O RATO RATECO
Chamavam-lhe o Rato Rateco,
Meio sacristão, meio fradeco.
De esguia e mediana estatura
Aquela infeliz criatura
Às vezes sóbrio, outras quente,
Falando bem a toda a gente.
De seu nome giro Quim Rato,
Não dando de si parte fraco
Fazia a vida pela sacristia,
De manhã entrava, à noite saía;
Nas horas mortas era fresco,
E, quando co´ s copos, Rateco.
Tratava-o bem mal o Prior
Porque lhe estragava o andor
E quando lhe não punha a vista
Perguntava sempre à florista,
Que lhe dizia com todo o assombro
- Eu dei-lhe inda há pouco no lombo…
Num certo dia, com sainete
Entrou lesto no gabinete
E viu o Prior, cheio de folia,
Preparando a sua homilia
Mas tendo à volta duas beatas
Meio atrevidas e insensatas.
O nosso Rato, franzindo o cenho:
- Desculpem, eu vou ali e já venho!
Devem estar para a confissão…
Não é nada de mal, pois então,
Qualquer dia também me confesso…
- Por coisas de Deus me interesso!
Saiu o Rato muito ligeiro
E andou por lá o dia inteiro.
Quando voltou: - Lá vem o Rateco…
- Anda cá, meu badameco,
Cheiras a vinho que tresandas
Eu quero saber por onde andas!
Quim Rato benzeu-se na pia,
De uma água benta bem fria,
E disse ao Prior dum só folgo:
- Confesse-me, agora ou mais logo…
Olhe que, há pouco, eu não vi nada
Dispense-me porém doutra piada…
- Pois é, voltaste a ir à tasca
E, por causa disso, estás à rasca!
- Olhe que eu só bebi dois canecos
E não sou como os outros Ratecos!
E o pobre coitado lá se confessou
E, emendar-se, logo ali jurou…
O Reitor, que não era boa peça,
Obrigou-o a fazer tal promessa
- Olha lá, a cabeça à roda não está
Quando acordas pela manhã?
Ademais, pondo a alma-ao-léu:
- Não te sabe a boca a chapéu?
Rato Rateco, logo se levantou
E ao seu Prior se abraçou
Em inesperada desordem:
- Também sabes como elas mordem.
Ai padre, padre, da minha alma,
Agora, este desabafo me acalma!
Frassino Machado
In ODIRONIAS