A GAIOLA DOURADA

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José Carlos era um menino como tantos outros de sua idade. Aos onze anos: tinha um péssimo costume: apanhava passarinhos para os prender em gaiolas. Em sua casa, não havia mais lugar para tantas gaiolas e alçapões.

Ao se levantar pela manhã, Zé dos Pássaros, como era chamado, espalhava gaiolas pela casa toda, ou seja, pelas varandas, nas laterais da casa e nos muros do jardim.

O dinheiro da mesada era gasto com a aquisição de novos pássaros, aumentando-os em quantidade e melhorando a qualidade do tratamento.

Dona Alice, a mãe do pequeno, procurava argumentar sobre a tristeza de se ter em casa aves presas, mas, em vão...

Dentre todos, José Carlos destacava alguns trinca-ferros, quatro canários do reino, um cabecinha de fogo e três sabiás.

Como as aves lhe agradeciam? Cantavam..., tão logo a manhã raiava e, de longe, podia-se ouvir a cantoria.

Um belo dia, Zé dos Pássaros saiu cedo à caça de outras espécies. Uma chuva muito forte e repentina surpreendeu a ele e a seu melhor amigo no pasto. Viram-se eles obrigados a se esconderem debaixo de uma frondosa árvore, até que a chuva amainasse.

Já era tarde, quando os meninos chegaram a casa. A mãe estava preocupadíssima com a demora, pois desconhecia o seu paradeiro.

Chamou-lhe duramente a atenção, advertindo-o sobre o risco em ter-se escondido debaixo de uma árvore no momento da tempestade e falou dos riscos que os mesmos tinham corrido.

Sr. Paulo, o pai de José Carlos, não teve a mesma paciência:

- Pela desobediência de sair sem avisar e sem dizer aonde vai, você não sairá de casa, por dois dias, ou seja, esse final de semana, quero você preso, sem direito a chegar nem ao menos na janela, estamos entendidos?

- Mas papai..., o menino tentava argumentar, eu não tive culpa, deixei um alçapão de espera, fui lá só pra buscar e a chuva me pegou, não deu tempo de avisar...

- Não tem mais, nem meio mais, você está de castigo e acabou!

Não foram dias fáceis, ele era um menino livre como um pássaro solto, nunca ficara preso em toda sua vida.

Para José Carlos o tempo parecia arrastar. Os ponteiros do relógio nem andavam e a noite nunca chegava

Nada lhe faltou: boa comida, frutas, sucos de todo sabor, guloseimas as mais variadas, mas o menino parecia nada apreciar. Até os filmes de viagens espaciais, que o menino tanto curtia, pareciam ter qualquer graça. Achava tudo muito chato.

Com efeito, José Carlos se sentiu o próprio pássaro cativo. Havia perdido um dos mais preciosos dons, a liberdade. Ouvia as vozes de seus companheiros gritando pelas ruas, rindo alto, podia até adivinhar qual era a brincadeira naquele momento. Nem o trinado dos passarinhos o podiam alegrar.

Dona Alice entrou no quarto, onde o menino parecia vegetar. Pela primeira vez, depois de muito tempo, mãe e filho puderam dialogar. O fato é que, naquela casa, todos se diziam ocupados e sempre cheios de problemas. Nos fins de semana, quando os pais estavam em casa, as brincadeiras intermináveis de Zé Carlos impediam a aproximação.

Foi nessa oportunidade que o menino falou da melancolia que sentia, em não poder sair à rua, brincar e conversar com os colegas, que esses dois dias estavam sendo os piores dias de sua vida. E que se sentia como um pássaro de luxo, dentro de uma gaiola de ouro.

A mãe, depois de prometer que, a partir daquela data, iria dar mais atenção do seu filho, argumentou:

- Realmente, querido filho, você se sente como um pássaro, confinado num grande viveiro. Pássaros cantam em gaiolas, não por estarem felizes, mas para não morrerem de tristeza. Você está sendo punido pela sua desobediência, ao passo que a ave paga por ser bela e por cantar bonito.

José Carlos pensou muito durante todo o domingo e, após voltar à liberdade, resolveu nunca mais prender passarinhos.

Dona Alice orientou o filho a transferir todos aqueles pássaros para o Viveiro Municipal, onde desfrutariam de maior espaço, pois, soltá-los seria o mesmo que condená-los à morte.

E assim foi feito.

Hoje, ninguém mais conhece o Zé dos Pássaros, mas o José Carlos, um menino estudioso e cumpridor de seus deveres, amigo de seus pais e apreciador do mavioso canto dos pássaros que, pelas manhãs, visitam as árvores de seu jardim.

Um dia ,descobriu um ninho de andorinha no galho perto de sua e viu pássaros felizes alimentando seus filhotes, seres que iniciaram sua vida em liberdade, longe das gaiolas douradas.