Sina porcina
De passagem por um lugar longínquo e bem ermo, um caixeiro-viajante viu-se compelido a bater à porta de uma bela fazenda para solicitar um pernoite. Muito bem recebido pelo fazendeiro, viu-se de repente - já de banho tomado - sentado à mesa com a família, para o jantar no início da noite.
Chamou-lhe a atenção a distinção dos familiares, que além da esposa, constava de 3 jovens bem educados, atenciosos e muito bem vestidos...mas a atenção maior ficou por conta de um porco, sim, literalmente um suíno, garbosamente assentado na contra-cabeceira da lauta mesa, portando uma bela jaqueta negra, gravata borboleta e medalhas reluzentes ao peito, além de ostentar uma prótese de madeira logo abaixo da coxa esquerda...À primeira impressão, o visitante achou que havia exagerado no aperitivo, de excelente sabor e qualidade, aliás. Uns tragos mais de vinho adicionavam ao quadro daquela sua confusão...
Resolveu, assim, inquirir discretamente ao pé do ouvido o anfitrião que não só lhe corroborou a impressão, bem como teceu rasgados elogios ao quadrúpede comensal, que manejava os talheres com rara destreza e elegância...e o fazendeiro ainda aduziu à sua confirmação:
- É deveras um animal, mas de um caráter sem jaça e de uma lealdade inquebrantável. As medalhas que ostenta, são de ouro 22 quilates, e cada uma corresponde a um agradecimento pessoal meu e de minha esposa, por um relevante trabalho prestado à família. Só para abreviar e de molde a não deixar que se derreta o sorbet francês que acabamos de ser servidos, assinalo que no primeiro caso salvou meu filho mais velho, Flavinho, de se afogar no poço da fazenda, resgatou com bravura o Carlinhos de um incêndio de gigantescas proporções no estábulo, e finalmente livrou o Eduzinho de uma perseguição Suprema de um fanático fantasma calvo, sem um fio de cabelo, que vivia a rondar a propriedade...
Boquiaberto, ao visitante só restou perguntar sobre a prótese do ilustre herói...qual teria sido a sua causa, um acidente...?
Aí, já mais discreto, o anfitrião simplesmente respondeu-lhe ao ouvido:
- Meu caro amigo, quando você tem um humanimal desse valor, você deve ser criterioso ao máximo para não o consumir assim de uma só vez...