Coisa Tola 2
– Chata!
– Cachorro!
– Você que é uma cadela. E chata, ainda por cima.
– Você me chamou de quê?
– De chata!
– Eu ouvi seu idiota! Me referi à...
– Cadela? Quer que eu repita?
– Repita se for homem!
– C - A - D - E - L - A!
– Ah! Como se atreve?
– Você que pediu...
– Isso não vai ficar assim. Ai, como eu te odeio!
– E o que você vai fazer?
– Eu?
– É, você.
– Eu?
– Sim, você!
– Vou espalhar pra todo mundo que você é broxa!
– Hahahahahahaha!
– Ta pensando que eu to brincando?
– Você não seria burra a esse ponto.
– Burra por quê?
– Esqueceu que eu sou seu marido?
– Meu marido? Meu marido abria a porta do carro para mim. Meu marido me levava o café na cama. Meu marido transava comigo!
– Quer calar essa boca?
(silêncio)
– Você está sendo injusta comigo.
(silêncio)
– Não faz nem uma semana que não dormimos juntos.
– Dez dias.
– Ah, que seja. Não sei se você se tocou, mas estou no meio de um processo dificílimo. Estou prestes a ser condenado, tem gente me perseguindo, me vigiando, e você fica aí falando de sexo...
– Ninguém mandou você sair por aí dizendo o segredo da Coca-cola...
– Engraçadinha... Estou morrendo de rir por dentro.
– Mas me diz, como você acha que eu me sinto casada com um doido, falsificador e ainda por cima broxa?
– Não sei, mal?
– Nossa, como você consegue ser tão cínico?
– E o que você quer, que eu comece a chorar?
– Não, mas não precisa ser tão insensível...
(silêncio)
– Sabe, não faz nem seis meses que casamos e você nem diz mais que me ama...
– Digo sim.
– É, mas quando diz é como se dissesse "pão com maionese"... Sabe, virou rotina, não rola mais aquele sentimento que tinha antes...
(10 segundos)
– Desculpa. Eu não devia ser assim...
– Não mesmo.
(10 segundos)
– É verdade... tenho sido muito ausente. E eu não sabia que você estava sofrendo com isso...
– Você nem presta mais atenção em mim...
– Oh, meu amorzinho...
– Agora você vai ficar dando uma de vítima, né? Já conheço esse papo de "Ah, eu estava errado, por favor, me perdoe amorzinho...", e já sei bem onde isso tudo vai terminar...
– Onde, na cama?
Bastou um breve cruzar de olhares para que ambos soubessem que sim, o final seria aquele mesmo, terminariam a noite em algum lugar, num quarto qualquer, e terminariam abraçados, mordendo-se, arranhando-se, jurando-se amor eterno como se tivessem mesmo a eternidade para amar. A moça sorriu, desviando o olhar para o cardápio, e ele pensou “não tem jeito, é a mulher da minha vida”.
O garçom, que já havia alguns minutos estava parado ao lado da mesa, pigarreou, dando a perceber sua presença. O rapaz pagou a conta, elogiou a comida e a música, a comida porque era cara, a música porque adorava Chopin, andou de mãos dadas com sua bela esposa até o carro, abriu a porta para ela, pisou no acelerador e correu até o seu apartamento recém comprado com dinheiro do contrabando.
Lá eles se amaram estupidamente, como nunca tinham se amado antes. O tempo passou rápido, mas a noite certamente duraria anos nos corações dos amantes. Na manhã seguinte, como uma deliciosa provocação, o café estava ali, na cama, esperando-a calmamente, e com um pequeno bilhete amarelo enfiado no queijo.
"Eu te pão com maionese."