Aruanã

“Aruanã”

No exato momento em que saí do tronco, ele saltou. Um pulão monumental fora d’água. Era o aruanã, peixe comprido, elegante e prateado. Dizem que é pré-histórico. Não sei, só sei que existem muitos na bacia do Araguaia e do Tocantins.

Só de olhar era um metro de comprimento. E ao mastigar, uma língua dura de osso. Aquelas barbichinhas debaixo da boca oblíqua que lhe dá uma cara séria, são únicas. Nenhum peixe de escama tem. Ele pegou um besouro enorme, talvez um serra-pau. Geralmente ele come insetos, gosta de aranhas. Mas já vi papando frutinhas e até morcegos pequenos. É onívoro. Igual a mim.

Seu nado sinuoso e na superfície é muito bonito. O macho e a fêmea são parecidos. De manhã até as nove são bem ativos. Depois do almoço, lá para as três, ficam espertos novamente e se mexem até as seis da tarde. Hora do ângelus. Acho que de noite eles vão rezar, sabia que bicho faz oração, também?

Na verdade eles são a prova inconteste da existência de Deus. A Natureza em sua perfeição e equilíbrio é a manifestação mais forte Dele. A Natureza é sagrada e deveria ser intocável. Como o aruanã, dormindo entre as três e seis da manhã...

Nos lagos são fáceis de ver. Ocasionalmente formam cardumes de cinco a oito indivíduos. Na época da reprodução os machos procuram as fêmeas, que são em maior número e peso, até dois quilos e meio. Devido ao pouco oxigênio, respiram pela boca. Mas fazer isso para eles é tranqüilo, a presença da bexiga natatória; ajuda.

A desova é em dezembro, presente de Natal. O ovo é guardado na boca, assim como os filhotes, tanto o macho como a fêmea, mas o papai cuida bem mais. O ninho é construído com cuidado. Na época da reprodução os machos ficam mais avermelhados. Estou começando a achar que esta cor é a do acasalamento...

Interessante é que os ovários não são iguais, o direito é atrofiado, não tem oviduto. Explico, oviduto é o tubo que leva o ovinho até o canal de fora do peixe. E ovário é onde a fêmea produz e solta ovinhos... Será que o macho é canhoto e a reprodução só funciona pela esquerda? Engraçado, né?

Há muito tempo atrás, aqui era cheio de índio e eles flechavam ou arpoavam o aruanã. O nome que eles davam era sulamba, macaco d’água. O índio come o que pesca e só caça para comer. Os olhinhos do aruanã, apesar de bem treinados inclusive para ver no ambiente fora d’água, nunca percebem a aproximação do índio, ela é de lado, transversal. A do homem da cidade é reta, direta e brutal.

Hoje em dia o homem “civilizado” pesca o aruanã e depois joga de volta pro rio. Chamam isso de pesca esportiva. Já melhorou, antes matava e nem comia. Pois dizem que a carne dele é insossa. Mas será que é bom levar um anzol na boca, ficar sendo puxado e depois retirado por um bicho que nem sabe olhar direito?

JB Alencastro