Jerry Bocchio e A Ameaça no Reality - Capitulo V: Colocando o Caderno em Prática

Então agora tem uma ameaça para mim na parede do quarto do hotel onde eu estou hospedado em Aruba. O pretendente a assassino está junto com a produção, ou fazendo parte dela, ou disfarçado entre eles.

Eu fui em direção à parede onde estava escrita a ameaça e cheguei mais perto para ver. Passei o dedo em uma parte e a tinta pegou no meu dedo. O que quer dizer que a tinta está fresca ainda. O que quer dizer que o sujeito ainda está por perto. Uma coisa que achei estranha é que a tinta tinha um cheiro doce.

Virei de novo para Anne e Jessy, que estavam na porta do quarto e pedi pra elas entrarem e fechar a porta. Anne fechou tremendo. Ela estava aflita. Eu não aguentei ver o estado dela e fui tentar acalmá-la. Fui até ela, segurei seus ombros e disse, olhando de frente pra ela:

– Anne, senta um pouco.

– Jerry, eu esqueci que a gente está investigando um crime. Eu fiquei empolgada em participar, achei esse negócio de investigação e de disfarce legal, mas esqueci que as nossas vidas estão correndo perigo!

– Não, Anne! Olha, a ameaça tá só citando o meu nome. Sou só eu quem sou o alvo.

– Mesmo assim, eu também não quero que nada aconteça com você. É melhor eu chamar a Polícia.

– Se você acha melhor, tudo bem, só tenta se acalmar antes.

Enquanto Anne e eu conversávamos, eu ouvi a Jessy me chamando:

– Jerry, isso aqui é batom.

– Olha, Jessy, a situação agora não é boa pra vender cosméticos.

– Não, Jerry! Quem escreveu isso aqui usou batom pra escrever. É o batom que eu uso, inclusive... Bom, parece ser o mesmo por causa do cheiro dele.

Por isso que o cheiro estava doce então. Virei para ela e ela estava na parede olhando a mensagem. Só que tem uma coisa, Jessy disse ser o mesmo que ela usava. Não poderia ter sido ela a ter escrito, não?

– Jessy, você disse que esse é o mesmo batom que você usa?

– É, parece, a marca que eu uso é a única que tem perfume de rosas. Eu também faço publis dessa marca nas minhas postagens.

– Que estranho!

Jessy desconfiou das minhas perguntas e ficou assustada. Puxou o batom dela de dentro da bolsa, me mostrou e disse:

– Jerry, não fui eu quem escreveu isso. Olha o meu batom está inteiro aqui comigo. Eu estava no restaurante esse tempo todo, vocês me viram lá.

Bom, com relação a ela estar com o batom dela na bolsa, só isso não comprova, ela poderia muito bem usar outro, mas não falei nada. Afinal, tinha algo desconexo se fosse Jessy a pessoa que escreveu. Ela não parecia tão burra a ponto de se incriminar desse jeito, muito pelo contrário. Ela também não pediria pra me acompanhar até o quarto e não daria essa informação sobre o batom. Será que alguém estaria tentando incriminar ela?

Foi então que eu comecei a me lembrar do Roninho. Ele estava extremamente apreensivo na parte da manhã, perto do meu quarto. Quando eu vi ele entrando no restaurante, ele já estava tranquilo, numa questão de meia hora. Além disso, Roninho fazia parte do fã clube da Jessy e... Opa! Foi aí que eu me lembrei que, em nenhum momento, eu interroguei ele.

– Anne, não ligue pra Polícia ainda!

– Mas, Jerry...

– Eu só quero ter mais uma conversa antes.

Uma hora depois, Roninho apareceu na porta do meu quarto um pouco apreensivo e com as mãos nos bolsos. A porta estava quase toda aberta, então, ele entrou. O quarto estava só com a Jessy chorando sentada na cama. Ele olhou a escrita na parede, olhou a Jessy chorando, chegou até ela e disse:

– Poxa vida! Isso tá ficando cada vez mais perigoso!

Jessy, ainda chorando, respondeu:

– Você não sabe do pior, Roninho. Quem fez isso tá tentando me incriminar!

– Incriminar? Como assim?

– Quem escreveu isso usou o mesmo batom que o meu, até a cor é igual.

– Deve ser só coincidência, Jessynha! Onde está o detetive?

– Ele e a Anne foram chamar a Polícia pra vir aqui me prender.

