Maria das Dores era empregada se minha mãe há quase cinco anos;veio da fazenda,muito boba e sem nenhum contato com a cidade grande,pois,qualquer cidade com mais de 1000 habitantes,prá ela era cidade grande.Era honesta,trabalhadora e afável,educada e gentil por natureza,mas,de uma burrice ebúrnea;como era pequenininha,atarracada,de perninhas curtas e andava como que aos pulinhos,agente lhe chamava de Maria Paquinha,apelido que trouxe do Interior.Assim que chegou a Salvador,saí com ela para ir ás compras e conhecer a cidade;o polo de compras mais perto era a Calçada e fomos pegar o ônibus;no ponto,havia uma meia dúzia de pessoas,na fila,e ,Maria saiu de um em um,apertando as mãos:-Como vai?Como vai,ocê?As pessoas riam e eu,adolescente,queria me enfiar no chão,de vergonha.Não percebemos,nem eu,nem as pessoas da fila,neste gesto amistosa,a solidariedade da gente simples da roça,para quem pessoas não são números.
Dia seguinte,minha mãe,que adorava fazer quindins,pediu a ela para ralar um côco,de costas,como deve ser para fazer um bom quindim;quase uma hora depois,minha mãe estranhou a demora e foi encontra-la,no quintal,vermelha,suada,com o ralo atrás das costas,tentando ralar o côco.Já há alguns meses com a gente,deu vontade de ir ao cinema sózinha,ser "A viúva Alegre",com Lana Turner e Fernando Lamas,que fazia o Príncipe Danilo;voltou fascinada e disse que nunca na vida tinha conhecido um homem tão bonito quanto o príncipe Demillus;mas,o passeio quase acaba mal,se o ônibus não parasse em frente á nossa casa;sentada ,a ler,na sala de visitas,eu percebi Maria,discutindo com o cobrador,ela vermelha,êle alterado,fui ver o que era.Maria tinha perdido o dinheiro da passagem,a bolsa aberta no chão do coletivo,suas coisas espalhadas e nada do dinheiro;virando pro motorista,perguntou?A sr. conhece "sêo" Odalberto?Era meu pai,figura mais que conhecida no lugar de onde ela vinha;ela tentava explicar que trabalhava na casa dele,que era gente honesta e que êle podia ir cobrar lá,que ningúem ia ficar devendo;paguei a passagem e a confusão acabou;expliquei a ela que numa cidade grande as pessoas não se conheciam,a não ser as muito próximas,umas das outras.Mas,o melhor de Maria,aconteceu,quando foi mandada á venda próxima comprar côco,duas garrafinhas de leite e uma bucha de bombril,com a recomendação de não esquecer nada.Ela atravessou a rua,com a mão na cabeça,repetindo,um côco,depois as mãos nos seios,duas garrafinhas de leite e uma mão na perseguida,uma bucha de bombril.