Entrevista com o senhor Inútil de Souza, candidato a prefeito - parte 1 de 3 - publicada no Zeca Quinha Nius
Concedeu-nos entrevista o senhor Inútil de Souza, candidato a prefeito pelo P.O.R.C.A.R.I.A. (Partido dos Operários Revolucionários Comunistas e dos Anarquistas Revoltosos e dos Intelectuais Anti-americanos). Falou-nos, sempre espirituoso, de bom-humor, durante as quatro horas que se dispôs, amigável e gentilmente, a, dedicado ao repórter do Zeca Quinha Nius, o maior e melhor hebdomadário digital do orbe terrestre, responder-lhe às perguntas que ele lhe fez, de suas propostas, e de propostas que não são suas, e de sua vida, e de seus sonhos pesadelos, e dos seus concorrentes, e das atuais políticas municipal, estadual, nacional e mundial, e de suas atividades diárias. Hoje, especialmente hoje, e em nenhum outro dia, nem antes, nem depois, publicamos um trecho - que é o primeiro de uma série, que se encerrará assim que publicarmos o último trecho, que, sendo o derradeiro, o encerra - da entrevista cujo fim foi o de recolhimento, pelo repórter do Zeca Quinha Nius, do senhor Inútil de Souza infornações que deste revelam segredos que, dados a público, exibem aspectos de sua personalidade multifacetada, única e singular, que apenas a ele, e a ninguém mais, pertence. À leitura, querido leitor, da esclarecedora entrevista.
ENTREVISTADOR: Senhor candidato, por que o senhor se candidatou a prefeito?
INÚTIL DE SOUZA: Porque a minha mulher pediu-me dinheiro para comprar vestidos caros; além disso, ela quer viajar à Europa, aos Estados Unidos, a Dubai, à Finlândia, à Austrália. E tem mais: ela quer morar em um castelo de vidro transparente, moderno. E tem mais: Ela quer que eu lhe compre, todo ano, um carro, e colar de pérolas. E para satisfazer as vontades de minha doce e amanda consorte, preciso de algumas toneladas de din-dins, barões, cascalhos, bufunfas.
ENTREVISTADOR: Mas, senhor candidato, hoje em dia o dinheiro é digital; não se fazem mais necessárias moedas e cédulas, objetos obsoletos.
INÚTIL DE SOUZA: Dinheiro digital não ocupa espaço; é fantasmagórico. Eu não sei se existe, se é invenção de escritores de livros de ficção cientítica. Quero cascalho, din-din. Quero ver o dinheiro, pegá-lo, cheirá-lo, mordê-lo. Quero dinheiro concreto, e não inconcreto.
ENTREVISTADOR: Dinheiro não é concreto; é metálico... e de papel.
INÚTIL DE SOUZA: Dinheiro de papel é coisa criada por mentecaptos. Traças o comem. Quem foi o dito cujo que teve a brilhante idéia de inventar dinheiro de papel!? Imbecil dos infernos. Bons tempos os de antigamente, quando existia apenas moedas. Sonho com um mundo em que só exista moedas, moedas de ouro, moedas de prata, moedas de bronze... e barras de ouro; sonho com um mundo sem dinheiro de papel... e sem dinheiro digital, outra invenção de mentecaptos, que, além de mentecaptos, são energúmenos, sandeus e paspalhos.
ENTREVISTADOR: Por que, senhor candidato, o senhor sonha com tal mundo?
INÚTIL DE SOUZA: Porque eu durmo.
ENTREVISTADOR: O senhor sonha com tal mundo, senhor candidato, porque ele não existe; se existisse, o senhor não sonharia com ele?
INÚTIL DE SOUZA: Eu nunca pensei em tal questão, que, reconheço, é muito interessante, interessantíssima, tão interessante que, agora, pensando nela, vêm-me à mente pensamentos que eu jamais havia pensado porque eu nunca me havia detido para pensar nela. Pergunto-me se eu sonharia com algo que não existe caso existisse e com algo que existe se não existisse. O mundo dos meus sonhos não existe, mas já existiu, não apenas no meu sonho, mas de fato, há muitos séculos, e eu, ciente de que tal mundo já existiu, e dele sendo sabedor, sonho com ele, e às vezes tal sonho se torna pesadelo.
ENTREVISTADOR: Por que, senhor candidato?
INÚTIL DE SOUZA: As moedas enferrujam-se.
ENTREVISTADOR: Até as de ouro!?
INÚTIL DE SOUZA: Sim. Até as de ouro. E as que não se enferrujam, derretem-se.
ENTREVISTADOR: Como isso é possível, senhor candidato!?
INÚTIL DE SOUZA: Não sei. Mas nos meus pesadelos, e não em todos eles, as moedas de ouro derretem-se. E tem mais: As traças comem as moedas de ouro.
ENTREVISTADOR: Traças geneticamente modificadas, senhor candidato!?
INÚTIL DE SOUZA: Provavelmente; ou improvavelmente, não sei. Sei apenas que nos meus pesadelos, e não em todos eles, mas apenas nos quais há moedas de ouro e traças, as traças devoram as moedas de ouro. E há um detalhe interessante, que eu não posso deixar de dizer: Às vezes, e não raras vezes, enquanto estou dormindo, e dormindo tão pesadamente que se quebram as pernas da cama, alguns dos meus sonhos convertem-se em pesadelos e alguns dos meus pesadelos em sonhos.
ENTREVISTADOR: Quebram-se apenas as pernas da cama? Os pés dela não?
INÚTIL DE SOUZA: Os pés da cama, não. Só as suas pernas.
ENTREVISTADOR: As minhas pernas!?
INÚTIL DE SOUZA: As suas, não; as da cama. Atente para as minhas palavras, para que repórteres que talvez queiram o seu emprego no Zeca Quinha Nius, inescrupulosa, e ladinamente, não quebrem as suas pernas.
ENTREVISTADOR: Por que eles quebrariam as pernas da cama!?
INÚTIL DE SOUZA: As da cama, não; as suas. Você está muito distraído, e, distraído, você não entende o que digo, e, não entendendo o que digo, além de não entender o que digo, faz observações sem sentido, o que estimulará os seus inimigos jornalistas a ousarem se apresentar ao Zeca Quinha, seu chefe e proprietário do Zeca Quinha Nius, e apontar as inconveniências das suas atitudes, falar do seu despreparo para o exercício do jornalismo, e se lhe apresentarem como tipos superiores de tão baixos, rasteiros e ladinos, e roubarem de você o seu emprego.
ENTREVISTADOR: Não podemos nos esquecer, senhor candidato, que o Zeca Quinha Nius é o maior e melhor hebdomadário digital do orbe terrestre e o senhor Zeca Quinha o seu primeiro e único fundador e seu editor-chefe e chefe do editor.
INÚTIL DE SOUZA: Eu sei. Eu sei. Eu sei. E o trabalho dele à frente do Zeca Quinha Nius me traz à mente as minhas atividades diárias.