Foi então que Roninho perdeu toda a pinta dele. Ele se sentou do lado de Jessy e começou a falar mais alto:

– O que você tá fazendo aqui ainda, Jessynha! Dá o fora daqui!

– Não! Eu vou provar que sou inocente! Foi por isso que eu pedi pra você vir aqui. Você me acompanha direto na internet, você pode servir de testemunha. Me ajuda, por favor!

– Não, Jessynha! Aquele detetive é burro demais, isso não vai adiantar. Vem comigo, vamos fugir daqui!

– Não!

– Vem! Eu te abrigo na minha casa, no Brasil, até isso passar.

– Não! Eu sou inocente! Eu não vou fugir!

– Aquele detetive é burro demais! Onde já se viu chegar numa conclusão dessas? Só porque o batom é o mesmo, significa que você é culpada?

– Pois é, Roninho! Estão tentando me incriminar!

– Não! Também não é isso! Quem escreveu isso, na verdade, está querendo fazer outra coisa.

Foi então que eu saí de trás da porta, fechei ela e tranquei. Então eu falei, assustando o Roninho, que deu um salto da cama:

– É mesmo, Roninho? O que ele queria?

– Detetive!

Roninho, que já tinha perdido a pinta de bonzão dele, agora começa a se sentir acuado. Ele encosta na parede como um dos personagens secundários dos filmes de terror prestes a terminar seu papel. Então, eu vou continuando:

– Me ajuda aí, cara! Eu sou burro demais, não sou bom em suposições.

– Detetive! Eu... Não... Queria dizer isso. Eu tava nervoso.

– Bom, talvez a intenção não seja mesmo de incriminar a Jessy, mas de levar ela embora fazendo ela acreditar que tem alguém tentando incriminá-la, só pra fazer o papel de herói.

– Espera aí, você tá desconfiando de mim?

– Como você tem tanta certeza do que o mensageiro aí queria?

Então Roninho começa a forçar um riso malicioso, tira as mãos dos bolsos e as levanta, me mostrando os dedos.

– Ah, detetive! Você não pensa direito mesmo, né? Olha só, minhas mãos não têm marca de batom! Você não tem provas de que fui eu.

Ah, como eu amo quando o interrogado vai direto pro "você não tem provas"! É quase uma confissão. Me facilita muito o trabalho. Isso colaria se eu ainda estivesse na Polícia, com todos aqueles protocolos, mas agora não. Eu olhei pra Jessy, que trocou o choro por um sorriso confiante e perguntei:

– Jessy, em algum momento eu cravei que quem escreveu isso estaria com as mãos sujas?

– Não, Jerry!

– Pois é, né? Até porque, depois de todo esse tempo, ele teria muitas oportunidades de lavar as mãos, no hotel, no restaurante, etc. Né não?

– É! Se ele não lavasse as mãos, ele sim seria burro, hahaha!

– Além do mais, eu nem sugeri que ele sujou as mãos ao escrever, o que significa que, se foi o Roninho quem escreveu, ele tá quase me dizendo que ele sujou as mãos no processo e lavou durante o tempo.

Roninho se irrita com o meu deboche e começa a gritar:

– Qual é, detetive! Eu já disse que você não tem nada contra mim! Você tá tirando essa teoria do seu...

– Opa, opa! Então vou te dar uma chance de limpar o seu nome, tá? Você ficou o dia inteiro com as mãos nos bolsos, né? Sabe como é a relação entre batom e roupa, só um toque já deixa manchado. Desvira eles aí, se estiverem limpos, pode ir.

Ele andou até eu, apontou o dedo na minha cara e começou a falar:

– Eu não vou obedecer um detetivezinho idiota que investiga casos de velhos cornos. Eu sou o diretor dessa emissora, eu faço o que eu quiser! Se você quiser ver meus bolsos, vai ter que pegar um mandato!

– Eu não sou da Polícia, não tenho que me meter com essa papelada.

– Então, passar bem! Abra essa porta, agora!

O problema é que Roninho estava tão nervoso que não percebeu que, enquanto ele passava pela cama pra me dar essa encarada, Jessy desvirou um dos bolsos dele e... Batata! Todo manchado de vermelho. Eu só sorri e apontei para baixo. Ele olhou e virou para Jessy, todo decepcionado:

– Jessynha, eu achei que a gente estava no mesmo time!

