Entrevista com o senhor Zero à Esquerda, candidato a prefeito - parte 3 de 5 - publicada no Zeca Quinha Nius
ENTREVISTADOR: Fale-nos, senhor candidato, da razão que levou o senhor a conceber tal proposta.
ZERO À ESQUERDA: Imbecil! Não fiquei grávido para conceber a proposta. Gravidez é fenômeno comum às mulheres fecundadas durante uma relação sexual com um homem. Elas, elas, as mulheres, concebem; os homens, não.
ENTREVISTADOR: Fale-nos da sua proposta, senhor candidato.
ZERO À ESQUERDA: Irei falar dela quando, e se, eu achar que devo; antes, porém, tenho a dizer, respondendo à questão anterior, que nada me levou à proposta, nenhum carro, nenhuma bicicleta, tampouco um avião, menos ainda um navio; a proposta, de tão boa, brilhante, escolheu-me para que eu a apresentasse ao mundo. Ela não é tola, insensata, idiota e estúpida para se apresentar para qualquer bípede de duas pernas e dois pés da espécie humana e se lhes oferecer, sabendo que poucas pessoas, apenas as de gênio superior, podem compreendê-las, e pô-las em prática; e foi por esta razão, e não outra, que tal proposta escolheu-me, e não aos meus dois concorrentes. A proibição, agora esclareço a proposta, de venda e compra de melancia com mais de cinquenta semente atende às mais elevadas e sofisticadas exigências fitossanitárias, elaboradas pelas organizações mundiais de saúde, indispensáveis ao bom funcionamento do organismo social multifacetado cujas formação e constituição consiste num amálgama caleidoscópico de fenômenos aleatórios cujas conexões e associações são de inacreditável variedade e de componentes variegados de difícil mensuração. Não me peça para explicá-la, pois eu, no curto tempo de uma entrevista, não poderei explaná-la com propriedade considerando as diretrizes científicas estabelecidas pelas áreas da biologia, química e física conjugadas com a astronomia e a geologia, e suas equações profiláticas de enorme complexidade. Apenas homens de gênio superlativo, e eu sou um dos agraciados com tão extraordinário, e raro, dom, têm inteligência para apreender o valor da pedra angular que dá sustentação ao fim colimado pelo exercício de tal medida política, inédita nos anais da história.
ENTREVISTADOR: Senhor candidato, estamos enfrentando, neste ano de 2.020, uma epidemia viral que dizimou milhões de empregos mundo afora e provocou uma crise econômica sem precedentes. Aqui em nossa cidade, dezenas de empresas, em decorrência de tal surto epidêmico, faliram e milhares de pessoas perderam o emprego. O que o senhor, senhor candidato, propõe para gerar emprego e impedir que se aprofunde a crise econômica?
ZERO À ESQUERDA: Proponho que se faça o que tem de ser feito.
ENTREVISTADOR: E o que tem de ser feito, senhor candidato?
ZERO À ESQUERDA: Tem de ser feito o que tem de ser feito.
ENTREVISTADOR: O senhor, senhor candidato, pode ser explícito?
ZERO À ESQUERDA: Se explícito, serei obsceno.
ENTREVISTADOR: O senhor, senhor candidato, pode nos detalhar a política que o senhor implementará, se eleito prefeito, para evitar a catástrofe econômica, que de nós se avizinha?
ZERO À ESQUERDA: Primeiro, uma observação: Eu serei eleito prefeito desta cidade.
ENTREVISTADOR: Não sabemos, senhor candidato.
ZERO À ESQUERDA: Você está em campanha por outro candidato?
ENTREVISTADOR: Não, senhor candidato. Não.