O VELÓRIO DO JUVENAL

Juvenal morreu de acidente quando tinha 40 anos. Novo ainda, mas com uma vida intensa, era casado com uma mulher bonita e tinha muitos amigos. No seu velório, lá estava seu corpo no caixão, um monte de gente ao redor, uns chegando e outros saindo, mas a movimentação era grande. Choro, abraços, cumprimentos, consolo, uma solidariedade rara que, infelizmente, só se vê em velórios, depois tudo volta ao que era antes. 

Mas Juvenal estava lá, invisível aos olhos mortais, mas estava lá, já em outra dimensão, mas estava lá, firme e apreciando tudo e a todos. Alegre por ver tantos amigos indo despedir-se dele. 

De repente, ele olha e quem estava chegando ? O safado do cunhado dele, um tremendo cara de pau, que devia uma grana firme ao Juvenal e não pagou antes dele morrer. Agora, aparecia fazendo cara de coitadinho. Como a viúva era irmã dele, certamente ela iria receber a grana no dia 31 de fevereiro. 

Juvenal escutou um barulho e virou-se para a porta da capela e quem ele viu ? O Arnaldo seu concunhado, chorando e dizendo “ele era tão bonzinho” e ele pensou : - mas o que este filho da puta faz aqui ? Sempre falou mal de mim, sempre me criticou pelas costas e vem dar uma de carola ? Agora, depois de morto eu “virei” coitadinho. Xô urubu, xô ! 

Outro susto e Juvenal ficou “gelado”, eis que surge Dorita, a gostosona do bairro, em quem ele já tinha dado uns amassos. O que será que ela veio fazer aqui ? E segurando um filho pequeno pelas mãos. Escândalo aqui não, por favor ! Será que vai dar merda ? Será que o filho é meu ? 

Enquanto pensava isto, ele vê a sua “viúva” chorando nos braços do Antenor, velho amigo seu, mas pessoa de altíssima periculosidade. Antenor era conhecido por comer até “buraco de fechadura”. Mesmo estando em “outra dimensão”, Juvenal começou a sentir um certo “comichão” na testa e ficou preocupado com o “futuro” da viúva. 

E o velório seguia em frente. A turma do gargarejo, lá fora, rindo e contando piadas, como sempre, lembrando os bons tempos e as farras organizadas pelo Juvenal. Ah, que saudades! 

Neste momento, ele escuta uma voz conhecida e ao mesmo tempo assustadora. Era Rafael o seu chefe na repartição. Juvenal tinha horror dele. Vivia perseguindo o pobre coitado, maltratava-o na frente de todos, debochava dele. Pintava o sete. 

Juvenal não perdeu tempo, sabendo que já estava em outra dimensão, foi a forra, chegou bem perto do “chefão” e por trás deu-lhe um beijo no pescoço, passou a mão na bunda dele e sussurrou no seu ouvido: - viado gostoso !  Rafael deu um grito e caiu sentado no chão, apavorado. Juvenal deu uma sonora gargalhada e vibrou de alegria. Que delícia de velório ! E disse para si mesmo : - se eu soubesse que era assim, tinha morrido a mais tempo.