FABULÁRIO 3 A ARANHA E A COBRA

Das armadilhas traiçoeiras que se encontram na natureza, a da aranha do mato é sem dúvida a que contém maior sutileza., e com engenhosidade que não deixa falhas.

Consiste em tecer sobre profundo e acidentado buraco, finissima teia de alta vulnerabilidade para animais pesados, tapando todo o diâmetro do buraco, contando com a cooperação de folhas secas que por ela pairam o que em pouco tempo fica a impressão de não haver por alí buraco algum. Para ajudar tão sinistro plano, frequentes e pequenos redemoinhos ocorrem no Vale das formigas Cabeçudas, nas proximidades, fazendo assentar sobre tais folhas suavissima camada de poeira, afastando de vez a idéia de que ali algum dia existiu algum buraco, ficando reservado para os desavisados animais menores um tenebroso segredo de morte.

Feito o trabalho, a aranha se afasta para estratégico local seguro e aguarda os resultados.

- Vamos aguardar os "visitantes." - pensa sobre uma pedra na curva do areião, sendo logo,logo surpreendida por murmúrio de vozes vindo do Vale dos Alces.

- Epa alguém vem aí.

Em guarda, aguarda quem vem e entende o que se fala pois, escondida viu que eram dois camundongos roliços, certamente voltando da pilhagem de algum milharal ali perto.

- Eu não vou passar por alí pelas pedras que estão cheias de escorpiões escondidos. -dizia um

- Nem eu,vamos achar um caminho melhor., ainda mais de pança cheia - responde o outro.

(esses ai já cuidaram de encher a pança) pensa a aranha que numa grande sorte ouve o outro exclamar quase aos gritos de entusiasmo.

- Olhe alí que passagem interessante, vamos! O caminho aqui e mais curto,e além do mais, a estas horas tem uns urutus voltando do Rio Negro e um encontro desse será o fim da picada.

- Na verdade o começo. - conserta o outro camundongo também satisfeito por ter que passar na "estrada" preparada pela aranha que toda atenta pensava:

- Vejamos se estes aí irão selar o próprio destino

e pelo visto a sorte tende a me favorecer. - Lembra a aranha que nos últimos dias tivera pouca sorte.

Primeiro porque um "quero quero" havia caído no buraco, porém, sendo astuto, conseguiu se safar e acabou devorando quatro baratas e dois escorpiões preparados por ela, sendo que as baratas seriam uma oferta da aranha para os escorpiões, como política de boa vizinhança. Mas traiçoeiros estes últimos entenderam que aranha seria uma iguaria melhor do que baratas, tanto que eles comem a cabeça e jogam o resto fora ao contrário da aranha que os escorpiões devorariam inteira com espaço para um arroto de satisfação demonstrando digestão bem sucedida.

Ocorre que sendo astuta a aranha os conduziiu para a passagem e os dois espertos cairam em local que não lhes permitiu sair, e quem se deu bem na história foi mesmo o desastrado do "quero quero", que lanchou todo mundo e caiu fora.

Numa outra feita, caiu lá um não menos desastrado jabuti, dos pequenos, que na verdade ficou entalado, e foi salvo de tão incomoda posição por uma onça pintada que o devorou inteirinho, cuspindo fora a carcaça que ficou mesmo parecendo a metade de uma moranga,vazia é claro. O que na verdade liberou o buraco para a aranha que tornou a prepara-lo pacientemente.

- É, vamos esquecer todos esses contratempos passados. - Pensa a aranha de olho nos camundongos, ansiosa para que se decidissem pela "passagem", no que, como se estivesse em sintonia com dela decidem:

- É esse mesmo o caminho masi tranquilo,

- Eu também gostei dele. Responde o outro.

- Eu também. - pensa a aranha sinistra que os vê dirigindo-se para o solo firme da passagem, caindo dentro do buraco. sendo condenados à fatalidade instantânea e promovendo

a comemoração da aranha que teria refeição por longo tempo e precisaria contudo fazer arranjos para se prevenir contra outros predadores que são inúmeros naqueles lados.

A lentidão da aranha entretanto, é coisa que a natureza não tolera, favorecendo com isso, concorrentes mais oportunistas, deixando-a por isso como castigo sem o alimento engenhosamente conquistado com astúcia, sendo porém mais astuta a terrível cascavel da baixada verde, que assistiu a queda dos dois roedores e desceu para o fundo do buraco passando por secreto caminho naturalmente mais rápida do que a lenta aranha.

- Hoje é meu dia de sorte, dois camundongos gordinhos sem qualquer esforço, já que dali eles não vão à parte alguma a não ser direto para minha barriga vazia.

Assim, quando a aranha em sua lentidão chega ao fundo do buraco,a cascavel já devorava o segundo roedor, sem sequer se deter com a chegada da outra que ficou aborrecida e já passou no peçonheto uma reprimenda:

- que negócio é esse cascavel? eu quem armei tudo e me custou tempo para elaborar essa armadilha, vem você e enche a pança às minha custas? vou lhe dar uma lição, prepare-se para um combate fatal.

Embora a aranha estivesse realmente nervosa e cheia de veneno igual a cascavel, esta outra estava com a lombeira dos que comeram demais e tem na cabeça a procupação única de achar um lugar para sonolento repouso, pelo que, sem dizer uma palavra à aranha, o peçonheto desaparece por uma saída extra, deixando a tecedora de teias preparada para um combate que não aconteceria ppr falta de adversário.

BELO HORIZONTE, 21/02/08

Pacomolina
Enviado por Pacomolina em 21/02/2008
Reeditado em 25/04/2009
Código do texto: T869773
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