– Ah, se toca! Você tem a idade do meu pai! Até parece que eu ia querer ficar com um mimado de meia idade!

Agora era hora de eu finalizar:

– Então, acho que você deve explicações, Ronald.

Então, Roninho fica revoltado com os acontecimentos, e acaba respondendo agressivamente:

– Então tá! Você quer a verdade? Foi eu quem mandou as duas ameaças. Eu não queria que a Jéssica participasse dessa temporada. Era eu quem deveria ser o próximo namorado dela. Mas, não! Aquele patrocinador idiota insistiu na participação dela e a produção aceitou, então eu mandei a primeira ameaça pensando que iam desistir da gravação. Mas, não, de novo! Mandaram um detetive de araque pra investigar. E o que é pior, a Jessica ficou se engraçando com ele!

– Se engraçando comigo? Mas eu não lembro dela contando nenhuma piada.

– Cala essa sua boca! Como ousam dizer não para o Roninho? Minha família construiu essa emissora! Ninguém diz não pra mim!

– OK! Acho que agora é uma boa hora pra chamar a Polícia.

– Hahahahaha! E com base em quê, detetivezinho? Eu posso me livrar dessa prova agora e negar tudo o que eu disse. Eu tenho advogados. É, isso mesmo! Advogados, no plural. E a única coisa que você tem é uma calça manchada e uma confissão com só uma testemunha suspeita.

– É verdade isso, Anne?

Foi então que Anne surgiu de debaixo da cama segurando o celular e mostrando que tinha gravado tudo. Bom, ficou bem claro que a gente combinou isso tudo, né?

O problema é que isso ativou o lado primitivo de Roninho, ele tentou fugir. Ele me empurrou contra a porta, me pegando de surpresa, o impacto machucou minhas costas. Enquanto eu estava caído no chão, Roninho ficava tentando colocar a mão no bolso onde eu tinha guardado a chave para roubá-la.

Mas, como Jessy disse, ele é um homem de meia idade filhinho de papai, então eu consegui me recuperar e segurei os braços dele pra não deixar ele roubar a chave. Dei uma rasteira nele e consegui derrubá-lo no chão com facilidade. Então, coloquei algemas nele só pra evitar dele fazer mais besteira. Como foi ele quem veio descontrolado pra cima de mim, eu posso usar as algemas.

Enfim, a Polícia veio e levou ele embora. Ele seria mandado para o Brasil. Anne, Jessy e eu tivemos de ir também para prestar depoimento. Anne deixou as instruções para a diretora substituta e saiu com o reality em gravação. Eu, sinceramente, não tive a mínima vontade de assistir.

Roninho responde na justiça por ameaça e lesão corporal dolosa, eu acho que ele vai se safar, mas que ele virou notícia no Brasil inteiro, ah, isso ele virou. Ele foi desligado da Glamour TV e está sendo processado pela Jessy Lins.

E junto com isso eu também virei notícia! Só que dessa vez, não era mais em sites de fofoca! Tomara que as coisas melhorem a partir de agora.

Só que eu sentia que faltava alguma coisa, fiquei sem saber o que era por alguns momentos quando me veio as lembranças de quando Anne e eu trabalhamos juntos na investigação. Foi aí que percebi uma coisa: eu meio que me apaixonei pela Anne. Sabe como é, né?

Eu tentei ligar no contato dela que ela me passou quando veio me contratar. Era o contato do trabalho, mas eu não tinha outro. Porém, ela não atendia. O assistente dela dizia que ela não apareceu lá desde quando voltou.

Na noite após o meu depoimento, estava eu, tomando meu café em uma das mesas na Padaria Nova Caledônia, um pouco chateado, sabendo que não iria mais ver a Anne, quando eu ouvi o meu nome sendo chamado. Olhei para trás e era a Jessy.

– Jessy, que mundo pequeno!

– Oi, Jerry! Eu vim aqui me despedir de você. O seu amigo policial, Tom, me disse que você gosta de tomar café aqui.

– Esse Tom! Uma hora ele vai falar meu paradeiro pra um inimigo.

– Hahaha! Enfim, obrigada por me ajudar e por me deixar ajudar, Jerry! Aquela jogada foi muito inteligente.

– Foi uma que eu tinha anotada na página 115 do meu caderno. Tem anotações de como montar uma armadilha pro investigado escorregar. Tá vendo como ele é útil?

