COELHINO, EM VIAGEM AO SOL.
Welington Almeida Pinto
HAVIA, NO TEMPO em que os bichos falavam, um coelho extraordinariamente inteligente que vivia feliz na região da Serra da Canastra, bem próxima à nascente do rio São Francisco. Como era um coelho que compunha versos ficou conhecido na região por Coelhino Trovador.
Em dias em que o sol dava sinais que ia brilhar no céu, despertava bem cedinho com um poema na ponta da língua:
"Vem, Sol amado,
a Terra iluminar e aquecer.
seus raios quentes e cromados
Fazem a vida bem melhor para viver."
Certo dia, Coelhino acorda louco para ver o Sol bem de perto. Escolhe o lugar mais alto da Serra da Canastra e parte animado para lá. Depois de saltitar horas e horas sem parar, pelos campos floridos do chapadão, de tão cansado e a visão baralhando tudo à sua frente, tropeça numa raiz exposta de um pé de Araticum, bate com a cabeça numa pedra e cai desacordado. Pobre coelho!... Começa a delirar... sonhando que ia mesmo ao encontro do astro dourado. Mas, em vez de saltar, voava que nem foguete, de tão veloz. Ao se aproximar, cumprimenta o astro-rei todo sorridente:
- Olá, amigo Sol!
- Olá, amigo Coelhino.
- Que bom vê-lo tão de perto!
- Também estou contente com sua visita.
- Gosto muito do morninho que nos manda quase todo dia!
- É minha função. Levo energia e calor para as criaturas da Terra.
- Só não gosto quando fica muito tempo sem aparecer, principalmente porque chove muito.
- Não gosta das chuvas? Não gosta de água?
- Bem!... Tenho medo de morrer afogado. Por isso é que torço para ter mais sol e menos chuva.
- Impossível. A chuva é tão importante para vida na Terra como meus raios.
- Ah, é?... Gosto de água, sim. Mas, acho que muita água atrapalha a vida dos bichos.
- Até acredito. Porém, água nunca é demais. Sem ela não há vida, a terra não pode florir. Pelo que vejo, pouco sabe sobre as águas das chuvas!
- Acertou. Sei quase nada.
- São as nuvens que produzem as chuvas – adianta o Sol.
- É mesmo. Gosto de olhar as nuvens para ver as figuras que formam.
- Elas são muito mais do que isso. São flocos flutuantes de gelo que servem para regar e controlar a energia que entra e sai da Terra.
- Nem imaginava tanta importância.
- Sabe como elas são formadas?
- Bem...
- Eu explico: através da transpiração dos vegetais e da evaporação dos rios, mares e lagos. A umidade passa do estado gasoso para líquido, congela, e forma nuvens.
- E chuvas? – quis saber o coelho.
- Chuvas!... Ah, é simples. Com a força da gravidade os cristais de gelo se precipitam para Terra. Na queda, se derretem transformando em milhões e milhões de gotas de água para formar essa cortina líquida que se vê da Terra.
Coelhino sorria com cara de quem estava entendendo tudo.
- Santo Deus!... Então aqui em cima flutua um oceano de gelo?
- Isso mesmo!
- Não tem perigo de despencar tudo de uma vez só?
- Jamais. Controlo tudo numa boa.
- Quando chove quadradinhos de gelo não é um sinal que pode cair um blocão inteiro?
- Não. Você está falando da chuva de granizo. Acontece quando gotinhas de água se congelam novamente ao atravessar uma camada de ar frio.
- Vez ou outra cai uma chuva assim no chapadão. Não tem diversão mais gostosa do que ficar lambendo o gelo que vem do céu.
- Das nuvens.
- Ah, é. E aquela chuvinha teimosa que cai dias sem parar, tem nome?
- Tem. Chuva Criadeira. Para molhar bem o solo e as plantas crescerem viçosas.
- Tem mais?
- Sim. Anote aí: Ciclonal, Convecção, Relevo e Artificial. Essa o bicho-homem provoca por meios científicos.
- Nossa! Que chuvarada! – espanta Coelhino.
- Bom, não é? Mas, para o sucesso do ciclo da água a ajuda dos terráqueos é muito importante, principalmente do ser humano.
- Como assim?
- Ele precisa parar de agredir a Natureza, isto é: não destruir florestas. Não remover montanhas. Não desviar rios. Não poluir águas potáveis. Não contaminar o ar.
- Cruz-credo!... Uma coisa eu garanto, bicho não faz nada contra a Natureza.
O Sol franze o carão:
- Huuummm!... Eu sei. O bicho-homem é que mexe e vira esta destruindo a Natureza. Sabe de uma coisa? Todo dia, ele despeja na minha cara toneladas e toneladas de gases nocivos à camada de ozônio que protege o planeta.
- Repito, os bichos não têm culpa.
- Sei disso. Pura estupidez do bicho-homem!... - adverte o astro-rei, recolhendo um pouco os raios.
E continua:
- O homem moderno usa cada dia mais objetos descartáveis. O Pior é que são feitos de plásticos. Depois, joga tudo no lixo que, na maioria das vezes, vai direto para o leito dos rios.
- É por isso que meus parentes que moram nas grandes cidades, vivem dizendo que os rios estão sempre mais rasos, sujos e malcheirosos.
- Iche!.... exclama o Sol.
- Mas, tenho uma boa notícia. Cada dia cresce o número de pessoas imitando a ação dos bichos, isto é, preocupadas em proteger a Natureza. Não vê que as águas do São Francisco, no trecho da nascente, é tão limpinha que dá para ver os lambaris nadando no fundo do rio.
