Um santo remédio

O Zui me chamou de lado, apreensivo:

- Cara, voce tem de me ajudar!

Xô explicar: a gente cresceu juntos. Amigos desde os 10 anos de idade. Grupo escolar. Paqueras. Em 77 casamos.

Peralá! Peralá!

Essa última frase deixa margem a mal entendidos. Não é que casamos um com o outro. Que somos machos até debaixo dágua. Casamos, eu com minha mulher, ele com a Tânia.

Que mais tarde descobrimos que na verdade era Tiana. Diminutivo de Sebastiana. Mas como tinha vergonha do nome fez essa pequena variação semântica.

Voltando ao que interessa, o motivo do pedido de ajuda, explicou meio de sopetão:

- Ce sabe que andei trabalhando em Iacanga mês passado?

Sabia. É uma cidade aqui perto.

- E ia na segunda e só voltava na sexta pra economizar gasolina?

Sabia também. Ele era pintor de casas e tinham empreitado uma escola para pintar. Serviço de um, dois meses.

Mas onde eu podia ajudar?

- Andei pegando umas vagabundas pra dormir comigo na obra e uma lazarenta me passou gonorréia.

- E ?

- Acabei passando pra Tiana .

Vixi, a coisa era mais complicada que eu pensava. Conhecia bem sua esposa. Se soubesse que havia ganhado chifres ia ficar uma arara e descer o cacete nele. Agora, se descobrisse que além do chifre tinha ganho uma doença venérea junto, ah! Meu cumpadre! Aí era caso pra Polícia, advogado e internação do Zui no hospital local por pelo menos uns tres meses. Que ela era brava! Imagina uma mulher brava! Imaginou? Multiplica por dez! Multiplicou? É a Tiana.

- Tem de se tratar! - Expliquei dando um passo para trás, que morro de medo dessas coisas. Vai que o treco pega pelo ar!

- Já fui no Rui da farmácia e ele vendeu Tetrex. Disse pra tomar de oito em oito horas que numa semana eu saro.

Menos mal, pensei.

- O problema é a Tiana! Como vou fazer prela tomar sem contar o que aconteceu?

Complicado. Muito complicado.

Mas como a necessidade é a mãe do ladrão e se dá jeito em tudo, menos na morte, matutei, matutei e cinco cervejas depois arrumei uma solução:

- Ela continua tratanto daquela asma?

- Continua.

Pronto! Tava resolvido a pendenga!

Mandei ele comprar mais uma caixinha do remédio. Tirei as cápsulas da embalagem. Escrevi à máquina num envelope: Asmatic! Tomar a cada oito horas durante uma semana! Botei o remédio dentro. Grampeei.

Minha parte estava feita. Ainda recomendei:

- E fique esperto sempre! Faz ela tomar religiosamente!

Passado algum tempo encontrei a Tiana no mercado.

Ela me olhou raivosa. Desviou o carrinho de compras para não cruzar comigo. Eu sem entender nadica de nada.

Mais uma semana e nos encontramos de novo. Aí não resisti e perguntei porque estava tão brava comigo, se eu não tinha feito nada para ela.

- Não fez nada? – pude vislumbrar o ódio nos seus olhos.

- Que eu saiba, não!

Aí ela destilou toda sua raiva:

- O Zui me contou que voce deu aquele remédio prele me dar!

Desgraçado! Tinha de envolver meu nome na tramóia!

- E voce tomou direitinho?

- Claro que tomei aquela merda! – deu uma respirada mais funda antes de prosseguir:- Se voce não entende bosta nenhuma de doença, faça o favor de nunca mais falar nada pro meu marido. Ele é um trouxa que acredita nos amigos e pensa que pode confiar.

Eu ainda não estava entendendo nada.

- Mas não foi bom o remédio?

A Tiana até tremia ao responder:

- Bom? Voce está perguntando se aquela merda foi bom?

- Não foi?

- Me deu uma dor de estômago desgraçada! Que eu rolava na cama de dor. Uma caganeira dos inferno! Uma suação o dia inteiro. E o pior: piorou minha asma!

E foi embora me mandando praquele lugar com todas as letras.

Bem, pensei, pelo menos sarou da gonorréia!

Mas assim que encontrasse o Zui ia meter a boca nele. Carinha língua frouxa, meu!

Nickinho
Enviado por Nickinho em 21/11/2007
Código do texto: T746021