UNHA ENCRAVADA

Já fazia alguns dias que estava com a unha encravada, mas até aquele dia, a dor tinha sido, digamos, suportável… é claro que como sempre (não iria ser diferente só por que era a unha dele), muitos pisaram sem querer… Será que seria sem querer mesmo? Bem, mas isso não importa. O que eu quero contar, é que naquela noite, Alfredo discutiu mais uma vez com a mulher. O motivo? Simples, ela queria o homem que conhecera antes do casamento e ele, além da Flávia que conhecera antes do casamento, queria todas.

Quase sempre discutiam, melhor, raramente não discutiam. Contudo, quando passaram da fase em que as agressões ultrapassaram a fronteira oral e passaram há uma linguagem gestual e com arremesso de qualquer material que estivesse por perto, o dedo com a bendita unha cravada, foi ferido na segunda tentativa de atingi-lo. Doeu tanto, que apesar de ter aprendido que homem que é Homem não chora, ele não agüentou: Chorou, chorou, e sentou… Flávia pediu perdão, trouxe compressa quente, fizeram novas juras de amor, e numa troca de olhares se excitaram, e fizeram amor com o dedo sangrando.

Então não houve alternativa, o casal teve que ir ao hospital. No caminho, a cada frase, Alfredo mencionava a dor e gemia, e para cada gemido, cada lamento, dava uma nova inflexão, um verdadeiro exercício para ator, se por ventura algum dia esse texto for encenado. Numa hora ele chorava como criança: “AI MEU DEDO!”, noutra ria, bradava. Às vezes pronunciava seu lamento num tom febril quase delirante. Enquanto a mulher se afligia, o taxista se irritava. Mas não houve briga, pois já tinham chegado ao hospital.

Lá o médico, olhou, olhou, olhou e olhou, fez exame de sangue, raio X, pediu a opinião de outros colegas, só para confirmar que realmente a unha estava encravada. Alfredo que já era um chato, piorou. Talvez tenha sido por isso que um dos médicos, por sinal, o que lançara olhares gulosos para a esposa do paciente, sugerira que o dedo fosse decepado. E assim, foi feito. Foi-se o dedo, foi-se a unha.

Hoje Alfredo é um outro homem, carinhoso, gentil e nunca mais discutiu com a esposa, e eles são felizes, que eu saiba, até agora. Após anos de pesquisas, os cientistas, sobretudo, os psicólogos, concluíram que ele mudara, porque tinha sua personalidade profundamente enraizada no dedo. Alfredo era o que era, por causa da bendita unha encravada.

Anderson Sant Anna Teinassis
Enviado por Anderson Sant Anna Teinassis em 05/03/2008
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