Vida de anjo II
Vida de anjo- II
Outro dia veio uma anja desengonçada me procurar na minha nuvem. Ela disse que eu tinha que ajudar no coral. Ih, nunca cantei nada. Mas não podia dizer não e lá fui eu pro coral sem saber nada de música. Eles logo logo iriam me despedir da trupe, mas não podia dizer não.
A nuvem do coral tava meio escura e eu fiquei com medo. A anja disse que o tempo não andava bom no céu, que estava muito lotado. Devia então me devolver pra terra assim eu voltava pro Lico, meu labrador. Tá bom que a Dona Margarida cuida dele, mas não brinca e nem corre com ele. Ele precisava de uma criança.
A anja me colocou numa pontinha da nuvem e pediu que eu somente prestasse atenção na primeira apresentação. Não consegui. Fiquei de lá olhando o Lico deitado sonolento no tapete da sala enquanto dona Margarida fazia tricô. Ele estava vivendo vida de gato coitado. De vez em quando eu fingia que prestava atenção no coral e na orquestra, mas não prestava nadica de nada. Só pensava no meu cachorro, cheguei até a pedir a Deus que me ajudasse. Só pensei no pedido, mas não falei. Quando o trombone entrou fez um barulhão e eu me desequilibrei, bambeei bambeei e caí da nuvem. Ninguém percebeu. Caí devagarinho lá de cima. Minha asa não me ajudava a subir só me ajudava a não cair depressa. Pensei que alguém ia me pegar e me levar de volta, mas não. Quando vi já estava com os pés no chão, bem no portão da dona Margarida. Ebaaaaa ia ver o Lico de novo. E não é que ele veio correndo latindo, mas olhava pro nada. Ué, ele não me via! Poxa como brincar com um cachorro que não vê você? Bati minhas asas e ele ficou cheirando o ar acho que farejou algo. Bati de novo e ele fez um ruído como se estivesse chorando. Era assim que ele fazia quando eu não entendia o que ele queria. Liiiico! Dona Margarida gritou lá de dentro. Ela nem levantou. Também a coitada estava bem velhinha e não dava pra ficar correndo atrás do cachorro. O cão ficou ali desconfiado de alguma coisa, nem se mexeu do lugar encostava o focinho no chão e cheirava cheirava, levantava a cabeça e cheirava o ar. Aí aconteceu! Nooooosa ele me ofereceu a patinha. Eu me abaixei e peguei a patinha dele como a gente fazia sempre. Ele ficou com a patinha suspensa o maior tempão, sabia que eu estava ali. Era meu cachorro sempre ia ser. Quase chorei de alegria. Liiiico! Dona Margarida chamou de novo. E ele foi até ela olhou olhou e sentou no tapete de novo.
Voltei com a anja do coral que veio me buscar, mas voltei mais contente. Ela parecia séria e disse que eu caí por não prestar atenção no coral. Acho que me dava bronca. Ela não sabe da minha conversa com Deus, que foi Ele que deixou eu ir ver meu cachorro. Vou aprender a cantar pra deixar a anja mais alegrinha.