-SOU INESQUECÍVEL!

Há algum tempo precisei comprar um novo laptop.

Uns dois anos, talvez.

Não que eu fosse perdulária mas é que o meu antigo desktop já dava nítidos sinais de aposentadoria compulsória.

E eu lá, insistindo nos erros...do sistema falido.

Ainda era um tempo incrível, no qual as compras presenciais eram super modernas e a gente até podia conversar com o vendedor, fazer perguntas e pedir orientações sobre o produto, tomar um cafezinho na loja, pechinchar descontos e conseguir, enfim, ainda era época daquele antigo normal que eu nem de longe sonharia que algum dia, tão rapidamente, seria um tão antigo anormal.

Lembro que minha primeira preocupação foi instalar um antivírus, então, o Zé, um super atencioso vendedor, pra lá de calmo,aliás duma calmaria resistente a tudo e a todos-até aos mais insistentes fatores estressantes!-depois de me explicar minunciosamente sobre tudo do moderno funcionamento e também sobre a melhor vacina recomendada, me forneceu um telefone daqueles que nos dão suporte técnico para qualquer drama.

Saí da loja feliz como criança. Mas a felicidade durou minutos.

Em casa, prontamente liguei o laptop e instalei o programa antiviral.

Pane total instantânea. A tela ficou black. Paralisada.

O bicho apagou dum jeito que parecia ser para nunca mais acender.

Entrei em pânico.

Voltei imediatamente à loja, chamei o Zé que pronta e calmamente me acalmou, a chamar o suporte técnico presencial que reinstalou o windows alegando algo que até hoje não entendi muito bem.

A plataforma não aguentou a vacina indicada, mas nada sério, segundo o entendedor da máquina.

Talvez uma incompatibilidade de softwares.

Mas na verdade nada me convencia... eu queria outro aparelho.

Eu me sentia insegura com aquela pane esquisita meio não diagnosticada.

Supliquei ao Zé que pouco poderia fazer.

Comecei a chorar. A loja parou para assistir meu desespero.

Uma outra cliente entrou na conversa"Ah, o seu laptop também parou, não é? Tá vendo, Zé? Não foi só comigo!"

E o Zé lá, numa calmaria invejável.

Todo mundo fez fila para opinar sobre o fato.

Davam receitas, até parecia um caso hidroxicloroquina- like!

Todo mundo sabia receitar algo para o meu desatino antiviral.

Chorava para o vendedor me ajudar, para o técnico da máquina reportar o defeito oculto do sistema ao fabricante, afinal, o produto era caro para entrar em pane horas depois da compra. Mas não teve jeito.

Eu sabia dos meus direitos de consumidor mas daria um trabalhão para provar o ocorrido já que a máquina voltara a funcionar.

Nos dias que se sucederam eu ainda liguei várias vezes ao Zé alegando que a máquina estava lenta.

Toda vez que era ligada se reinstalava o sistema todo.

Chorei mais algumas vezes pro Zé...era de desespero porque precisava do computador para tarefas inadiáveis.

Ele, sempre bem calmamente, nunca deixou de me ouvir e acalmar.

Ele me explicava, seguramente, que era da natureza tecnológica do tal hardware.

Que melhoraria. E melhorou mesmo. O Zé estava certo.

O tempo passou e o laptop resolveu funcionar normalmente só com o antivírus da própria máquina.

Dias desses precisei de algo da mesma loja, e sabe com é, pandemia sem antivírus, isolamento social, calma e prontamente me lembrei que tinha o WhatSap do Zé, então eu lhe deixei um recadinho em áudio:

"Oi Zé, tudo bem, sou eu, aquela cliente do Laptop que deu pane com o antivírus, se lembra de mim? Eu precisaria de ..."

Minutos depois ele me respondeu a mensagem em áudio, todo solícito na sua calmaria e educação irretocáveis de sempre:

"Olá, muito boa tarde,claro... mas é claro que eu me lembro, como eu poderia me esquecer, não é mesmo? No que posso lhe ajudar?"

Fiquei ali pensando..."como eu poderia me esquecer...NÃO É MESMO?"

Cheguei à conclusão:

"a gente pode se tornar inesquecível até pelos nossos momentos mais improváveis..."