CAINDO NA GANDAIA
Ronaldo José de Almeida
Ainda adolescente com grande talento para música, Elias vivia assistindo aos ensaios do pequeno conjunto da sua igreja evangélica, onde se destacava o trompetista chamado Aurindo, o qual ensinou os primeiros acordes ao garoto.
Sempre no final do ensaio do conjunto, Aurindo dedicava mais alguns minutos do seu tempo ensinando o Elias, a quem muito admirava e que aprendia rapidamente inclusive conseguindo efetuar alguns solos.
O tempo passou e Elias já rapaz, fazia parte do conjunto evangélico da igreja, destacando-se como trompetista solo.
Devido à fama de bom instrumentista Elias foi convidado por um amigo para animar os bailes de carnaval do Automóvel Clube de uma cidade distante da sua, ganhando assim um bom dinheiro.
Mesmo a contra-gosto devido a sua religião o músico aceitou a proposta do amigo e partiu para o Reinado de Momo com grande expectativa.
O trompetista que nunca tinha participado de uma festa carnavalesca ficou deslumbrado com a alegria no salão e mais ainda com uma linda morena que lhe lançava olhares e sorrisos sedutores.
Percebendo o flerte do amigo, Aurindo lhe disse ao pé do ouvido:
-- Notei a bola que a morena está lhe dando, no intervalo desça do palco e fale
com ela.
-- Você viu como ela é bonita Aurindo?
-- Vou fazer o que você disse.
No intervalo, enquanto os músicos descansavam, Elias desceu do palco e ficou num ponto estratégico perto do bar olhando para a morena.
Assim que ela o viu caminhou sorridente em sua direção e sem a menor cerimônia falou:
-- Como vai? - eu sou a Cecília.
--Vou bem Cecília, meu nome é Elias.
Após a apresentação o casal ficou conversando alegremente por muito tempo, havia uma simpatia mutua, própria da relação que há entre pessoas que instintivamente se sentem atraídas entre si.
O baile recomeçou, porém o Elias continuou a conversar num canto do bar com
Cecília.
Com o passar do tempo já demonstrando namoro, os dois circundavam o salão abraçados ao som das marchinhas tradicionais sob o olhar aprovador do amigo Aurindo.
Durante o resto da noite o trompetista não se desgrudou da namorada, esbaldaram-se a noite toda regando a sua alegria a doses seguidas de Cuba Libre.
As noites seguintes não foram diferentes, Elias tocava apenas no inicio do baile, no primeiro intervalo ele descia do palco para se encontrar com a namorada Cecília e caia na gandaia até o dia
amanhecer.
O músico libertou-se das amarras religiosa que o impediam de se igualar aos demais e começou a se esbaldar na companhia da namorada.
Como se sabe os bailes de carnaval se caracterizava pela alegria desabrida, pela eliminação da repressão e da censura, pela liberdade de atitudes críticas e eróticas.
No segundo dia o músico já se portou como um folião de verdade, inclusive vestiu uma camiseta bem colorida com os dizeres estampado no peito; “Eu bebo sim e estou vivendo, tem gente que não bebe e está morrendo”.
Assim, como um bom folião, sempre com um copo de Cuba Libre na mão e abraçado com a namorada, sem contar os colares havaianos no pescoço, Elias desfrutou prazerosamente o tríduo de Momo.
Encerrado o reinado de Momo, retornaram os amigos para casa, durante toda a viagem o assunto do Elias era o mesmo, o carnaval e sua paixão por Cecília.
No domingo durante o culto, o trom petista estava vestido i mpecavel mente á frente do conjunto, quando o Pastor Jorge acenou com a cabeça para que ele desse inicio ao hino.
Imediatamente o conjunto se preparou esperando o solo de trompete do Elias que já
fazia pose para efetuar.
Certamente ainda com o pensamento nas farras do carnaval, inconscientemente conseguiu um som puríssimo do trompete, não do hino esperado, mas do tradicional e eterno sucesso carnavalesco “mamãe eu quero, mamãe eu quero, mamãe eu quero mamar”.