A BESTA

Este textículo, como diria Xavier de Maistre (em Viagem ao redor do meu quarto), “vai lançar a máxima luz sobre a natureza do homem: é o prisma com o qual se poderá analisar e decompor as faculdades do homem, separando o poder animal dos raios puros da inteligência”.

Era uma vez um escritor, que perdeu sua besta. Aborrecido não sabia onde procurá-la. Onde teria ido aquela criatura? – pensava ele agoniado. Vou matá-la, ela não perde por esperar, aquela desgraçada – continuava ele rogando praga pra cima da coitada. Com que autorização ela escapa assim de mim? Ah, quando eu pegar ela não vai sobrar nada pra contar a história. E agora, o que faria sem ela? – refletia ele ainda mais incomodado.

Tudo bem, que eles não se davam lá muito bem, mas mesmo assim um dependia do outro. Isso ele não podia negar. Ambos tinham lá seus desentendimentos e muitas vezes entrar num acordo era extremamente difícil, já que eram bastante temperamentais. Mas apesar de tudo, o escritor lamentava profundamente sua falta. Sinceramente até. Como viver sem aquela besta? Não havia a mínima possibilidade. Era como se tivessem sido feitos sob medida um para o outro. É impossível separá-la de mim – cogitava ele, lembrando-se dos bons e maus momentos que ambos passaram juntos. Ó bestinha do meu coração, volte para mim – clamava ele aos Céus.

Sua presença era necessária. Extremamente necessária. Volte, volte, onde quer que você esteja – recomeçou ele, lutando para acalmar sua aflição. E foi nesse instante, em meio às suas queixas e lamúrias, que ele teve um sobressalto conhecido. Era a besta que voltava para sua alma, no momento em que compunha mais uma de suas obras. Mais uma vez ela se distraíra com outras ideias, enquanto ele labutava sofregamente sobre o papel.