SORTE, MAS AONDE?
O dia amanhecera deveras lindo, e como de praxe, logo cedinho abri a janela e meditei:
-Ah esse sim, haverá de ser um ótimo dia!
Aqueles bons pensamentos que temos obrigação em tê-los, principalmente numa cidade tão difícil como São Paulo.
Embora pelas ruas o verde esteja cada vez mais raro, o caminho até o trabalho tem lá suas belezas, e quando chego bem cedinho, sempre tem alguém diferente esperando por mim, entre o que sobrou do desmatamento da região.
Aquele Bem –te -Vi costumeiro ou o mesmo Sabiá que continua a me cantar a saudade...
Mas naquela manhã , assim que desci do carro, uma revoada de andorinhas passou sobre mim.
-Acertei-pensei comigo - hoje será meu dia de sorte!
Mas, ao acender a luz da sala senti um cheirinho...
-Hum...alguém deixou um rastro por aqui...
Nem logo terminei de pensar, perguntaram-me:
-Vixi, mas o que foi isso?
-Isso o quê?-perguntei direcionado o olhar... para mim...
O rastro, era meu!-não foi difícil deduzir!
“Alguém” daquela revoada estava com desarranjo intestinal...e bravo!
-Nossa, nem tinha percebido, disse eu meio sem graça...
-Ah mas não se preocupe, isso é sorte, MUITA sorte!- consolaram-me.
Mas naquele momento, eu preferi um pouco menos de sorte! Um pouquinho só me bastaria!
Seria impossível para um nariz, ainda que mediano, não perceber aquele odor típico de dejeto ácido, mesmo que das belas andorinhas...
Não me intimidei, afinal, nada que uma água e sabão não resolvesse.
Tive uma professora na faculdade que sempre falava que aonde tem água e sabão...tem Deus.
Então, providenciei um detergente.
Mas naquele dia percebi que de sujeira de passarinho eu definitivamente, não entendo nada! E que a "sorte", ainda que ecológica, não cheira nada bem!
A cada friccionada no tecido, mais aquilo se espalhava de modo irremediavelmente...grudado. Que horror!
-E agora, como vou trabalhar assim,toda...carimbada?
O mundo tentou me ajudar..Era diagnóstico e tratamento para todo lado!
-Tenta isso, faz aquilo, ah não, tinha que ser com água morna, tentou acetona?, é melhor amoníaco, é melhor sapólio...tenta limão,”cuidado não esfrega muito, “isso” fura até lataria de carro,tem é que “quarar!”, quase me esticaram sob o sol...
E furou mesmo! O tecido não agüentou a tentativa de ressuscitação.
Estava danada... esfarrapada e fedida! Parecia ter saído dum bueiro!Achei melhor voltar para casa.
Retornei ao estacionamento, e meu carro estava em “porca miséria!”
Lembrei da minha avó, pois era com essa "expressão italiana" que ela se referia às tragédias do cotidiano.
-Chega, chega de sorte!, exclamei ao céu!
-Uffa...
São cinco horas da manhã, dum OUTRO dia...
Acabo de abrir a janela, e um bando de maritacas se aproxima.
Decido fechar os olhos de poeta, e também a janela...e bem depressa!
"Caio na real!".
Espero que desta vez a sorte deságüe em outra freguesia...bem longe de mim.
( "SORTE" VERÍDICA...)