O Prego na Botina (Mineirez)
Se faltar paciência, leia a tradução abaixo.
Ôtá butina disgraçada! Essi pregu bem no carcanhá tá mi dexano doidiô. A Ritinha cum essa di santinha já tá mi incheno us picuá. Adondi o mardito do diabo colocô u pé di ferro? -Olha ele aí! Táva bem dibaxo dus meu zóio e eu num vi. Péraí! Arguém falô cum eu! Num tem ninguém aqui in casa cum eu. Essi negóci da santinha da Ritinha tá mi derretenu us miolo. I u martelu? Onditá qui eu num achu? Vô largá essa butina i pegá u sapatão. Bem qui eu pudia i muntado se num fossi a ranhetici da vó co u meu cavalu, só pur causa di umas bosta nu quintar. Êtá sapatão apertadu, mais é mió qui pregu nu carcanhá.
Bem inté qui a luma tá crara, bem mió pá caminhá. Si eu nun fô a Ritinha num vai perduá, oji é dia da santinha si eu fartá a Ritinha num vai perduá! Qui tranquera essi sapatão apertadu, pá podê andá assim só si u diabu mi levá. A flô sim é qui mi tenta pá fica, êta corchão macio, êta lençór di argodão, êta cuberta mais boa. A flô tá mi pidino pá fica, oji é dia da santinha, si eu num fô a Ritinha num vai perduá. A flô tá quereno qui eu fiqui, ela dis qui gosta di eu, mais onti quem tava lá era u Mozá. Cum essi sapatão apertadu só u diabu pá mi levá.
Eitá qui a luma é cheia, qui bão qui a istrada tá bem lumiada, achu qui só vai tá iscuro agora qui tô entrano no corredô du calipiá, mai tá iscuro memo. – Vem então que vou te carregar. Quem qui taí? Quem qui falô cum eu? Péra aí! Quem qui agarrô us meu pé, quem qui tá arrancano us meu sapatão? Mais pareci até qui mi aliviô a dô, mais qui negóci mais friu, quê qué issu nus meu pé? Credu sai prá lá coisa fidida, que grudera isquisita. Praga, di ondi vem tudu essas teia? Tudo essas aranha na minha ropa, que qui tá mi mordiscano pur dentru das carça? Ai qui vô tê qui arrancá tuda ropa, mais uquequi tá amarrano us meu braço? Uquequi tá mi correno pur dentru das manga? Aiaiai u meu corpu tá tudo moiado, us meus zóio ta quereno fechá, aiaiai as minha perna num qué mi obêdêcê, eu tô percisano mais as perna num qué corrê. – Você pediu e eu vou te levar. Tá iscuro i num sei quem qui ocê é, mais seja quem fô, eu não perciso de ocê. Vô é ajuntá minhas força, vô saí dessi iscuro, vô vortá lá pá istrada crara. Sai prá lá seus muleque da ponte, sai prá lá suas luizinha das pedra, saí prá lá mula sem cabeça, saí prá lá lobizome, sai prá lá saci pererê, eu num querdito noceis. As minha perna tá pesada, us braçu tá amarradu , u meu corpu tá moiado, us meu pé tá qui é só dô, mais eu vô tê qui i, oji é u dia da santinha, oji eu num posso fartá, ô Ritinha! Manda a santinha mi buscá.
Ô Zé! A febri baxô! Ocê acordô! O dotô dissi qui ocê já tava du ladu di lá, então eu pidí pa santinha e ela mi falô nuzovido, quela ia ti buscá.
Ô Zé! O dotô tamém folô prá ocê num mais uzá o canivete, pá tirá us istrépe do carcanhá.
PORTUGUÊS
Ô botina desgraçada! Esse prego bem no calcanhar está me deixando doido. A Ritinha com essa de santinha já está me enchendo os picuas. Aonde o maldito do diabo colocou o pé de ferro? -Olha ele aí! Estava bem embaixo dos meus olhos e eu não vi. Espera aí! Alguém falou comigo! Não tem ninguém aqui em casa comigo! Esse negócio da santinha da Ritinha está me derretendo os miolos. E o martelo? Onde está que eu não acho? Vou largar esta botina e pegar o sapatão. Bem que eu podia ir montado se na fosse a ranhetice da vó com o meu cavalo, só por causa de umas bostas no quintal. Eita sapatão apertado, mais é melhor que prego no calcanhar.
Bem, até que a lua está clara, bem melhor para caminhar. Se eu não for a Ritinha num vai perdoar, hoje é dia da santinha se eu faltar a Ritinha não vai perdoar! Que tranqueira este sapatão apertado, para poder andar assim, só se o diabo me levar. A Flor sim é que me tenta para ficar, eita colchão macio, eita lençol de algodão, eita coberta mais boa. A Flor está me pedindo para ficar, hoje é dia da santinha, se eu não for a Ritinha não vai perdoar. A
Flor está querendo qui eu fique, ela diz que gosta de mim, mais ontem quem estava lá era o Mozar. Com este sapatão apertado só o diabo para me levar.
Eita que a lua é cheia, que bom que a estrada está bem iluminada, acho que só vai estar escuro agora que estou entrando no corredor dos eucaliptos, mais está escuro mesmo. – Vem então que vou te carregar. Quem que está aí? Quem que falou comigo? Espera aí! Quem que agarrou os meus pés, quem que está me arrancando os sapatões? Mas parece até que me aliviou a dor, mais que negócio mais frio, o que é que é isto nos meus pés? Credo sai pra lá coisa fedida, que grudeira esquisita. Praga, de onde vem todas estas teias? Todas estas aranhas na minha roupa, o que é que está me mordiscando por dentro da calça? Ai, vou ter que arrancar toda a roupa, mais o que é que está amarrando os meus braços? O que é que está me escorrendo por dentro das mangas? Aiaiai o meu corpo está todo molhado, os meus olhos estão querendo fechar, aiaiai as minhas pernas não querem me obedecer, estou precisando mas minhas pernas não querem correr. – Você pediu e eu vou te levar. Está escuro e eu não sei sei quem é você, mais seja quem for, eu não preciso de você. Vou é juntar as minhas forças e vou sair deste escuro, vou voltar lá para estrada clara. Sai pra lá seus moleques da ponte, sai pra lá suas luzinhas das pedras, saí pra lá mula sem cabeça, saí pra lá lobisomem, sai pra lá saci pererê, eu não acredito em vocês. As minha pernas estão pesadas, os braços estão amarrados, o meu corpo está molhado, os meus pés estão que é só dor, mas eu vou ter que ir, hoje é o dia da santinha, hoje eu não posso faltar, ô! Ritinha! Manda a santinha me buscar.
Ô Zé! A febre abaixou! Você acordou! O doutor disse que você já estava do lado de lá, então eu pedi pra santinha e ela me falou nos ouvidos que ela iria te buscar.
Ô Zé! O doutor também falou para você não mais usar o canivete para tirar os estrepes do calcanhar.