UM CHURRASQUINHO DEPRIMIDO
Não sei, ultimamente tenho tido duas grandes dificuldades ao escrever.
Primeiramente em classificar os meus textos.
Por exemplo, quero contar a vocês uma história verdadeira, achei o fato engraçado, mas na realidade, pensando bem, o fato é demasiadamente triste.
Mas parei para me perguntar se já me referi à tal história por aqui.
Esta é a segunda dificuldade.Escrevo tanto, que não me lembro de tudo que já escrevi.Deve ser do tempo, acredito.
Bom, de qualquer forma , contarei o "causo", porque esse merece ser contado e recontado várias vezes...
Ela trabalhava comigo, um amor de pessoa.Não merecia... "aquilo".
Embora não tivessemos grandes contatos no trabalho, certa vez não pude evitar de ouvir uma sua conversa ao telefone com um de seus filhos anjinhos...
-O quê? Só agora você me confessa esse absurdo, depois de tudo?
Tinha dois filhos meninos.
Dizia-me dois "menino -homem", um jeitinho carinhosamente aculturado de algumas cidades do interior daqui, para se referir ao sexo dos filhos.
Lindos meninos...mas...eram traquinas "por demais".
Quase todo dia ela pedia à chefia para sair mais cedo, ávida por resolver "alguma" daqueles santos meninos.Chegaram certa vez a quase colocar fogo em casa, ocasição em que racharam a borboleta da saída de gás, e ela ao chegar encontrou os bombeiros, sob os gritos da babá, quase asfixiada pelo odor insuportável da casa.
-Não tive culpa dona Zuleika, não controlo mais os meninos, a senhora pode me despedir!
-Calma senhora , não aconteceu nada, esclareceu o bombeiro...
E os meninos no canto da sala, assustados, mas a traquinar a próxima aventura...ou desventura...
Mas ela sabia os filhos que tinha.Mãe sempre sabe.Só não permite que alguém o diga...alguém que não seja ela própria.
E a mim se queixava sistematicamente
-Imagina, relaxa,coisa de criança, é tudo igual...dizia eu na tentativa de acalmá-la.
Agora, já maiorzinhos, ela acreditava que as coisa melhorariam.
Que nada!
Certo dia, percebeu o gato da família diferente.
O gato, que sempre fora animado, carinhoso, guloso por leite, de pelo visçoso e brilhante, e de olhar atento, de súbito estava amuado.
Parara de comer, assumira um olhar triste, emagrecido, cabisbaixo na soleira da janela, e de lá não mais saía nem para dormir.
Aliás, dormia o dia todo. Na pele, uma dermatite violácea, lhe derrubara todo o pelo, deixando clareiras evidentes por todo o corpo.
-Mãe, o BICHANO está estranho, mãe...
Então procuraram o veterinário.Todos os exames bioquímicos...e nada!
-Depressão Aguda Felina-esclareceu o médico.
-Mas aguda demais, doutor! É assim mesmo, será que foi do banho que os meninos lhe deram?-perguntou a Zuleika.
-Não dona Zuleika, os bichos também são sensíveis ao ambiente doméstico.Está tudo bem em casa?
Sim estava tudo bem...só tinha aqueles meninos bondosos...
Aquilo era muito estranho, pensou a babá que também andava cansada e meio "depre".
-Nem o gato aguentou esses meninos...concluiu ela!
E foi naquele dia, no trabalho, depois daquele "o quê" ao telefone que a questão se esclareceu.
Informou o menino mais velho, o de onze anos, que numa bobeada da Babá resolveram dar banho no gato.Muito justo! Todos temos que tomar banho, ainda que alguns não gostem...às vezes.
O problema foi depois, no acabamento. Tinham que secar o gato, não tinham?
Então... fizeram um experimento, que valeria o prêmio Nobel de Ciência Veterinária, talvez!
Secaram o Bichano, ótimo.
Mas aonde? No MICRO ONDAS...
-Mas mãe, foi só dez segundos, mãe , pra ele ficar "quentinho" ! -pude ouvir uma vozinha tranquilamente argumentar do outro lado da linha...
Provavelmente os dez segundos mais tormentosos da vida do pobre gato...finamente "eletrocultado" por ondas micro.
Então voltaram ao veterinário e explicaram o ocorrido.
O médico, perplexo, até por uma questão de principio, não perdeu o rebolado, e manteve o seu diagnóstico:
-Depressão Reativa por exposição a Micro Ondas...hum...algo a ser publicado, nunca vi nada igual...
E foi assim que Bichano fez uma sessão de fotografia. para que o seu caso fosse apresentado no congresso.
Aqueles meninos traquinas valeram um grande avanço na dermatologia e na psiquiatria veterinária. Nem tudo estava perdido.
E o Bichano virou capa de revista...médica.
Afinal, tudo pela ciência!