A Trupe da Alegria
A TRUPE DA ALEGRIA
Texto: Régis Di Soller
Personagens:
Psicóloga;
Paciente;
Recepcionista;
Paciente 2 -
(Cenário simples, pode ser composto apenas por duas cadeiras. A iluminação pode ser feita com uma geral branca. A recepcionista fará uma intervenção, interagindo com o público, como se os espectadores estivessem esperando por uma consulta com a psicóloga).
Paciente 2 – Então, eu acho que eu quero meu dinheiro de volta.
Recepcionista – Algum problema?
Paciente 2 – É que eu saí do consultório pior do que eu entrei.
Recepcionista – Então você não aproveitou o seu tempo.
Paciente 2 – Mas eu só falei.
Recepcionista – Nós não trabalhamos com a política de devolução de dinheiro.
Paciente 2 – Mas eu paguei no cartão.
Recepcionista – Foi no cartão?
Paciente 2 – Isso!
Recepcionista – Também não devolvemos.
Paciente 2 – Foi no débito.
Recepcionista – Sinto muito. Você participou de quantas sessões?
Paciente 2 – Contando com a de hoje?
Recepcionista – Sim.
Paciente 2 – Uma.
Recepcionista – Para maiores resultados, aconselho que venha mais cinco vezes.
Paciente 2 – Tudo bem. Você pode marcar pra mim?
Recepcionista – Claro. Só daqui dois meses. Nossa terapeuta é muito requisitada. Os melhores artistas, celebridades e professores sempre marcam um horário com ela.
Paciente 2 – Tudo bem. Pode ser daqui dois meses.
Recepcionista – Agendado.
Paciente 2 – Muito obrigado.
Recepcionista – Próximo paciente. (Lendo uma ficha) Juliano Loureiro.
Psicóloga – Bom dia. Como posso ajudá-lo?
Paciente – (Tempo) Humm.
Psicóloga – Bom dia. Está tudo bem senhor.... (lendo a ficha do paciente)
Paciente – (Interrompendo a leitura) Bom dia. Bom dia. Bom. Dia. Quer dizer, depende da maneira como a pessoa vê o dia.
Psicóloga – Sim. E como o senhor vê o dia de hoje?
Paciente – (Tempo) Humm. Hoje? Não sei.
Psicóloga – Não sabe? Pense numa resposta melhor. Você consegue.
Paciente – Sei lá. Talvez sei lá é minha resposta.
Psicóloga – Pense numa cor que possa simbolizar o seu dia.
Paciente – Qualquer cor?
Psicóloga – Sim.
Paciente – Cinza.
Psicóloga – E por que escolheu essa cor?
Paciente – Porque estou triste.
Psicóloga – Qual o motivo da tristeza?
Paciente – Não consigo tomar um rumo na minha vida. Nada faz sentido. É tudo tão chato. Meus amigos são bobos e infelizes, não sou feliz com eles. Meu trabalho é estressante demais, minha família não aceita que sou...
Psicóloga – (Interrompendo) Vamos falar sobre o seu trabalho. Por que ele é estressante?
Paciente – Ganho pouco, trabalho com muitas pessoas. Preciso viajar sempre. Meu chefe gosta de me colocar na corda bamba perto dos outros. Isso é muito constrangedor. Não consigo ser feliz.
Psicóloga – O senhor tem amigos no seu trabalho?
Paciente – Insuportáveis! IN SU POR TÁ VEIS. Todos eles têm cara de idiota.
Psicóloga – Eles não interagem com o senhor?
Paciente – Todo dia. Uma piada mais sem graça que a outra. É como se eu estivesse num paredão, e o fuzilamento fosse as piadas ruins que eles contam.
Psicóloga – O senhor já pensou em deixar o emprego?
Paciente – Já. Várias vezes. Mas não tenho outro lugar que possa me empregar. Minha área é muito escassa.
Psicóloga – O senhor tem algum sonho que gostaria de realizar?
Paciente – Quando eu era criança eu queria ser um Power Ranger. Mas agora eu sou adulto. (Tempo) Eu queria ser o Batman.
Psicóloga – É um sonho que pode ser realizado de diversas formas. Fazendo teatro, jogando vídeo game... (tempo) O senhor gosta de dar risada?
Paciente – Claro, quem não gosta de rir? Só que faz um bom tempo que eu não dou uma boa risada.
Psicóloga – Ótimo. Minha irmã está na faculdade, e conseguiu comprar uma meia entrada para um espetáculo. Ela me deu, eu assisti e ri o tempo todo. É um espetáculo lindo, todos que assistiram, riram muito. Os palhaços então... um melhor que o outro. Profissionais mesmo! Sabem o que fazem!
Paciente – É disso que eu preciso. Quero rir muito também! Como chama o espetáculo?
Psicóloga – Olha, o nome do espetáculo todo eu não sei, mas tem uma apresentação que se chama “Palhaço Chica Bom e a Trupe da Alegria”. Conhece?
Paciente – (Tempo. Desolado) Conheço.
Psicóloga – Por que o senhor não assiste?
Paciente – O palhaço Chica Bom sou eu. E a Trupe da Alegria são os amigos que mencionei. Minha família não aceita que eu sou um palhaço. Meus amigos são insuportáveis e ainda sim, fizeram você rir. Toma mais uma meia entrada. (sai)
Psicóloga – (ligando) Recepção. Peça mais uma meia entrada pro paciente que tá saindo! (fim do espetáculo)