Jaó

“Jaó”

Ave canta, ave encanta. Ave pia, ave espia. Ave faz ninho, ave tem carinho. A carinha da ave é de dar dó, pois peninha tenho, do grito do jaó. È uma musiquinha que fiz para uma das aves que mais quero bem, o jaó.

Pessoal aí da cidade nem sabe direito quem é. Explico. Aqui na mata seca, entre a folhagem de um barú e suas castanhas deliciosas, ou a maminha-de-porca com aquelas pontinhas no tronco e suas folhinhas com gostinho anestésico, move-se o jaó. Pássaro discreto, cabeça pequena e boca rasgada. Penas cinza-amarronzadas nas costas, rabo curto, quase não aparece.

Ela e sua parentada, que inclui inhambú-chitão e o xororó, são musicais. O pio de dia não é de uma nota só. - Jaó-jaó. Ou então; juó-juó. De noite, já deitada no chão ela fala:

- Eu sou, jaó!

Tomei a maior bronca achando que ela era prima das galinhas. Várias diferenças: o jaó cisca com os pés e não com o bico, não faz barulho ao se deslocar e nunca sobem no pau para empoleirar. O pai é quem toma conta dos filhotes, na hora de chocar. Esses saem depois de 17 dias de uns ovinhos brilhantes de porcelana, tem de rosa e tem de azul. Nem ficam muito no ninho. São como eu, nidífugos.

A musicalidade é maior de manhãzinha e no meio da tarde. Exceção para noites de lua cheia. O jaó é romântico como só. Canta de noite e atrai a onça e o caçador, e fica paralisado com sua dor. Eu de cima do embiruçu, com minha cauda felpuda coberta de paina, notei a tentativa de vôo rasteiro do jaó em fuga. Mas com uma quilha peitoral mal desenvolvida o vôo é descontínuo. Parou loguinho, mas escapou.

Deu inclusive para reparar o ninho bem escondido, um buraquinho feito no solo. Era fêmea, pois era maior. Acho que ninguém a vê direito por duas razões. O silêncio no deslocar e as penas bem semelhantes às folhas, um mimetismo perfeito.

Quanto ao canto, dá para diferenciar, o xitão faz um trinado alto e comprido. Trrrrriiii-trrii, começa rapidinho e depois vai ficando mais grave (grosso) no fim. O chororó é fácil, igualzinho a um choro tremido, cada vez mais alto. E o inhambú-relógio é simples também, só canta na hora marcada.

Muito menino tem colega tímido e quieto. Várias meninas são assim também. Mas deixa sozinho na mata, de noite, à vontade; para ver se não cantam bonito igual ao jaó!

JB Alencastro