Lembrança de criança

Quando crianças, meus irmãos e eu frequentávamos um clube de campo.

Pouco distante da cidade, a maior atração dali eram suas duas imensas piscinas.

Elas atraíam mais do que alguns animais e pássaros com os quais os sócios podiam socializar então.

As piscinas viviam lotadas e exigiam cuidados o tempo todo.

Mesmo sendo proibido urinar na água (havia avisos, claro), alguns sócios não respeitavam isso nem outras coisas.

Mais de uma vez alguém saiu da água com um preservativo pendurado na orelha ou acomodado no topo da cabeça.

Parecia engraçado, ríamos muito, mesmo não sabendo para que serviam os preservativos.

A presença grudenta deles na piscina causava alarme nos nossos pais, logicamente.

Daí que os funcionários da manutenção colocavam enormes quantidades de cloro nas piscinas.

Tudo para proteger os banhistas dos bichinhos invisíveis que viviam nas águas.

E outros que eram trazidos pelos próprios sócios, uns poucos pouco higiênicos.

Tanto cloro foi aplicado que os maiôs e shorts de alguns frequentadores começaram a se desintegrar dentro da água.

Para nós, meninos, ver algumas pessoas saindo da piscina feito Adão e Eva, com uma mão na frente e outra atrás, ou cobrindo os seios, passou a ser a coisa mais interessante do clube.

Quase nem mais entrávamos na água então.

Ficávamos sentados nas cadeiras de banhistas aguardando a exibição involuntária dos próximos pelados.

Mas um dia ocorreu que um cãozinho caiu dentro da piscina, um desses sensíveis lulus.

Quando foi retirado da água, vivo ainda, intacta estava somente a sua cabeça.

O resto do cãozinho era praticamente esqueleto: o cloro consumira quase todo seu corpo.

Foi imediatamente socorrido, claro: era muito cloro.

Cloro demais.

Depois ficamos sabendo que uma clínica veterinária da capital conseguira reparar todo aquele estrago.

E tempos depois, o dono do cãozinho, completamente recuperado, ganharia vários prêmios na modalidade de nado cachorrinho, sua especialidade.

Mas isso foi em outras piscinas, outros clubes, outras cidades.

Água sanitária, que nem é cloro puro, ainda hoje me dá um pouco de tontura.

E penso que fomos umas crianças meio tontas mesmo...