vontade de voar...