O ACIDENTE

O ACIDENTE

Uma paródia da vida real

Diz à ciência que para acontecer um fenômeno é preciso que haja o encontro de pelo menos dois fatores, ou seja, dois fatores ou uma infinidade deles convergem para um ponto comum.

O personagem da estória é o nosso amigo Ruminaldo, um aventureiro comerciante de secos e molhados que atuava bem no tempo da marcha para oeste brasileiro, já no início do êxodo rural.

Ele estava com a mulher e uma criança de um ano quando isto aconteceu; um fato que deixou ele metido numa sinuca de bico sem saída: uma cabeçada causaria um efeito dominó interminável. Ali o êxito, e somente o êxito seria a bola da vez.

Ele tinha um saveiro a álcool que já comprou de n mão em bom estado de conservação, porém com a licença atrasada e um catatau de multas incontáveis que ele sempre deixava para depois.

Ele tocava uma venda na beira da estrada e tinha uma chácara numa cidadezinha no interior do estado a cem quilômetros da capital.

Vinha voltando com a compra que era nada mais nada menos do que a metade de seu capital de giro que ele comprou com um cheque para quinze dias.

Bons pensamentos na cabeça era só chegar a casa e proceder como sempre ele fazia das outras vezes e tudo transcorreria muito bem, estava lançada a sorte!

Se dois fatores convergentes já é o suficiente para causar um acidente acompanhado de efeitos diretos e indiretos ele já tinha tudo isso que conhecemos e mais e mais fatores que evocava uma multidão de riscos.

Ele tinha passado o cinto de segurança, mas, do lado do passageiro o cinto estava sem a fivela, mas ele não tinha tempo de consertar, sempre dava aquele jeitinho de brasileiro.

A parte elétrica também não estava muito boa, mas ele não tinha que passar pelo centrão mesmo, e alem do mais se fosse para ele sinalizar uma mudança de sentido bastava estender o braço.

Naquele tempo não existia pedágio naquele trecho da BR para que se pudesse contar com a ajuda do resgate fornecido pela concessionária, melhor seria não correr o risco mesmo!

A pista naquele trecho da estrada estava sinalizada com uma faixa amarela contínua e na frente estava indo em marcha lenta uma Brasília ano e modelo 1980, ainda mais que a poucos metros atrás tinha uma placa que dizia: sob neblina use luz baixa e o tempo não estava como um céu de brigadeiro.

Ruminaldo então respirou fundo e meditou um instante de segundo dando tempo para aclarar mais a visão já que uma faixa contínua sempre prenuncia a vinda de um novo obstáculo e desta vez tudo passou bem.

Quando terminou a faixa amarela contínua deslumbrou-se um novo panorama e uma curva sinuosa apareceu donde vinha em sentido contrário um caminhão FNM carregado de madeira, eram três toras de mogno para uma cerraria da cidade.

Viu de onde você saiu? Disse-lhe a mulher num tom de alívio por terem se livrado de uma fatalidade que lhes deixaria seqüelas pelo resto da vida.

Logo depois ele avistou o Passat azul do Chicão na porta da máquina de arroz que tinha naquele local, - é caguete! Diz ele, já sei que tem uma blitz ali na frente, entrando por uma estradinha de terra ele saiu a dois quilômetros de distância dali e se livrou de mais uma grande complicação.

Ruminaldo nunca foi motorista profissional e nem tinha carteira, mas era desses que para o básico da sua sobrevivência ele sempre tinha uma saída.

Mas na descida do córgão ele quis descer na banguela em vez de engatar a 1ª, porque a descida era mansa, foi quando de repente surgiu uma vaca e o freio não pegou.

E para não matar a vaca ele teve que jogar o utilitário na ladeira que com uma só capotada foi parar no fundo do riacho.

Dona Etelvina foi lançada fora com a criança e sofreram algumas escoriações, ele por sorte não sofreu nada, mas a mercadoria perdeu quase toda.

Ela voltou com o bebê para a cidade na perua rural do Osvaldinho para os cuidados médicos, ele seguiu de carona na lambreta do Vavá para vir com o corcel buscar o que sobrou que dava para aproveitar.

Agora ele estava de novo numa sinuca de bico sem saída e o resultado foi sem dúvida um efeito dominó porque desta vez os fatores coincidiram.

Dentro de quinze dias ele teria que cobrir o cheque porque se voltasse o credor representava-o no dia seguinte, as boas empresas do comércio não faz apologia aos caloteiros, ainda que não fosse o caso dele.

Com tanto compromisso e pouca solução o caso era mesmo de coçar a cabeça: o resgate do saveiro, a retífica, o cheque, os impostos atrasados, a perda da mercadoria, e se ele fosse requerer do DPVAT ele só receberia o que gastou na farmácia com os medicamentos.

Aí está um exemplo de pessoas que se arriscam em aventuras neste mundo sem ter um mínimo de conhecimentos do que esta fazendo, ou o faz mesmo por aventura.