Veado
“Veado”
Eu gosto de perambular por aí. E o cerrado não é só campo. Tem floresta também. Na beira dos rios grandes e médios, são as matas ciliares. Diferente das de galeria, onde as copas das árvores se tocam no alto. E a vereda é próxima as nascentes, cheiinha de buritis. Por que isso tudo? Porque veado é bicho de bom gosto. Escolhe sempre lugar bom para morar. E eles se espalham de acordo com o local e a espécie.
O catingueiro gosta do campo sujo. Fica lá, todo orelhudo. Mas não fede. Catingueiro é porque mora no nordeste, na caatinga. Sua galhada é para trás. Só um espeto. Muito namorador, pode reproduzir durante o ano todo. Dizem que é porque tem muita comida. Aí ele fica assim, soltinho, saltitante. Seu filhote é cheio de manchas brancas. Quase todo veado tem filhote manchado, exceto o grandalhão do galheiro.
O galheiro é o maior e gosta d’água. Imagina que outro dia vi um apostando corrida com a capivara? Mas também, debaixo dos seus cascos ele tem uma membrana para nadar e se equilibrar no pântano. Talvez por isso no Pantanal o chamam de cervo do pantanal. Bonita mesmo é a sua galhada enorme, contei cinco pontas em cada lado. Dizem que quanto mais velho o animal, maior e mais bonita fica. Todo ano regenera. Acredito que a dele é mais conservada porque ele não briga no acasalamento, é um veado de paz.
Paz mesmo é o mateiro. Come de manhazinha e de tardezinha, animal isolado, não perturba ninguém. Acho engraçado é que em junho os chifres caem ( ai, ai, ai, se meu parceirinho lê isso, me mata... é galhada e não chifre... ) e você não sabe quem é macho ou quem é fêmea. Mas logo em agosto, mais tardar em setembro, nasce de novo. Quase achei que um deles ia morrer. Quando deu de cara com um caçador ficou imobilizado, mas rapidamente de um pulo de lado e embrenhou na mata fechada. Ainda bem.
Eu nunca vou entender essa matança, primeiro que a carne do galheiro é ruim. Segundo que o catingueiro quase não tem carne. Só o campeiro que é maiorzinho e dizem, saboroso. Mas matar um veadinho, com aquele rabo branco levantado, que maldade! O bando inteiro, uns quinze, saem correndo só de ver o homem. Antes, achava campeiro fácil. Principalmente debaixo do pequizeiro. Flor de pequi é iguaria pro campeiro. Agora em agosto então... Ultimamente está raleando. Como você sabe que é campeiro? A galhada tem três pontas... E a marca da pata é bem fininha na ponta, e quase sempre junta a dianteira com a traseira. Casco estreito.
Pata de veado é casco, por isso são chamados de ungulados. Nome difícil, né? Mas é o certo, vem do latim úngula; que é unha... Então é ungulado aquele que apóia o último dedo protegido pela unha, sacou?
Está chegando a época das queimadas – que eu detesto- e logo depois brotam os capins, aí fica lotado de campeiros. Será que não vai chegar um momento em que o homem vai perceber que quanto mais queima, menos comida tem? Ou será que a beleza de um bicho debaixo de um ipê florido de amarelo ou rosa não é suficiente para mostrar a renovação do cerrado? Precisa acabar com as coisas para depois lembrar como era lindo?
JB Alencastro