O VELORIO

Ronaldo José de Almeida

Rivaldir já estava cansado da labuta diária, afinal eram 40 anos de volante de caminhão, viajando pelo norte do país, região muito sofrida assim como seu Rivaldir.

A família já estava praticamente criada, tinha sete filhos, quatro moças e três rapazes, dona Florência boa esposa e excelente mãe de família, soube educar os filhos com muito esmero.

Certo dia, seu Rivaldir chegou de viagem, muito abatido queixando-se de uma dor no peito, tomou um banho rapidamente, tomou uma sopa preparada com urgência pela dona Flôr-como era conhecida a sua esposa- e deitou-se.

Conhecendo bem seu marido, dona Flor, sentiu que alguma coisa não estava bem, seu marido não era pessoa de se abater daquela forma. Ficou ressabiada, mas não disse a ninguém, preferiu aguardar o marido acordar.

Algumas horas se passaram e nada do marido acordar, dona Flor muito preocupada, chamou as duas filhas que estavam em casa e foram acordar o Rivaldir, quando então notaram que este tinha falecido.

A choradeira tomou conta da família, após algumas horas a casa estava cheia de parentes e amigos e o velório preparado na pequena sala da casa, o enterro estava marcado para ás dez horas da manhã seguinte.

Em meio a choros e lamúrias, assim como em exaltação as qualidades do “de cujus”, o tempo foi passando, lá pelas dez horas da noite, Donato, Leondino e Lindolfo, resolveram fazer uma pequena fogueira, para amenizar o frio que castigava.

Dirigiram-se a margem da linha férrea que passava defronte a casa e erigiram uma pequena fogueira onde se agacharam esperando o tempo passar.

Leontino saiu rapidamente e logo voltou com uma garrafa de cachaça de rolha, tomou um grande gole e passou a garrafa para os amigos, a satisfação foi geral.

De repente, Lineu açougueiro teve uma idéia, chamou o garoto Gezinho e mandou que ele fosse buscar uma carne de sol em sua casa.

-Gêzinho, corra lá em casa e pega aquela carne que está na geladeira, bem rápido.

Dito e feito, Gêzinho foi “voando” e logo estava de volta com dois quilos de carne de sol.

Jocasta filha do “de cujos” que estava abraçada com Silvestre seu namorado, foi à cozinha preparar a carne e logo voltou com dois espetos prontos para assar.

A turma ansiosa esperava a carne ficar no “ponto”, para começar a comilança, quando avistaram Jacó Sanfoneiro, que aproximou com a sanfona pendurada no ombro.

-Olá, fiquei sabendo da “passagem” do nosso amigo, que tristeza gente. – disse melancólico Jacó.

Pois é Jacó, é a vida. – respondeu Jocasta.

-Toma um gole Jacó -disse Leontino.

Jacó tomou um gole e encostou a sanfona, demonstrando tristeza.

-Tocando muito Jacó? – perguntou Adolfo, cunhado de Jocasta.

- Bastante Adolfo, estou até com umas músicas novas no repertório - respondeu Jacó.

Nova rodada de cachaça e lá pelas duas da madrugada, a turma já estava “alta”.

Lineu perguntou a Jacó.

-Jacó você já sabe tocar uma música nova francesa que está tocando demais nas rádios?

-Olhe Lineu se for “Aline” que você está falando, já aprendi - respondeu Jacó.

-Dá para dar um toque baixinho na sanfona? – indagou Lineu.

-Se a turma não importar – disse Jacó.

-Tudo bem, Jacó. Meu pai ia até gostar. Concordou Jocasta.

Ato contínuo Jacó executou magistralmente a bela canção francesa de Christoff. Em seguida vieram outras, quase sempre forró, alguns namorados dançavam agarradinhos sem sair do lugar, o frio e a cachaça criavam o clima para a dança.

Da beira da linha férrea alguém sugeriu a mudança para dentro da casa, para fugir do frio.

O sanfoneiro portando o instrumento e já meio “grogue” entrou na casa tocando.

Alguém, não se sabe quem, empurrou o caixão para outro cômodo e na sala da frente o forró, a cachaça e o churrasco foram até o dia raiar; mas segundo a filha do morto, a Jocasta, o pai ia até gostar.

RONALDO JOSÉ DE ALMEIDA
Enviado por RONALDO JOSÉ DE ALMEIDA em 13/12/2007
Reeditado em 18/12/2007
Código do texto: T776826
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