Leia essa agora.
- Você está sofrendo de andropausa, advertiu-lhe uma amiga certa vez. Era o Flávio, recordando a conversa.
Ele, por sua vez, com 60 anos de idade e espírito de 25, nega o óbvio descaradamente. Acredita que sente calor e transpira com facilidade por causa do aumento da temperatura, aquecimento global, nada a ver com diminuição da libido ou redução de testosterona.
- Andropausa é conversa fiada pra boi dormir, isto sim! Disse ele, de si para consigo mesmo em objeção a fala da amiga.
A sua casa é rodeada por um muro alto, e tanto o portão de frente quanto o portão da garagem bloqueiam completamente a visão da rua.
Era por volta de 11 horas da noite. Sem vontade de ler um livro e na falta de opção do que fazer ele abriu a porta da sala, completamente.
Com as luzes apagadas dentro de casa, a única claridade que tinha provinha da lâmpada acesa no poste do outro lado da rua, e que iluminava bem a sua varanda.
Depois, ligou a televisão ao lado da porta aberta, para assistir um enlatado americano. Por causa do calor e do suor que o maltratava impiedosamente, ligou também o ventilador de teto. Encheu uma taça de vinho, puxou pra perto o tapete próximo, sentou-se sobre ele, colocou um almofadão nas costas e se escorou no sofá. Pronto, sentiu-se acomodado.
A sua mãe dormia com a porta do quarto entreaberta. Podia facilmente vê-la e ouví-la ressonando de onde ele estava.
O relógio marcava meia-noite ou quase isso quando o celular acusou uma notificação do zap. Sentado de frente para a televisão e a porta aberta, Flávio pegou o smartphone do chão pra verificar a mensagem que fez soar o aplicativo. Não havia recado ou notícia, tratava-se de uma gozação inoportuna de um amigo flamenguista. A partir de então ele ignorou o seriado na TV e,
automaticamente, abriu o Youtube; passou vários tópicos aleatórios e decidiu ver um clipe que exibia a foto de um tigre. O vídeo mostrava dois machos adultos lutando ferozmente para marcar território. As imagens daquela disputa sangrenta deixaram-no fortemente impressionado.
Justo neste instante, um gato passou caminhando sobre o muro sem que ele o tivesse visto; a luz do poste, por trás do felino, projetou na parede da varanda a sua sombra superdimensionada seguindo de fora para dentro de casa.
Mesmo impressionado e atento as imagens no aparelho em suas mãos, Flávio percebeu, de relance, quando um bicho enorme, de boca aberta e com as presas à mostra, tal qual aquele mesmo tigre selvagem em combate cruento no celular, viu nítido o rabo dele suspenso para o ar, atravessou rápido a parede da varanda e entrou pela porta aberta da sala. Imediatamente imaginou sofrer um atacaque daquele gigante indomável.
O susto foi tão grande, que ele já pulou do chão gritando: OU, OU, OU!!! E caiu de pé.
A sombra do animal sumiu na escuridão ao seu redor.
A mãe, neste exato momento, estava no seu sono mais profundo e não acordou.
Só depois de conferir se havia cagado involuntariamente a cueca, foi que ele, curioso, achegou-se da porta.
E logo de cara avistou um gato preto sentado em cima do muro. Lógico que não precisou de gastar seus neurônios para deduzir os fatos.
Procurou ao seu redor algo que pudesse atirar no bicho para se vingar, como nada encontrou, arremessou então o braço para enxotar o safado, ao mesmo tempo em que xingou o animal tenebroso:
- Sai daí, o ... !
Sem mais interesse na programação ele desligou a TV, fechou a casa, entornou goela abaixo o vinho que lhe restava na taça e foi tomar um banho, antes de se deitar para dormir.
Ah! Não borrou a cueca, não senhor. Nada além de uma suspeita. Mas que o susto foi imenso, disso não tenha dúvidas.