Sempre há os Domingos...?

A mulher chega ao médico com o marido, um farrapo de homem consumido pela bebida, e aquela penca de filho dela ser consumida como comida...E tá que desce o malho no marido pela sua entrega total ao álcool sem gel...

O médico, profissional qualificado e enérgico, passa uma descompostura de regra no indigitado e com um discurso inflamado sobre moral, desestruturação da família, destruição da saúde, chega contudo a se surpreender com o choro convulsivo do homem, cujas gotas etéricas não parecem ter fim...

Compadecido com aquele quadro indescritível de miséria humana, o médico chama o bebum para uma sala a parte, e tenta dar-lhe um pouco de dignidade de uma confissão de homem para homem...

- É verdade que o senhor está bebendo tanto, conforme sua mulher descreve...?

- (aos soluços) Doutor, ela exagerou, me reduziu a pó...na verdade eu só bebo no domingo...

- Verdade, isso? Mal posso acreditar. Vamos fazer um trato aqui, eu entendo bem as dificuldades de um relacionamento, sobretudo em condições adversas, como é o caso do senhor que está com a saúde abalada, sem emprego fixo, e com tantas responsabilidades...e concordo consigo que para se manter um matrimônio em ordem, tem que haver uma distribuição das tolerâncias, de lado a lado...E sendo assim, como o senhor me assegura que só bebe no domingo - cá entre nós - vou dar um crédito ao senhor, mas não vá além. Domingo só, e pronto...! De acordo?

- De acordo, Doutor.

Na cena seguinte, uma batelada de remédios é receitada e o casal volta com a criançada para casa, numa trégua salvadora.

Contudo, duas semanas depois, antes ainda da data da consulta de retorno, a desafortunada senhora e agora ainda mais desesperada irrompe no gabinete do consultas do Doutor...e lhe joga a remedama pela escrivaninha bradando, em alta voz:

- Doutor, o senhor liberou meu marido para continuar bebendo...?

- Minha senhora, diante do fragilíssimo estado mental e psicológico de seu marido eu, querendo evitar uma catástrofe maior, e iminente, resolvi autorizá-lo a beber sim, moderadamente, e só no domingo...conforme ele me asseverou e prometeu...!

- Mas Doutor, como ousou o senhor...! O Domingo é o dono do buteco...!