Bicho-preguiça
“Bicho-preguiça”
Saindo do rio, quase na borda, depois de afastar umas cebolas d’água, eu tomo um susto danado. Um bicho peludo, nadando com a cabeça fora d’água, tipo estilo pólo-aquático. Seus braços são longos, tem três dedos, aliás; unhas imensas e uma franjinha na testa. É uma preguiça. E como nada bem! Pensei que fossem lentas sempre. A exceção é o meio aquático.
Paro no meio do caminho e observo-a. No chão não consegue se levantar, gastou uns 10 minutos para percorrer os 5 metros até a árvore dela. Dizem que é um desdentado, mentira. Tem dentes, mas sem esmalte ou raiz e não existe dente-de-leite. O sonho de toda criança. Nem precisa escovar de noite. A folha de embaúba dá conta do serviço. Lentamente ela sobe. A embaúba tem planta macho e planta fêmea. Essa é fêmea. A preguiça Aí, nome verdadeiro dela, demorou só um minutinho para chegar na copa, que fica a uns 5 metros do chão.
Como sou afobada, derrubei um pau seco e fiz barulho. Não é que a preguiça me viu? Girando quase 360 graus o pescoço, fitou-me demoradamente. Percebi uma longa mancha nas suas costas, é um macho. Acho que o número de vértebras no pescoço é maior. Sei que os humanos, as baleias e as girafas só têm sete. Ela tem nove, por isso esse movimento de uns 270 graus. Loucura!
Do jeito que me olhou, ficou. O montão de formigas saindo do oco do tronco da embaúba não a perturbam. Dizem que naquele pelo cabeludão dela tem carrapato, vários fungos e algas e até uma traças, daquelas de livro de biblioteca velha. Que nojento!
Mas ela é legal. Suas primas do norte, maiores e com somente 2 dedos, são chamadas de preguiça-real. São canhotas como ele, o LDOV; só nadam de lado e o nome é muito lindo: unau. Nunca as vi, pois só moram no norte do país. Mas já bati um papo com as de coleira ou aí-pivuna, ali na Mata Atlântica, entre o sul da Bahia até o norte do Rio de Janeiro, passando pelo Espírito-Santo.
Eu nunca soube o porquê delas serem tão lentas. Hoje aprendi que é por causa do calor. Preguiça tem preguiça. Elas só vivem em lugares em que a temperatura seja constante. A glândula tireóide delas funciona pouco. Tudo funciona mais lentamente. Até a respiração. Conseguem ficar um tempão em apnéia, debaixo d’água.
Eu fico pensando, então por que a onça não pega ela? Ou o gavião-real, a harpia? É porque não a vê. Enrolada em si mesma umas 18 horas por dia, ela se confunde com os cipós secos. Esse negócio de imitar o ambiente chama-se mimetismo.
Será que você quando fica fingindo que está dormindo para não tomar banho, ou ir estudar não estaria cheio de preguiça? Igualzinho, pode cutucar com força que nada sente. Preguiça não fica doente, mas também não pega no batente.
JB Alencastro