Sinistro
Sinistro em Cascais ou A Lei de Newton e a Roldana?
Cia de seguros pede explicação mais detalhada sobre acidente com operário português ocorrido no canteiro de obras de um edifício em construção sito à Rua Inocêncio Coitadinho sem número.
A explicação do sinistrado transcrita abaixo foi obtida através de cópia de arquivo da Seguradora A.C.Gurados & Co.
O caso foi julgado no Tribunal do Trabalho da Comarca de Cascais.
Excelentíssimos Senhores,
Em resposta ao pedido de informações adicionais informo:
No quesito de n° 3, em participação no sinistro, comuniquei ‘tentando executar o serviço sozinho’ como causa do meu acidente. A solicitação na vossa carta pede explicações mais pormenorizadas, sendo assim, espero que o detalhamento apresentado logo abaixo seja suficiente para dirimir qualquer dúvida remanescente.
Sou assentador de tijolos. No dia da ocorrência eu trabalhava sozinho no telhado de um edifício em construção. Findo o meu serviço notei que havia sobrado dois sacos de cimento que não fora usado. Estes, somados, pesavam 100 kg. Em vez de arriá-los um a um até o chão, decidi colocá-los dentro de um barril com alça resistente e descê-los de uma só vez pela roldana fixada num dos lados do edifício.
Fui ao térreo, amarrei a corda na alça do recipiente para suspendê-lo até o teto e a prendi em local seguro. Em seguida subi à cobertura e coloquei o cimento dentro do tonel. Retornei ao solo, desatei o nó que mantinha o fardo suspenso e segurei a corda com firmeza, para que o carregamento pudesse descer devagar (é de se notar que no quesito de n° 15 informei meu peso que é de 80 kg). De chofre fui içado para o alto. Tomado pela surpresa, ao invés de largar a corda, automaticamente agarrei-me a ela ainda com mais vigor para evitar que o material caísse desgovernado. É necessário informar que subi velozmente. Na proximidade do terceiro andar choquei-me contra a carga que caía pesada. Isto explica a fratura no crânio e a clavícula fissurada. Apesar da pancada não larguei da corda e continuei subindo rápido até os dedos entalarem na roldana. Recuperei-me do susto, mas continuei segurando com força como se a corda fosse a minha única salvação naquele momento. Ao atingir o solo o barril partiu-se e liberou os dois volumes. Feito de madeira o tonel vazio pesava aproximadamente 25 kg (relembro aqui, novamente, meu peso de 80 kg indicado no quesito de n° 15). Como podem imaginar, a minha descida até o chão foi um desastre, literalmente despenquei do alto do prédio. Próximo do terceiro andar fui atingido pelo tonel avariado e sem o cimento que subia acelerado. É o que justifica os tornozelos partidos e as lacerações na parte inferior do corpo. Esta ultima colisão diminuiu a minha queda o suficiente para minimizar o meu sofrimento, quando me esborrachei no solo tive apenas três vértebras fraturadas, felizmente.
Lamentavelmente devo acrescentar que já me encontrava estatelado sobre os sacos de cimento, completamente imobilizado pelas dores e incapacitado de me levantar, quando perdi os sentidos e larguei a corda. O barril de madeira colado na roldana no alto do edifício e que pesava mais do que a corda ruiu sobre as minhas duas pernas. Isto explica as duas fraturas expostas, uma no fêmur da perna esquerda e a outra na tíbia da perna direita.
Espero ter atendido a vossa solicitação, o de informar o modo verídico de como ocorreu meu acidente.
Sem mais, subscrevo,
Ass.: Joaquim Tapá Dussou
PS.: Desde já aguardo a liberação do seguro a que tenho direito.