Arte constrangedora
Anos atrás (coloca muitos anos nisso, como já dizia o poeta Jota Garcia), fui a Mauritânia assessorando um executivo. Na verdade, eu só carregava a pasta dele. Nossa firma fornecia equipamentos para a Mendes Junior que lá estava fazendo uma estrada de 600 km.
A empreiteira permitia que os funcionários levassem suas famílias, tal como acontecia com as Cruzadas séculos atrás.
Na época, a minoria muçulmana era quem dominava o poder de maioria negroide.
Num final de semana fomos convidados para uma recepção no palácio governamental.
Havia além de nossa quota de brasileiros, muitos europeus vestidos, quase todos, em ton pastel, enquanto os africanos com suas vestimentas e turbantes super coloridos faziam um desfile parecido com o de nossas escolas de samba. Lá havia também um exposição de artes do pintor Ferrè, francês de origem senegalesa.
Um dos quadros chamava bastante a atenção. Na tela, ele dividiu em dois retângulos. Num, estava pintado metade preta e marrom, no sentido vertical e um traço branco horizontal e alguns respingos de vermelho.
No outro retângulo se via uma profusão de matizes azuis, verdes, marrons, laranjas e rosas. Também o indefectível traço branco e os respingos de vermelho.
Socializando depois, tanto com os europeus como com os mauritanos, parecia que era um entendimento comum que o retângulo profusamente colorido agradava mais aos olhos.
Duas horas depois, já enfastiado, pois não havia bebida alcóolica, fiquei observando a fauna humana ali presente. De repente, imaginei todos nus. Em seguida imaginei dois grupos separados lado a lado de europeus e africanos.
Os africanos com seus belos sorrisos alvíssimos. Os europeus iam da palidez ao bronzeamento, da cabeleira marrom escura ao loiro mais claro.
"Meu deus!" pensei (na época ainda estava no armário sobre meu ateísmo), será isso que o Ferrè quis expressar?
Sem nenhuma causa que justificasse, fiquei constrangido.
Post-scriptum;
Abomino o racismo e a ditadura das minorias. Bem como a abominável promoção individual mercantil desses herdeiros.