O Sol, mais calmo, expande os raios:
- Melhor assim. Mas, na Terra ainda destroem mais do que preservam.
- Uma pena!
- Apesar de tudo, tenho especial carinho pela Terra. Enquanto puder, trabalharei para manter vida na Terra, garantindo outro energia muito importante.
- E qual é essa energia?
- A fotossíntese.
- Foto o quê? – surpreende-se Coelhino.
- Fotossíntese. O processo de converter energia luminosa em energia química para alimentar as plantas.
- Que legal!... Então as plantas se alimentam de sol?
- Também.
- E como se dá a fotossíntese?
- Pela reação de três elementos: clorofila, água e gás carbônico.
- Aprendi mais uma...
- Enquanto depender de meus raios terá bastante chuva para você comer folhinhas tenras de capim bem nutrido.
Coelhino levanta as orelhas e suspira:
- Assim fico mais sossegado.
E conclui:
- Então, você é o dono da vida! ...
- Sou dono da luz, do calor e da energia para garantir a vida na Terra, o único planeta dos que orbitam em torno de mim, que tem esse privilégio.
- Ufa!... Que aula!
- Daí por diante, as coisas vão se transformando de acordo com as Leis da Natureza e a inteligência dos homens - completa o Sol, cheio de si.
- Acho que o bicho-homem tem muito que aprender com os bichos, não acha?
- Tenho certeza! Não fique chateado com minha ausência nos dias em que o céu parece estar forrado de camadas de algodão sujo. Nesses dias, estarei jogando os raios em outra região da Terra, para que o ciclo não se interrompa.
- Sabe de uma coisa, preferia sol e chuva ao mesmo tempo.
- Espertinho!... Faço isso no casamento da viúva, como forma de simbolizar o renascimento da fertilidade. Mas, em homenagem ao meu amigo, vez ou outra, vou enviar para a Terra chuva e sol ao mesmo tempo.
- Nossa!... Isso me deixa mais alegre.
- Você é um coelho sabido. Quero agradecer os poemas que recita para mim.
- Uai!... Dá para escutar?
Quando o Sol ia responder, Coelhino recobre os sentidos. O pelo eriçado, ainda sonolento, pensa que nunca sonhou nada parecido. Meio zonzo, meio espantado, fica de pé sobre as patinhas traseiras, protege os olhos com a pata dianteira e, com a outra, dá um longo adeus ao amigo Sol, pronto para se pôr. E recita outro versinho:
"Adeus Sol querido,
volte amanhã a terra aquecer
E embeleze mais ainda a Canastra
Onde o verde, que é bom, sempre vai ter."
O astro-rei até parece que ouviu. No mesmo instante abriu um sorriso brilhante, espalhando raios para todo canto. Coelhino arredonda mais ainda os olhos, exaltado:
- Trem de doido!
Esquece a dor no cocuruto e parte saltitante de volta para casa.
Conquistando a Linguagem
Compreensão do texto
Numa folha anexa:
1) Desenhe o sol:
2) Reescreva o trecho em que Coelhino caiu, perdeu os sentidos e começou a sonhar, de acordo com sua imaginação.
3) Qual a importância do sol para a vegetação?
4) E para as espécies animais, o sol também é importante?
5) Vamos fazer duas pesquisas. Uma sobre sol e outra sobre família dos Oryctolagus Cuniculus (coelhos).
6) Você conhece outro poema ou letra de música que fale sobre sol? Qual?
Para a Professora:
Reflexão: A Terra insultada, vinga-se dando flores. (Tagore)
* Motivação: Converse com os alunos sobre Poesia. Fale da forma sensível com que é descrito o sentimento. Faça a classe recitar, em coro, os versos do texto.
* Educação Ambiental: Explique a importância do Sistema Solar. Fale mais sobre as chuvas, sobre a importância da reciclagem de papel, plástico, mineral e vidro. Ensine maneiras de respeitar e contribuir com o meio ambiente. Pesquise com os alunos quanto tempo, o plástico e outros tipos de materiais ,levam para se decompor quando jogados no lixo.
Para saber mais:
Informações Técnicas:
Chuva Ciclonal - características das áreas de baixa pressão em virtude da constante ascensão das massas de ar.
Chuva de Convecção - oriunda do movimento ascendente diurno das massas de ar, freqüente na região equatorial e nas montanhas.
Chuva de Relevo - típica das encostas das montanhas ou escarpas de planaltos, por causa da mais baixa temperatura reinante nos trechos de maiores altitudes.
Chuva Criadeira - aquela constante que todo fazendeiro adora, pois molha bem a terra para as plantações.
Chuva Artificial - resultante da projeção, numa nuvem, de substâncias como iodeto de prata e o cloreto de cálcio, capazes de promover a multiplicação de cristais de gelo ou a solidificação de gotas de água evaporadas.
* FBN© 2004 * COELHINO, EM VIAGEM AO SOL/Categoria: Conto Infantil – © Welington Almeida Pinto - Texto revisado para substituir o da publicação como o mesmo nome – Edições Brasileiras
** PCNs: história de acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ministério da Educação, certificada pela Diretoria de Desenvolvimento da Educação Infantil e Fundamental da Secretaria de Estado da Educação de Minas Gerais, conforme ofício nº 39/02, de 22 de janeiro de 2002 *.
GÊNERO: aventura científica.
TEMAS TRANSVERSAIS: ética: relacionamento de animais e a natureza * Geografia e Ciências: espécies animais e vegetais do Brasil – região da serra da Canastra – fenômenos da natureza, reciclagem de materiais.
i.PÁGINAS:
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