ESTRAMBÓTICO
Quando o professor de Gramática Linotipus de Azevedo se aposentou, foi uma festa pra gurizada. Isto para alguns, porque os ex-alunos da vizinhança continuaram padecendo:
- Bom dia, Carlinhos. Vamos ver como andas em concordância verbal: o certo é forra-se botões ou forram-se botões?
Sem ter mais o que fazer, passou a aterrorizar a vizinhança com seu policiamento gramatical. Quando mirava alguém com os óculos redondos, minúsculos, acavalados no nariz enorme, era de tremer, a pessoa já se perguntava: que será que eu disse de errado?
Um dia entrou furioso no bar onde se jogava dominó e se consumiam (ou será consumia?) algumas geladas:
- Estou pasmo! O Carvalho, sabem a palavra que ele teve a ousadia de pronunciar? Estrambólico! Pasmem!.
Todos ficaram realmente pasmos: que palavra era essa? Para não dar vexame, concordaram, era realmente um absurdo. Logo o Carvalho!
- Pois é! – continuou o mestre. O correto é estrambótico, com te de taxidérmico.
Esmagados pela sapiência do professor, os outros se calaram, apenas o Curió, bêbado contumaz (ou será costumaz?), teve coragem de perguntar:
- E o que significa esse tal de eston ... estrambótico?
- Coisa simples: quer dizer extravagante, inusitado, escalafobético...
Um dia, numa de suas caminhadas, o professor quase teve uma apoplexia. Ali estava, na fachada de um barzinho, uma tabuleta com nada menos que um pleonasmo, um solecismo e dois barbarismos: “Aqui, neste locau, vende-se salchichas”. Fora de si, avançou contra o proprietário do bar, indagando quem fora o néscio, o capiau, o beldroegas que escrevera tal sandice. Assustado, o homem defendeu-se da agressão tacando uma garrafa na ilustre testa do mestre. Felizmente, Linotipus sobreviveu, para glória da gramática nacional.
No bar, todos lastimaram o incidente: no fundo, o professor era uma excelente pessoa.
- Concordo – opinou o Curió, enrolando a língua – pena que é meio estrambótico!