– É mesmo! Vou começar a fazer um também. Tchau, Jerry! Que você e a Anne sejam felizes!

– Eu não estou com a Anne.

– Não? Mas eu vi como vocês dois combinam. O modo como vocês falaram no quarto do hotel, parecia que vocês estavam namorando já.

– É, acontece, né?

Jessy abriu um sorriso, puxou uma cadeira da mesa e se sentou à minha frente.

– Esquece ela! Deixa eu tomar um café com você aqui pra te ajudar a animar.

Nós ficamos conversando durante umas horas, quer dizer, quando ela não estava verificando o celular. Como ela é influencer, talvez ela precise mesmo ficar mexendo direto, né? Ela falava bastante de festas e se eu gostaria de participar com ela. Eu disse que pensaria, mas na verdade, não sou muito do tipo festeiro. Prefiro ir em festas dos meus amigos mesmo. Além disso, o objetivo dela não foi conquistado, eu não consegui esquecer a Anne nesse tempo.

No dia seguinte, eu fui até a sede da Glamour TV pra receber o Pix. Quando saí da sala do responsável, olhei para o lado e vi a Anne andando em minha direção. Ela estava com as roupas que costuma usar no trabalho, só que com os cabelos soltos, dessa vez. Ela estava tirando o cordão com o crachá dela e jogando na lixeira. Eu, meio desengonçado, chamei ela:

– Anne!

Ela não estava olhando em minha direção. Quando ouviu eu chamando, parou e me olhou na hora.

– Jerry!

Eu fui andando até ela.

– Anne... Eu... Tentei te ligar esses dias e diziam que você não estava.

– Eu saí da cidade um pouco pra começar um projeto. Você está aqui por quê?

– Eu vim receber meu dinheiro pela investigação.

– Já está saindo?

– Sim.

– Então vamos, eu te explico no caminho.

Fomos andando pelos corredores em direção ao elevador. Anne foi me falando:

– Eu acabei de pedir demissão da Glamour TV.

– Por quê?

– Aquele negócio que você me falou das escadas, aquilo meio que me pegou. Eu vi que eu estava aceitando coisas que não gostaria a troco de só continuar subindo.

– Mas, e aí, você vai fazer o que?

– Eu saí da cidade pra conversar com uma jornalista amiga minha. Nós vamos começar um podcast true crime.

– Um o quê?

– Podcast true crime. É um podcast que a gente expõe crimes que deram o que falar ou que estão sem solução até hoje.

– Rapaz, pra que esse nome em inglês?

Chegamos ao elevador e Anne continuou:

– Eu vou ficar uns tempos fora da cidade pra ajudar a alavancar o projeto. Foi o estúdio que a gente conseguiu por enquanto.

Ai, caramba! Essa notícia me deixou triste.

– Você vai embora?

– É, até a gente conseguir um estúdio aqui na cidade. Pode demorar mas...

O elevador chegou, nós entramos e Anne reparou na minha expressão.

– Tá tudo bem, Jerry?

– Tá, tudo bem. Eu estou feliz por você. Só... Acho que... Vou sentir sua falta.

Anne se espantou com a minha fala. Ela virou repentinamente pra mim e disse:

– Jerry! Como assim?

Nesse momento, as palavras saíam automaticamente da minha boca e eu estava todo desengonçado:

– Eu gostei de trabalhar com você. Bom... Pra falar a verdade... Eu gostei de você. É...

– Jerry, eu pensei que você ia ficar com a Jessy.

– A Jessy? Não! Ela não faz o meu tipo. Eu fui vendo... Na verdade... Que eu gostava de você mesmo.

– Jerry, eu... Eu também gostei de você.

Depois que ela me disse isso, eu não conseguia mais falar, apenas fiquei olhando pra ela, que fazia o mesmo. O silêncio tomou conta do elevador e nós fomos chegando cada vez mais perto até que... O toque do elevador apareceu indicando que tínhamos chegado ao térreo, fazendo nós dois voltarmos.

Saímos do elevador, fomos até a saída e então eu disse:

– Bom, boa sorte pra você no seu podcast. Me passa o nome que eu indico pro pessoal.

– Obrigada, Jerry! Tomara que a gente pegue o mesmo caso mais pra frente pra trabalhar junto de novo.

– É, isso ia ser legal.

Anne me deu um beijo no rosto e saiu. Eu fiquei parado vendo ela ir embora torcendo pra gente se ver de novo.